Folha de S. Paulo


Doze camponeses são processados por massacre que causou queda de Lugo no Paraguai

Doze camponeses paraguaios enfrentarão um julgamento oral (audiências públicas contínuas, nas quais a acusação é feita oralmente) por homicídio doloso e outros delitos no caso do massacre de Curuguaty, que em junho de 2012 provocou a cassação do então presidente do Paraguai, Fernando Lugo.

Uma juíza de Curuguaty, no nordeste do país, resolveu hoje elevar a julgamento oral a causa contra as 12 pessoas acusadas da morte de 17 policiais e camponeses em um enfrentamento e encerrar o caso contra outros três por falta de provas, como tinha solicitado a promotoria.

A juíza Yanine Ríos terminou assim uma audiência preliminar originalmente marcada para 14 de fevereiro, que começou no início de junho e se repetiu em meados de julho, sem que a defesa conseguisse ganhar nem um só dos vários pedidos de anulação.

Como observou o promotor, Khalil Rachid, a juíza "considerou que existiam argumentos que incriminavam este grupo de pessoas e que a acusação reunia os requisitos formais".

Rachid destacou à imprensa que Ríos admitiu todas as provas apresentadas, também as da defesa, enquanto ao redor se ouviam gritos de "corruptos".

"Nesse sentido, (os defensores) não podem se queixar", comentou o promotor.

Quase todos os camponeses, incluindo três mulheres, são acusados de homicídio doloso, associação criminal e invasão de propriedade pela morte de seis policiais e 11 camponeses em um confronto em 15 de junho de 2012, durante uma operação de reintegração de posse em uma fazenda de Curuguaty que tem a propriedade disputada entre um empresário e o Estado.

O promotor afirma que os camponeses armaram uma emboscada para os policiais. Já a defesa afirma que não foram investigados possíveis abusos, incluídos execuções extrajudiciais pelos agentes.

A defesa apressou ao máximo cada audiência para apresentar uma série de argumentos que pediam a anulação do caso, além de questionar a recusa, tanto de Rachid como de Ríos, por "parcialidade manifesta".

Os defensores questionaram a apresentação de provas falsas e indevidamente listadas, a ambiguidade na argumentação da acusação e outros erros processuais, além de pedir a resolução da propriedade da fazenda --pendente em outro julgamento-- antes que a causa penal tivesse andamento.

Um dos advogados de defesa, Vicente Morales, reafirmou nesta quarta-feira que Ríos "agiu de maneira parcial" e insistiu que a audiência deve ser anulada porque esteve infestada de "aberrações".

Para Morales existiram "mais de 25 violações no processo" e hoje a juíza nem sequer permitiu que a defesa apresentasse outra notificação para pedir a nulidade do processo, já que reiniciou a audiência comunicando sua decisão.

"Algumas coisas teriam que ter sido depuradas nesta audiência e não aconteceu", declarou o outro advogado da defesa, Guillermo Ferreiro, para quem "o problema é que eles estão atropelando tudo".

A audiência preliminar aconteceu no Palácio de Justiça de Assunção, e não em Curuguaty, por motivos de segurança. Nesta quarta-feira, a juíza resolveu transferi-la para uma sala menor, e deixar a imprensa de fora.

A deputada Karina Rodríguez, do grupo de esquerda "Avança País", censurou essa decisão e qualificou de "lamentável" que Ríos "não tenha garantido um processo justo".

"O Poder Judiciário nos dá uma claro sinal que aqui há outros interesses em jogo, era previsível, porque já havia um preconceito. Tomara no julgamento possamos desdizê-la e finalmente este processo termine", lamentou à Agência Efe a deputada.

Para a Anistia Internacional, o caso se transformou "em um grande desafio em matéria de direitos humanos" para o Paraguai, enquanto a Coordenadora de Direitos Humanos do país repudiou a decisão de Ríos de processar os camponeses.


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