Folha de S. Paulo


Análise: Hamas vai à guerra por um cessar-fogo

Escrevendo no "Yedioth Ahronoth", o analista israelense Alex Fishman disse que o Hamas é "como um indivíduo suicida que tenta arrastar Israel à força para um conflito armado, acreditando que será ele quem determinará a força da explosão".

Tendo seu acesso ao Egito cortado pelo bloqueio imposto pelo governo militar egípcio, que cortou sua ajuda financeira vital, o Hamas enfraquecido está isolado de muitas de suas fontes de apoio, incluindo a Síria e o Irã, e, segundo o argumento, seria debilitado por um conflito oneroso, após o qual teria dificuldade em se rearmar.

Por que, então, o Hamas parece estar determinado a travar um conflito renovado e possivelmente prolongado e sangrento?

"Ele sente que não tem nada a perder", diz Mkhaimar Abusada, da Universidade Al-Azhar. "Desde o acordo de unidade de 2 de junho, a Autoridade Palestina e Abu Mazen (o presidente Mahmoud Abbas) não fizeram nada pela Faixa de Gaza e o Hamas. A previsão era que a Autoridade Palestina abrisse os postos de travessia [para o Egito] e pagasse os salários do pessoal de Gaza, que não recebe há meses. O Hamas esperava uma visita de Abu Mazen. Ele calcula que haverá um novo cessar-fogo e que, quando isso acontecer, a situação do Hamas vai melhorar."

E, sob alguns aspectos, é exatamente isso o que o Hamas quer: travar uma guerra por um cessar-fogo. Nas exigências que fez esta semana para encerrar as hostilidades, a organização pediu que voltassem a vigorar as condições do cessar-fogo que se seguiu ao último conflito grande com Israel, em 2012; a nova libertação dos prisioneiros libertados por Israel em troca do soldado israelense sequestrado Gilad Shalit, que voltaram a ser detidos por Israel após o sequestro de três jovens israelenses, mais tarde encontrados mortos; e o fim do que o Hamas diz ser a ingerência de Israel no governo de unidade palestino.

Mas Mkhaimar acha que o Hamas também está sendo movido por outras considerações. "Seus líderes leem os jornais em hebraico. O Hamas sabe que [o primeiro-ministro israelense Binyamin] Netanyahu relutou em ser arrastado para esse conflito. A organização conhece a história das guerras israelenses e sabe que Israel tende a preferir conflitos de curta duração."

"Ela acredita que conseguirá absorver a dor de um conflito e que Israel receia que, se promover a queda do Hamas, seus sucessores possam ser facções mais radicais, incluindo salafistas. O Hamas sabe que Israel não irá até o fim contra ele, o que exigiria a reocupação total."

Outro fator a levar em conta é que o Hamas atual não é o mesmo grupo que combateu Israel na Faixa de Gaza em 2008-09 e 2012. Segundo observadores, sua capacidade militar aumentou, incluindo os foguetes de alcance mais longo que ele desenvolveu. E o Hamas aprendeu com os últimos dois conflitos, tendo aparentemente adotado táticas mais pró-ativas.

Longe de ser "suicida", há uma lógica forte por trás de sua estratégia, pelo menos parte da qual visa testar a disposição de escalação de Israel.

"O Hamas pensa que talvez um conflito impelisse Jerusalém oriental e a Cisjordânia para uma terceira intifada", diz Mkhaimar.

Tradução de Clara Allain


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