Folha de S. Paulo


Análise: EUA perdem condição moral de criticar China

Um medo expresso frequentemente quanto à Huawei, fabricante chinesa de equipamento para telecomunicações, é de que a companhia opere como agente secreto do governo da China.

Se autorizada a vender equipamentos de rede para os EUA, a empresa não poderia incluir em seu equipamento códigos ocultos que permitiriam aos serviços de inteligência chineses monitorar o que passasse por suas redes?

Agora substitua a palavra "Huawei" por "Verizon". Graças a Edward Snowden, o prestador de serviços às organizações de inteligência norte-americanas que decidiu revelar os segredos delas, sabemos que a Verizon fez algo de muito semelhante.

Se a Verizon --e a maioria das demais operadoras de telefonia e provedores de acesso à internet dos EUA-- transmite dados rotineiramente ao governo, isso não fica bem perto das suspeitas das pessoas sobre a Huawei?

Seria possível argumentar que a Agência de Segurança Nacional (NSA) norte-americana, que monitora o tráfego de telecomunicações no país, está apenas em busca de ameaças terroristas, e não bisbilhotando os segredos dos governos de outros países. Mas como poderíamos ter certeza disso?

As revelações de Snowden pouco têm de surpreendentes. Mas uma coisa é imaginar que coisas como essas aconteçam e outra vê-las expostas claramente.

O debate entre EUA e China sobre espionagem cibernética jamais será o mesmo.

Primeiro temos de estar claros quanto ao que descobrimos. Até onde sabemos, a Verizon não permitiu que a NSA escutasse diretamente os telefonemas.

Em lugar disso, transferiu à agência os chamados "metadados" das ligações.

Para ter acesso às conversações especificamente, a Justiça teria de conceder um mandado específico.

Essas distinções sutis pouco importam. Será mais difícil a partir de agora para Washington retratar a "China S.A." como uma aliança demoníaca entre o Estado e um falso setor privado.


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