Folha de S. Paulo


Embaixada britânica diz que detenção de brasileiro é 'questão operacional'

Em nota divulgada na tarde de segunda-feira (19), o embaixador britânico no Brasil, Alex Ellis, afirma que a detenção do brasileiro David Miranda quando ele embarcava de volta para o Brasil no aeroporto de Heathrow, em Londres, é "uma questão operacional da Polícia Metropolitana de Londres".

Miranda é namorado do jornalista Glenn Greenwald, que divulgou os escândalos de espionagem digital das agências de segurança dos EUA. Ele ficou retido por quase nove horas em uma sala com seis agentes da Scotland Yard (polícia metropolitana de Londres). Após ser liberado, ele teve o laptop, cartões de memória, DVDs e um videogame apreendido.

Segundo a nota, os ministros das Relações Exteriores do Brasil, Antônio Patriota, e da Inglaterra, William Hague, conversaram à tarde, por telefone, sobre o caso e "concordaram que representantes dos governos brasileiro e britânico permanecerão em contato sobre o assunto".

O embaixador encerra a nota afirmando que "o Reino Unido e Brasil têm uma forte relação bilateral" e que os dois países trabalham "em estreita parceria em diversas áreas, incluindo comércio e investimento, educação e energia".

Ainda de acordo com a nota, os dois governos continuam "a discutir uma vasta gama de questões de importância mútua para a política externa e para a agenda de segurança internacional."

Ricardo Moraes/Reuters
Glenn Greenwald (esq.)abraça o namorado David Miranda após sua chegada ao aeroporto do Rio; Miranda ficou detido por quase 9 horas em Londres, onde fez escala
Glenn Greenwald (esq.) abraça o namorado David Miranda após sua chegada ao aeroporto do Rio

VIAGEM

A viagem foi financiada pelo jornal britânico "Guardian", onde trabalha Greenwald. O brasileiro esteve em Berlim, onde visitou Laura Poitras, documentarista americana que auxilia o jornalista na divulgação dos documentos repassados por Edward Snowden.

Apesar de não ser funcionário do jornal, Miranda costuma auxiliar o companheiro nas reportagens, diz o "Guardian".

Recebido no aeroporto do Rio por Greenwald, na manhã desta segunda-feira (19), Miranda disse que foi questionado "sobre a minha vida inteira, sobre tudo".

O brasileiro afirmou que não foi ofendido, mas ficou irritado pela forma que foi abordado. Com aspecto de cansaço e nervosismo, ele contou também que teve seu passaporte confiscado.

Ao jornal americano "The New York Times", Greenwald afirmou que o namorado entregou a Poitras documentos relacionados à investigação sobre espionagem. Em troca, a americana passou outros documentos para Miranda levar ao jornalista.

Todos os documentos estariam criptografados e armazenados em "pen drives", segundo Greenwald, que acabaram confiscados pelas autoridades britânicas.

A Casa Branca informou hoje que as autoridades britânicas avisaram os EUA antes de prender Miranda, mas negou, porém, que os EUA tenham pedido a prisão e o interrogatório do brasileiro.

"Esta decisão eles tomaram por conta própria", afirmou o porta-voz da Casa Branca Josh Earnest.

EXPLICAÇÕES

A polícia e o governo britânico terão que explicar oficialmente a detenção do brasileiro. O ouvidor independente David Anderson vai investigar se houve abuso na aplicação das leis antiterrorismo, que dão poderes especiais às autoridades desde 2000.

Se concluir que o brasileiro foi detido ilegalmente, ele deve enviar um relatório especial ao Parlamento e sugerir mudanças imediatas na legislação.

Já um porta-voz do primeiro-ministro David Cameron saiu em defesa das leis antiterror e disse que caberá à própria polícia examinar se houve abuso em sua aplicação.

"O governo toma todos os passos necessários para proteger a sociedade de indivíduos que possam representar ameaças à segurança nacional", afirmou o porta-voz ao jornal "The Guardian". "Cabe à polícia decidir quando a necessidade e a proporção do uso desses poderes."

Deputados da oposição trabalhista criticaram a detenção do brasileiro. Yvette Cooper, responsável por fiscalizar o Ministério do Interior, cobrou uma investigação urgente do caso.


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