Folha de S. Paulo


Turquia apresentará projeto de lei para avançar paz com curdos

O governo da Turquia planeja apresentar ao Legislativo dentro de alguns dias um projeto de lei de reforma para avançar seu processo de paz com os militantes curdos, uma iniciativa que pode ampliar o apoio ao primeiro-ministro Tayyip Erdogan para a eleição presidencial que ele deve disputar em agosto.

O primeiro-ministro assistente Besir Atalay disse a jornalistas durante uma visita a Bucareste na terça-feira que o governo havia concluído o trabalho em uma estrutura legislativa para o processo de paz, e que estava recolhendo assinaturas de ministros para o anteprojeto.

"Fiz a apresentação na mais recente reunião de gabinete. Uma decisão foi tomada e dentro de dois dias apresentaremos o texto ao Legislativo como anteprojeto de lei", ele declarou em comentários divulgados pela TV turca na quarta-feira.

Os comentários de Atalay surgem uma semana antes do anúncio pelo Partido AK, governista, de seu candidato para a primeira eleição presidencial direta da Turquia, que acontecerá em agosto. Quase todos antecipam que o candidato será Erdogan.

Os curdos respondem por cerca de um quinto da população da Turquia e seu apoio pode ser decisivo para a candidatura de Erdogan, ainda que uma pesquisa de opinião pública esta semana tenha sugerido que ele poderia conquistar adesão suficiente mesmo sem o apoio deles.

O anteprojeto de lei também surge em um momento de crescente conflito no vizinho Iraque, entre insurgentes muçulmanos sunitas e as forças do governo. Embora o pacote de reformas turco esteja em debate há muito tempo, e não seja visto como relacionado aos acontecimentos no Iraque, pode em longo prazo ajudar a cimentar as relações entre a Turquia e o Curdistão iraquiano.

Erdogan iniciou negociações de paz em 2012com Adullah Ocalan, líder curdo aprisionado, para encerrar uma insurgência que já dura três décadas e já custou 40 mil vidas, conduzida pelo Partido dos Trabalhadores Curdos (PKK), liderado por Ocalan.

A atividade reforçada dos militantes curdos e manifestações de rua, nos últimos meses, lançaram dúvidas quanto a um acordo final.

"A lei reconhecerá um processo de negociação, oferecendo uma garantia subjacente do Estado para sustentar os esforços, até que a meta final de entrega das armas seja atingida", disse o legislador Idris Baluken, que conversou com Ocalan e o PKK para facilitar o processo, à Reuters.

A estrutura legal também deve prover condições melhores a Ocalan, o que incluiria autorizá-lo a retomar o contato com o PKK e organizações não governamentais.

"No momento não temos garantias legais. Podemos ser processados e, em resumo, passar a vida presos, sob as leis atuais, se o clima do país subitamente mudar", disse Baluken.

De acordo com o jornal turco "Hurryiet", a lei também facilitará a reabilitação de militantes.

Erdogan investiu capital político significativo nos esforços de paz, ampliando os direitos culturais e idiomáticos dos curdos, mesmo com o risco de alienar parte de seu apoio nas bases do AK. Ancara, os Estados Unidos e a União Europeia definem o PKK como organização terrorista, e Ocalan continua a ser uma figura fortemente repudiada pela maioria dos turcos.

Um cessar-fogo ordenado por Ocalan em março de 2013 vem em geral se sustentando, mas o PKK suspendeu a retirada das forças rebeldes para bases no norte do Iraque, na metade do ano passado, se queixando do ritmo lento das negociações.

O PKK tomou armas contra a Turquia em 1984 com o objetivo de criar um Estado separado no sudeste do país para os curdos. Eles subsequentemente moderaram suas demandas, buscando direitos políticos e culturais ampliados que por muito tempo lhes foram negados.

Tradução de PAULO MIGLIACCI


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