Folha de S. Paulo


Com dívidas e escassez, Venezuela anuncia novas regras de câmbio

Pressionada pela falta de dólares, a Venezuela anunciou novas regras de câmbio no país, incluindo a fusão de duas taxas oficiais e a criação de uma cotação livre para aliviar o controle cambial em vigor há 12 anos.

A manobra, amplamente vista como desvalorização da moeda nacional (bolívar), é parte do esforço para tentar equilibrar as finanças estatais e atenuar o desabastecimento e as filas que geram crescente tensão social.

O ministro das Finanças, Rodolfo Marco Torres, disse que a "Gaceta Oficial" registrará nesta quarta (11) as alterações no sistema.

A atual taxa preferencial de 6,30 bolívares por dólar será mantida para a importação de alimentos, medicamentos e algumas matérias primas.

Segundo Marco Torres, esta cotação, altamente subsidiada, atenderá "70% das necessidades econômicas."

As duas taxas até então chamadas de Sicad 1 e 2 serão fundidas num patamar de 12 bolívares por dólar, que atenderá o restante das operações de comércio exterior.

A novidade é a criação de uma cotação batizada de Sistema Marginal de Divisas (Simadi). Segundo o ministro, a taxa será definida em função da oferta e da demanda. As operações ficarão a cargo de casas de câmbio, corretoras e bancos. Somente poderão beneficiar-se do sistema pessoas físicas e jurídicas que tiverem conta em dólar em bancos venezuelanos.

Segundo a agência Reuters, a cotação inicial do Simadi deverá girar em torno de 120 bolívares por dólar. Na cotação paralela de terça, um dólar valia cerca de 185 bolívares.

14.jan.2015 - Carlos Eduardo Ramirez/Reuters
Pessoas fazem fila para comprar produtos básicos em supermercado de San Cristobal, em janeiro
Pessoas fazem fila para comprar produtos básicos em supermercado de San Cristobal, em janeiro

CÂMBIO DE MERCADO?

Marco Torres prometeu que o Simadi será "totalmente livre", mas analistas duvidam que a cotação obedeça exclusivamente ao mercado.

"Acho que será um sistema com flutuação, que restringirá participantes e não impedirá que siga existindo um mercado paralelo", disse o economista Orlando Ochoa.

A exemplo de outros analistas, Ochoa prevê que as medidas não aliviarão a pressão sobre o governo e poderão acirrar ainda mais a inflação de 64%, um dos males responsáveis pela baixa popularidade do presidente Nicolás Maduro (22%).

A aposta do governo num câmbio mais flexível, porém, parece ser uma tentativa de maximizar a arrecadação proveniente das exportações de petróleo, responsáveis por 96% dos dólares no país.

Em meio à degringolada dos preços petroleiros devido a uma farta oferta, o barril venezuelano perdeu mais da metade do valor desde junho.

A queda na arrecadação de dólares agrava um desabastecimento que é, em boa parte, fruto dos controles de preços e de câmbio e dos ataques ao sistema produtivo privado iniciados na presidência de Hugo Chávez (1999-2013).

Desde a virada do ano, a escassez de leite, medicamentos e produtos de higiene doméstica chegou a níveis críticos. A este cenário somam-se deficit fiscal e colossais dívidas com a China e com os mercados financeiros.

Torres também anunciou que o governo reembolsará nas próximas semanas mais US$ 2 bilhões em títulos da dívida venezuelana, que supera US$ 9 bilhões.


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