Folha de S. Paulo


Análise: Estado judeu mostra cautela ao lidar com crise no país vizinho

Se Barack Obama não estiver blefando, os EUA terão sido atraídos a uma armadilha que poderá lhes custar prestigio e complicar ainda mais o tabuleiro do Oriente Médio.

Não que a administração norte-americana nutra quaisquer tipos de simpatias pelo brutal regime sírio. Mas muitos fatores importantes estão em jogo. Para começar, os estreitos laços entre Moscou, Teerã e Damasco.

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Isso explica, principalmente, a razão pela qual Washington vinha evitando se envolver abertamente na guerra civil síria. A experiência tem demonstrado que nem sempre é produtivo derrubar regimes hostis, e aí estão os exemplos do Afeganistão e do Iraque para confirmar.

No caso sírio, os EUA, ao forçarem a derrubada do regime Assad, estariam, eis o paradoxo, contribuindo para a vitória de forças rebeldes controladas majoritariamente por muçulmanos sunitas cujos laços com a temível Al Qaida são mais que notórios.

Desfechado ou não o anunciado ataque, uma questão crucial permanece de pé: teria realmente Assad determinado o uso de armas químicas contra os rebeldes que tentam derrubar seu regime?

Há controvérsias, concordam inúmeros analistas. Assad resiste há quase três anos e apesar de ter quase metade do território sírio infestado pelos rebeldes não dá sinais de estar perdendo a guerra. Para que então se arriscaria?

O líder sírio, formado no Ocidente, é um homem pragmático e sabe que o emprego de tais armas acarretaria fatalmente o repúdio universal, além de deixar numa posição política e moralmente indefensável o seu principal aliado político, a Rússia.

Mais grave, o emprego de armas químicas atrairia uma perigosa reação de Israel e, por mais paradoxal que possa parecer, a queda de Assad não interessa aos israelenses.

A última coisa que Jerusalém deseja é um vizinho hostil, estrategicamente importante, dominado por fundamentalistas do grupo terrorista mais letal e anti-israelense em atividade.
Isso explica as razões pelas quais Israel tem evitado cuidadosamente envolver-se em ações diretas contras as forças governamentais sírias.

Os ataques recentes que a Força Aérea de Israel desfechou contra o território sírio tiveram objetivo restrito: um comboio de mísseis iranianos rumo ao Líbano, para serem entregues ao Hizbollah.

Foi um sinal de Israel a Assad de que não pretende alterar o quadro de forças na Síria, mas que não tolerará que Assad se aproveite do caos para pagar os favores recebidos do Irã e do Hizbollah.

MÁRIO CHIMANOVITCH é jornalista, ex-correspondente de jornais brasileiros no Oriente Médio


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