Folha de S. Paulo


Análise: Maior desafio da coligação na Grécia é atender expectativas criadas

Faz somente dois anos e meio que François Hollande ganhou as eleições na França, derrotando a centro-direita. Criou a expectativa de ser uma voz contra a austeridade e prometeu, entre outras coisas, taxação sobre grandes fortunas. Depois foi a vez de Matteo Renzi na Itália. Novamente, esperança numa alternativa à política de austeridade identificada com Angela Merkel.

Agora é a vez da Grécia. É possível que o Syriza, liderada por Alexis Tsipras, consiga votos necessários para ter maioria no Congresso. Será que justamente o elo mais fraco será capaz de evitar novas frustrações para quem acredita na possibilidade de uma Europa alternativa? Ou o governo Tsipras provocaria a confirmação de que não há alternativa à austeridade?

Por três motivos, é mais provável que uma vitória de Tsipras cause menos tensões do que alguns temem e outros esperam. Primeiro, porque o Syriza não é populista nem antissistema. Defende a permanência no euro, como a maioria dos gregos. Seu avanço nos últimos anos deve-se em grande parte à perda de credibilidade do partido socialista Pasok. Portanto, a tendência será procurar acordos e aproximar-se de experiências da centro-esquerda europeia e brasileira.

Segundo, por mais que haja um sentimento de fadiga nos países credores em relação à Grécia e que o risco de contaminação seja bem menor do que na última crise política, em 2012, o impacto de uma saída da Grécia do euro continua imprevisível.

Uma inflexibilidade total por parte da troica (FMI, BCE e Comissão Europeia) mostraria que o euro não está em processo de consolidação e que países podem sair. Seria derrota da União Europeia.

E terceiro, talvez o mais importante: surgiu na véspera das eleições uma novidade com a decisão do Banco Central Europeu (BCE) de iniciar um programa agressivo de compra de títulos de dívida, desviando-se do pensamento dominante em Berlim.

O BCE decidiu, inclusive, que pode considerar a inclusão da Grécia no novo programa. Ou seja, pode usar dinheiro novo no âmbito de um programa para aliviar a dívida da Grécia. Além disso, a decisão do BCE criou um clima de luz no fim do túnel que ajudará a relativizar uma visão de catástrofe com a vitória de Tsipras.

Com tudo isso, o maior desafio de Tsipras será lidar com as expectativas do seu eleitorado. A Grécia fez, sob pressão da troica, por mais que até o governo conservador de Samaris tenha tentado resistir, um ajuste dramático. Mas isso foi feito à custa de um aumento da pobreza, do desemprego e da desestruturação dos serviços públicos. E esse drama social continuará explosivo, com ou sem Tsipras.

GIORGIO ROMANO SCHUTTE é coordenador do curso de Relações Internacionais da Universidade Federal do ABC (UFABC).


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