Folha de S. Paulo


Reaproximação com os EUA faz Cuba apostar no golfe para atrair turistas

Acariciado pela brisa do mar do Caribe, o balneário de Varadero, 130 km a leste de Havana, tem praias paradisíacas, hotéis internacionais e sol o ano inteiro.

Varadero é também a grande aposta da comunista Cuba para atrair turistas adeptos do esporte mais capitalista: o golfe.

O turismo local, que já recebe muitos golfistas canadenses e europeus, comemora o relaxamento das restrições de viagem de cidadãos americanos à ilha, oficializado nesta quinta-feira pelo governo de Barack Obama.

A medida, tida como primeiro passo para atrair americanos adeptos do esporte, é parte da histórica reaproximação diplomática e econômica anunciada em dezembro por Havana e Washington.

Embora o turismo não esteja listado no pacote, a expectativa é que muitos americanos aproveitarão brechas na nova legislação para passear na ilha, situada a apenas 150 km da Flórida.

Especula-se que o acordo poderá levar até 1 milhão de cidadãos dos EUA a Cuba a cada ano. Eles se somarão aos 3 milhões de estrangeiros que já visitam a ilha anualmente e fazem do turismo o sustentáculo da economia cubana, ao lado do açúcar.

"Americanos adoram golfe, e isso cria um segmento com enorme potencial", diz Pedro Klein, gerente do Clube de Golfe de Varadero, o único de Cuba a ter 18 buracos, como está na regra do esporte.

O campo se situa numa colina ao lado da praia, proporcionando aos jogadores uma paisagem que mistura greens (espaços de jogo), coqueiros e o azul turquesa do mar.

O complexo abriga uma mansão em estilo colonial –com suítes de luxo e um bar com vista panorâmica– construída pelo magnata americano Irénée Du Pont nos anos 1920, quando os EUA tinham grande influência na ilha.

Empresas estrangeiras atuam na gestão do clube, mas o comando pertence ao Estado cubano. "Este é um campo de golfe socialista", orgulha-se Avelino, funcionário local.

O socialismo, porém, nem sempre conviveu bem com o esporte das elites. Após a revolução de 1959, o então líder Fidel Castro foi fotografado dando tacadas com o parceiro argentino Ernesto Che Guevara em Havana.

Os dois revolucionários, segundo relatos da época, estavam zombando de Dwight Eisenhower, presidente americano à época da revolução, conhecido por ser fã de golfe. O registro em preto e branco está exposto no bar do clube de Varadero.

Fidel em seguida cerceou o golfe no país, por se tratar de hobby "burguês".

A estigmatização durou até os anos 90, quando o regime investiu no turismo de luxo para resgatar Cuba da crise surgida com o colapso da aliada União Soviética.

O clube de Varadero foi aberto em 1999 para concorrer com campos de golfe da República Dominicana.

Mas, devido a entraves burocráticos, novos investimentos só surgiram depois que Fidel cedeu o poder ao irmão Raúl Castro, em 2006, iniciando a era da lenta abertura econômica.

O projeto mais ambicioso é o Carbonera Golf Club, que será construído perto de Varadero. Avaliado em US$ 350 milhões (R$ 925 milhões), o Carbonera é uma parceria entre o Estado cubano e uma empresa britânica.

No total, Cuba planeja ter 13 novos campos até 2025, inclusive em Havana.

Os campos serão, em tese, abertos a cidadãos cubanos, mas a maioria deles carece dos recursos necessários à pratica do esporte.

'MULTIDÃO'

Segundo investidores estrangeiros, a normalização da relação com os EUA deve acelerar o retorno do investimento e poderá transformar a ilha em um dos principais centros do golfe no mundo.

Mas, em Varadero, nem todo mundo compartilha a expectativa pela reaproximação entre Havana e Washington.

Para muitos turistas canadenses –nacionalidade de 90% dos golfistas em Cuba–, a possibilidade de invasão americana é má notícia.

"Essa multidão acabará com a tranquilidade daqui. E aposto que os preços dos hotéis irão dobrar", resmunga um turista canadense. "Quando os americanos chegarem, eu deixarei de vir."


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