Folha de S. Paulo


Análise: A Venezuela não é a Grécia e sua economia não vai implodir

Há mais de uma década as pessoas que se opõem ao governo da Venezuela argumentam que a economia do país vai implodir.

Quão frustrante vem sendo para eles assistir a apenas duas recessões: uma causada diretamente pela greve petrolífera da oposição (dezembro de 2002-maio de 2003) e outra desencadeada pela recessão mundial (2009 e primeira metade de 2010).

Mas o governo venezuelano conseguiu o controle da empresa petrolífera nacional em 2003, e a performance econômica da década inteira foi bastante boa, com a renda real per capita subindo na média anual de 2,7% e a pobreza reduzida em mais de 50%.

Eduardo Anizelli/Folhapress
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Agora a Venezuela está diante de problemas econômicos que alegram os setores do ódio. Será que quem lançou alarmes falsos durante tanto tempo vai finalmente ver seu sonho se realizar?

Segundo a análise da oposição, a Venezuela está presa numa espiral de inflação e desvalorização, em que a alta dos preços domésticos prejudica a confiança na economia e na moeda, gerando fuga de capitais e levando à alta do dólar no mercado negro, o que incrementa a inflação.

Os controles de preços, nacionalizações e outras intervenções do governo também teriam causado mais distorções e problemas estruturais. A hiperinflação, o aumento da dívida externa e uma crise na balança de pagamentos iriam assinalar o fim do experimento econômico atual.

Mas como pode um governo dotado de receita petrolífera de mais de US$ 90 bilhões ter uma crise na balança de pagamentos? A resposta é: ele não pode.

Em 2012 a Venezuela teve receita petrolífera de US$ 93,6 bilhões. A conta corrente apresentou superávit de US$ 11 bilhões, ou 2,9% do PIB. Os juros pagos sobre a dívida externa pública chegaram a apenas US$ 3,7 bilhões.

Este governo não vai ficar sem dólares. Normalmente, reservas suficientes para cobrir três meses de importações são consideradas suficientes; a Venezuela tem o suficiente para pelo menos oito meses.

A hiperinflação também é uma possibilidade muito remota. O que realmente empurrou a inflação para cima, começando há um ano, foi um corte na oferta de dólares ao mercado de divisas.

A oferta foi reduzida pela metade em outubro de 2012 e praticamente eliminada em fevereiro. Isso significou que mais importadores tiveram que comprar dólares cada vez mais caros no mercado negro. Foi dali que veio o aumento da inflação.

Desde então, o governo aumentou os leilões de dólares e anunciou planos de aumentar as importações de alimentos e outros bens, fato que provavelmente exercerá pressão para baixo sobre os preços.

É claro que a Venezuela está enfrentando problemas econômicos muito sérios.

Mas não são problemas do tipo sofrido pela Grécia ou a Espanha, presas na armadilha de um arranjo em que a política macroeconômica é determinada por pessoas cujos objetivos entram em conflito com a recuperação econômica desses países.

MARK WEISBROT é co-diretor do Centro de Pesquisas Econômicas e Políticas, em Washington, e presidente da Just Foreign Policy
Tradução de CLARA ALLAIN


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