Folha de S. Paulo


Morte de alunos escancarou crise no México, conta jornalista; veja documentário

"Por que atiram? Estamos desarmados!", os gritos vêm detrás das janelas estilhaçadas de um ônibus. De uma delas, sai o braço de um rapaz que se espicha para filmar o que acontece do lado de fora. Foca agentes correndo e rapazes caídos com a cara ensanguentada no chão. Um policial faz a triagem: "você, você, você". Enquanto os escolhidos são levados em veículos de patrulha, os demais são liberados. "Os que foram com a polícia nunca mais apareceram", conta em seu depoimento Ernesto Guerrero, um dos jovens sobreviventes.

As cenas acima são do documentário "Los 43 que Faltan", produzido pela "Vice México" para a "Vice News" e que a Folha reproduz a partir de hoje. Dividido em três partes, é o resultado da viagem realizada pelo jornalista americano-mexicano Daniel Hernandez ao departamento de Guerrero, no México.

Ali, no último dia 26 de setembro, 43 estudantes da escola rural de Ayotzinapa, foram interceptados pela polícia e nunca mais reapareceram, levando multidões às ruas do país, exigindo providências.

"O que acontece em Guerrero tem um significado especial para os mexicanos, porque foi um local-chave das lutas de Independência, da Revolução (1910) e nos anos 60/70, quando atuaram ali líderes camponeses históricos, como Lucio Cabañas (1938-1974)", conta Hernandez à Folha.

O filme conta como as escolas rurais exerceram papel fundamental nos planos de alfabetização do Estado ao longo do século 20, mas que nos últimos tempos foram deixadas de lado pela administração nacional.

Historicamente, essas instituições cultivam ideologia e símbolos de esquerda, como se vê na imensa imagem de Che Guevara na sede de Ayotzinapa. "A maioria dos jovens que vai estudar ali para ser professor tem isso muito forte. Seu modo de atuação é contestador, organizam protestos, às vezes chegam a fechar estradas. O fato é que fazendeiros locais os odeiam, e não é de hoje", diz Hernandez.

O primeiro episódio colegas e familiares dos rapazes desaparecidos, além de mostrar como o departamento vem sendo marcado pela atuação do narcotráfico, por suas redes de extorsão e corrupção, e pela ineficácia das administrações locais em proteger a população.

Veja a primeira parte do documentário em espanhol, com legendas em inglês:

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"Tem havido muitas mortes no México em geral. Há tragédias como as de Ayotzinapa que terminaram com 300 mortes de uma só vez, muitas aparecem fossas cuja história dos enterrados ninguém conhece. Creio que esse episódio trouxe mais atenção midiática por se tratarem de estudantes muito jovens. Mas a verdade é que a situação no México é grave", explica o jornalista.

Desde 2006, o Estado vem travando uma guerra ao narcotráfico, pautada em ações militares, que já deixou mais de 60 mil mortos. Muitos governos locais sucumbiram aos cartéis ou às milícias organizadas por moradores e proprietários, como é o caso de algumas partes dos estados de Michoacán e Sinaloa.

"Finalmente, a consciência da sociedade parece despertar e estamos vendo o povo na rua exigindo ações do governo. Nosso documentário vai acompanhar o desfecho de toda essa tensão social", conclui.

Veja a segunda parte do documentário em espanhol, com legendas em inglês:

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Veja a terceira parte do documentário em espanhol, com legendas em inglês:

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