Folha de S. Paulo


Congressistas da Colômbia trocam acusações de ligação com narcotráfico

Enquanto o processo de paz entre o governo colombiano e as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) ocorre em Havana, políticos que são filhos executados durante o período mais cruel da guerra do narcotráfico (anos 80/90) se digladiam no Congresso.

Nas últimas semanas, eles trouxeram a público depoimentos, documentos, e cartas para acusar uns aos outros de envolvimento ou com as guerrilhas de esquerda ou com os paramilitares. O caso foi levado à Procuradoria-Geral, que inicia a semana investigando as denúncias.

O principal embate da "guerra dos órfãos" se dá entre os senadores Iván Cepeda (do esquerdista Pólo Democrático) e Álvaro Uribe, também ex-presidente, do recém-criado Centro Democrático (conservador). O pai de Cepeda, Manuel Cepeda Vargas, líder do partido comunista colombiano, foi morto por paramilitares, em Bogotá, em 1994. Já o de Uribe, o fazendeiro e criador de gado Alberto Uribe Sierra, foi assassinado pelas Farc em 1983.

Durante seu governo, Álvaro Uribe (2002-2010) promoveu um duro ataque à guerrilha, porém, com a ajuda controversa das milícias paramilitares de direita.

"O que começou a vir à tona agora é um iceberg histórico que a Colômbia espera conhecer em toda sua dimensão", disse o cientista político Luis Sandoval.

Cepeda acusa Uribe de vínculos com os dois lados da contenda, que dura mais de cinco décadas e já fez mais de 300 mil mortos.

Segundo as denúncias, durante suas gestões como governador de Antioquia (1995-1998) e como presidente, Uribe teria tanto legalizado empresas de segurança formadas por paramilitares como favorecido narcos com transporte e segurança.

A relação com os traficantes seria antiga, pois um irmão de Uribe teve negócios com o clã dos Ochoa, irmãos fundadores do cartel de Medellín, ao lado de Pablo Escobar (1949-1993).

"Pela primeira vez, Uribe teve de abordar temas que sempre manteve abafados", disse Cepeda.

O ex-presidente se diz perseguido pelo atual mandatário, seu ex-aliado e ex-ministro de Defesa Juan Manuel Santos, reeleito neste ano. Enquanto Cepeda o acusava, Uribe levou pessoalmente à Procuradoria documentos que, segundo ele, provam que Cepeda também tem vínculos com as Farc.

A principal evidência seriam e-mails trocados entre o senador e o líder guerrilheiro Raúl Reyes, morto numa ação do Exército colombiano no Equador, em 2008.

REVANCHISMO

Uribe ainda acusou Cepeda de comprar os depoimentos contra ele de dois paramilitares, Jesús Henao Aguilar e Gabriel Muñoz Ramírez.

"O caminho do revanchismo não nos levará à paz", disse a senadora da Alianza Verde Claudia Lopez, estudiosa dos efeitos da parapolítica na Colômbia. "O país reconheceu os méritos de Uribe, mas precisa que ele reconheça seus vínculos com o paramilitarismo".

Enquanto isso, outro órfão da violência, o senador Juan Manuel Galán, filho do candidato a presidente Luis Carlos Galán (1943-1989), assassinado pelo cartel de Medellín, tem enfrentado a ala mais conservadora do Congresso com suas propostas de legalizar algumas drogas e de defender a aprovação do casamento gay.

Integram essa ala mais progressista do parlamento, também, o senador Carlos Fernando –irmão mais novo de Galán– e Rodrigo Lara Restrepo, filho do ministro da Justiça Rodrigo Lara Bonilla (1946-1984), também morto pelo cartel de Medellín.

"Se antes apenas discutíamos o narcotráfico, com esse debate passamos a uma nova fase, a de trazer à tona a participação política no conflito. Já é algo importante", disse o escritor Jorge Franco.


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