Folha de S. Paulo


EUA dobraram gastos com inteligência desde 11 de Setembro, diz jornal

Os gastos norte-americanos com os serviços de inteligência dobraram desde o 11 de setembro, com a Agência Nacional de Segurança (NSA) e a Agência Central de Inteligência (CIA) ficando com a parte do leão das verbas, de acordo com um documento orçamentário confidencial revelado por Edward Snowden, antigo prestador de serviços à NSA.

Os detalhes da solicitação de US$ 52,6 bilhões (R$ 126 bilhões) em verbas para as 16 agências de espionagem norte-americanas foram revelados na quinta-feira pelo jornal "Washington Post".

A NSA requisitou US$ 10,45 bilhões ao Congresso, enquanto a CIA solicitava US$ 14,7 bilhões. A NSA há muito é considerado como a mais produtiva das agências de espionagem, e por isso o fato de que a CIA tenha verbas maiores é uma das grandes surpresas no documento orçamentário, formado por quatro volumes com um total de 1.452 páginas.

A Justificação Orçamentária ao Congresso para o Programa Nacional de Inteligência, conhecida como "orçamento clandestino", revela indicações sobre novos projetos bem como os sucessos e fracassos das agências de espionagem.

Delineia os países que elas conseguiram infiltrar com sucesso e aqueles nos quais enfrentam dificuldades, primordialmente a Coreia do Norte. Ironicamente, tendo em vista as revelações de Snowden, parte do Orçamento tem por objetivo impedir denúncias.

Na seção de contrainteligência do Orçamento, que solicita verbas de US$ 3,7 bilhões, há um item dedicado à detecção de ameaças internas por pessoas "que busquem explorar seu acesso autorizado a informações delicadas para prejudicar os interesses dos Estados Unidos".

Antes de Snowden, os serviços de inteligência haviam planejado investigar cerca de quatro mil possíveis ameaças internas, este ano.

O Orçamento, uma cópia do qual foi estudada pelo "Guardian", também oferece detalhes instigantes sobre o relacionamento entre a NSA e o mundo empresarial. Descreve "parcerias comerciais únicas" que "permitem acesso às e exploração das comunicações internacionais, e fornece infraestrutura de sustentação de operações".

O documento contém números para gastos com o setor empresarial, mas não oferece um total definitivo. Companhias norte-americanas de telecomunicação e Internet ajudam a NSA a recolher dados, ainda que muitas digam que não o fazem voluntariamente, mas apenas porque a lei assim as obriga.

Um número estima os custos de operação dos programas do setor empresarial em cerca de US$ 271 milhões. Diversos programas envolvendo o setor empresarial são mencionados, entre os quais um que leva o codinome Blarney e tem solicitação de orçamento de US$ 86,2 milhões.

Mas os nomes das empresas envolvidas não estão incluídos.

O documento diz que as agências têm por objetivo "aproveitar parcerias na CI [comunidade de inteligência] e com empresas privadas para oferecer acesso autorizado sob a Lei de Vigilância de Inteligência Estrangeira (Fisa) a comunicações de governos estrangeiros, organizações internacionais, organizações terroristas e agentes de potências estrangeiras".

O Orçamento revela que as agências de inteligência têm 107.035 funcionários, o que representa quase 4% do total de funcionários públicos federais. O custo salarial de sua força de trabalho é de US$ 12,3 bilhões. Além disso, há dispêndio adicional de US$ 5 bilhões com os serviços de 21.754 funcionários de prestadores de serviços.

A NSA solicitou US$ 10,45 bilhões, 3% a mais que no ano passado. A agência planeja reduzir seu quadro em 75 funcionários em 2013, o que a deixaria com 21.575 pessoas. Em comparação, a CIA tem 22.206 funcionários e está solicitando US$ 14,7 bilhões, 4% a menos que no ano passado.

James Clapper, o diretor nacional de inteligência norte-americano, afirma no prefácio que a solicitação orçamentária representa um corte nos gastos agregados.

"Este orçamento representa corte de US$ 1,3 bilhão, ou 2,4%, ante o orçamento aprovado no ano fiscal de 2012, e reduz o pessoal em 1.241 postos de trabalho, ou 1%. A solicitação atende às demandas fiscais da Lei de Controle Orçamentário ao colocar a CI [comunidade de inteligência] no caminho de uma redução de gastos de US$ 25 bilhões em 10 anos; e mais de US$ 15 bilhões do total serão economizados até o ano fiscal de 2017", afirmou Clapper.

Ele acrescentou que: "Embora o orçamento esteja caindo, as missões continuam as mesmas".

A justificativa orçamentária para a NSA inclui "produzir informação de comunicações adequada, confiável e utilizável a fim de permitir vantagem de informações decisiva às autoridades nacionais e ao componente bélico", e "recolher, processar, compreender e compartilhar informações coligidas eletronicamente na velocidade da, e com a agilidade oferecida pela, rede mundial de informações".

O Orçamento mostra que os Estados Unidos tomam por alvo rivais previsíveis como a Rússia e a China mas também países encarados como aliados, a exemplo de Israel.

O Paquistão, visto há muito como um aliado problemático, é descrito como "alvo intratável", e operações de contrainteligência têm por foco "alvos prioritários na China, Rússia, Irã, Cuba e Israel".

Grandes lacunas no conhecimento sobre o Irã, China e Rússia são reconhecidas, e a Coreia do Norte é descrita como o alvo mais difícil de penetrar, devido à sua relativa falta de Internet e outros meios modernos de comunicações.

As agências de inteligência, de acordo com o orçamento, planejam "manter e sustentar as capacidades de coleta e exploração, infraestrutura e operações existentes" para comunicações via telefone e Internet.

As formas de comunicação visadas incluem "fax, telex, modem, e-mail, webmail, mensagens instantâneas, VoIP, redes virtuais privadas (VPNs), comunicações de voz móveis e fixas, e teleconferências em vídeo".

O documento também revela uma aparente escassez de pessoal capacitado nos idiomas falados em regiões que são o foco de boa parte do trabalho da comunidade de inteligência.

Embora haja quase 3.000 pessoas capacitadas a falar espanhol --o que não surpreende, dada a grande população hispânica dos Estados Unidos-- há apenas pouco mais de 1.100 pessoas que falam árabe, e números ínfimos de pessoas fluentes em urdu e pashto. Há 900 pessoas capazes de falar chinês, de acordo com o documento.

Tradução de PAULO MIGLIACCI


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