Folha de S. Paulo


Análise: O mundo ainda depende mais do que pensa da América policial

Em 1899, Rudyard Kipling, o destacado poeta do imperialismo britânico, dirigiu algumas estrofes aos Estados Unidos. "Assumam o fardo do homem branco".

Mas será que a América ainda está disposta a exercer o papel de policial do mundo e travar "as selvagens guerras da paz"? Pesquisas mostram que muitos americanos têm dúvidas sobre isso.

Quase 80 anos após a morte de Kipling, muitos no Reino Unido veem a decisão do Parlamento de ficar de fora de uma intervenção militar como sinal de que o país livrou-se do instinto policialesco pós-imperial.

Os americanos já não têm a ilusão de que seus soldados serão recebidos com flores nos países. Em lugar disso, como avisou Kipling, aprenderam a prever "as críticas daqueles a que assistis, o ódio dos que protegeis".

Também nos EUA parece haver um abismo entre um establishment que considera natural o país policiar o mundo e um público mais cético.

Mas e se Bashar al-Assad voltar a empregar armas químicas? Os EUA têm alguma visão política viável para o futuro da Síria?

Os EUA se veem como avalistas da segurança global desde 1945, mas não intervieram, por exemplo, na guerra Irã-Iraque, nos anos 1980, que também envolveu o uso de armas químicas.

As intervenções em conflitos especialmente sangrentos só ganharam força a partir da década de 1990, com o genocídio em Ruanda, a guerra na Bósnia e o desenvolvimento de uma doutrina sobre "armas de destruição em massa".

Para o bem ou para o mal, Barack Obama traçou uma linha vermelha sobre a Síria.

Como ele sugeriu no fim de semana, os adversários dos Estados Unidos irão tirar conclusões se o país não agir concretamente em relação à Síria. O mesmo raciocínio pode ser aplicado aos seus aliados.

Os governo do Japão, de Israel e da Polônia, para citar apenas alguns poucos exemplos, se sentirão menos seguros se o Congresso votar contra uma ação militar na Síria.

O mundo depende mais do que pensa da América policial.

Tradução de CLARA ALLAIN


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