Folha de S. Paulo


Reaproximação com EUA divide dissidentes do regime cubano

O anúncio do restabelecimento das relações bilaterais com os EUA provocou duras críticas de parte da dissidência cubana. Mas a aproximação é tida como irreversível e agora os opositores ao castrismo querem que Washington aumentem a pressão por maior abertura política.

Horas depois da divulgação do acordo, na quarta-feira (17), o chefe da seção de interesses dos Estados Unidos em Cuba, Jeffrey DeLaurentis, se reuniu com 18 dissidentes em Havana para ouvir a reação.

Desses, 12 se disseram contrários ao acordo, quatro avaliaram como uma oportunidade e dois optaram por esperar mais tempo para ver os desdobramentos, segundo relato do dissidente Guillermo Fariñas, que participou do encontro.

Conhecido por fazer sucessivas greves de fome, Fariñas disse que se sentiu "traído" pelo presidente Barack Obama, com quem se encontrou em novembro do ano passado, em Miami.

"Ele me disse, pessoalmente, que nos informaria primeiramente sobre qualquer mudança na política sobre Cuba", afirmou, em conversa por telefone. "Isso foi um desastre para nós. Vivemos com medo de ser mortos por um governo fascista e aí os Estados Unidos, nossos aliados, preferem sentar com nossos assassinos e nos dar as costas."

Por outro lado, Fariñas disse que mesmo os dissidentes contrários ao acordo admitem que "não há nada mais a ser feito" e que a batalha agora é pela inclusão de cláusulas democráticas durante as negociações para a implantação das medidas, a partir do início do ano que vem.

Em tom pessimista, porém, avaliou que considera mínima a chance de mudanças internas significativas. "Acredito que não haverá o fim do embargo econômico, porque o Congresso americano não o anulará antes da abertura politica. E não haverá abertura política porque conheço este regime, eles não vão mudar."

Fariñas disse que DeLaurentis apenas anotou os comentários e não deu nenhuma informação adicional sobre os próximos passos. O dissidente afirmou que desconhece quem são os 53 presos políticos que serão soltos, mas que possui uma lista de 148 companheiros encarcerados.

"Estamos felizes porque serão libertados, mas o importante e mudar a lei, porque a atual pode colocar outros 53 na cadeia."

NOVA OPORTUNIDADE

Ausente do encontro, o jornalista opositor Reinaldo Escobar disse que a reunião na representação americana serviu para os EUA explicarem a nova situação aos dissidentes mais críticos à aproximação.

Otimista, disse que "é uma nova oportunidade. O diálogo ficará mais importante do que a confrontação".

"A confrontação só ajudou o governo cubano, que a tem usado para justificar seu desastre econômico e a repressão. Pode ser um fracasso, mas é preciso dar uma chance. Estou feliz."

Junto com a mulher, a blogueira opositora Yoani Sánchez, Escobar lançou em maio o site de notícias 14ymedio.com, bloqueado em Cuba três horas após entrar no ar.

"As pessoas que se opõem não veem a imagem completa. Tem gente que diz que os EUA traíram a sociedade cubana. Não é certo, porque a sociedade cubana tem varias opiniões. Eles ouviram todos e escolheram um lado."


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