Folha de S. Paulo


Putin diz que não apoia conferência que presuma saída de Assad

O presidente russo, Vladimir Putin, anulou os esforços do americano Barack Obama e do premiê inglês, David Cameron, para somar apoio do G8 à derrubada do líder da Síria, o ditador Bashar al-Assad.

Depois de dois dias de conversas intensas sobre o país no encontro do grupo, o russo atacou o projeto americano de fornecer armamentos aos rebeldes sírios, que, segundo ele, poderiam depois ser usados em solo europeu.

Por outro lado, ele defendeu a remessa de armas da Rússia a Assad. "Estamos fornecendo armas sob contratos legais com o governo legal. Este é o governo do presidente Assad. E se assinamos esses contratos, temos que cumpri-los".

Isolado, Putin recusou-se a admitir, mesmo que indiretamente, implicações de que Assad deva sair. Pelo contrário, desafiou os colegas com insinuações de divisões entre os líderes e de que a intromissão na síria resultaria em assassinatos como o que recentemente vitimou um solado britânico em Londres. No fim, o comunicado oficial do G8 sequer mencionou o nome do ditador sírio.

Nenhuma data foi mencionada para a conferência de paz conclamada por Moscou e Washington, que aconteceria no próximo mês, mas agora parece em hiato depois que os Estados Unidos anunciaram, na última semana, que vão armar os rebeldes. Fontes na conferência dizem que o encontro só acontecerá em agosto.

A celebração de uma conferência internacional de paz sobre a Síria, conhecida como "Genebra 2", não deve significar "a capitulação" do regime do ditador Bashar al-Assad, declarou ontem o ministro russo de Relações Exteriores, Serguei Lavrov.

"Estamos categoricamente contra as afirmações de que a conferência deve ser uma espécie de ato de capitulação pública da delegação governamental", declarou Lavrov em entrevista à agência de imprensa Kuna, do Quait, cujo conteúdo foi publicado pelo ministério russo.

"É extremamente importante que as partes externas ao conflito gerem um clima favorável para preparar esta conferência", ressaltou o ministro. Ele advertiu ainda que não se devia fazer uma "interpretação livre" das ideias reunidas em comunicado adotado depois da primeira conferência de Genebra, em junho de 2012, que previu a formação de um governo de transição.

A Rússia, principal apoiadora de Damasco (ao lado do Irã e do Hizbullah libanês), e os Estados Unidos tentam organizar uma conferência de paz internacional para tentar solucionar o conflito sírio, que, segundo a ONU, já deixou mais de 93 mil mortos desde março de 2011.

No sentido oposto, EUA e seus aliados na Europa e no Golfo Arábico vêm repetidamente exigindo a saída de Asad do poder. Recentes ganhos do governo em campos de batalha, porém, tornam essa previsão improvável.

"É impensável que o presidente desempenhe qualquer papel no futuro de seu país. Ele tem sangue em suas mãos", disse Cameron a repórteres.

TRAIÇÃO NACIONAL

Em entrevista a um periódico alemão publicada ontem pela agência oficial síria, a Sana, Assad afirmou que deixar o poder no contexto atual seria uma "traição nacional".

Ele adicionou ainda que o conflito durará "muito tempo" e acusou os países que apoiam a oposição de obstaculizar os esforços de paz.

Asad ressalvou, porém, que "se o povo reclamar [sua saída], é outra história".

Ele reconheceu novamente que "centenas" de combatentes do Hizbullah xiita ajudam o exército sírio, mas minimizou sua importância. "Não há batalhões [do Hizbullah]. Enviaram alguns combatentes à zona fronteiriça de Quseir". A ajuda do grupo foi decisiva para as forças do governo conquistarem, no último dia 5, a cidade, contígua ao Líbano.

Sobre o projeto de conferência de paz, contestou: "Existem obstáculos exteriores, como Turquia, Qatar, Arábia Saudita, França, Grã Bretanha. Esses países não querem diálogo e querem que siga a violência.

SARAMPO

Enquanto isso, a organização Médicos Sem Fronteiras afirmou ontem que uma epidemia de sarampo está se propagando em partes do norte da Síria, onde já haveria ao menos 7.000 pessoas afetadas. O motivo, dizem, é a interrupção dos programas de vacinação graças à guerra civil, que teria baixado os índices de cobertura de 80% a quase zero.

Em 2010, foram registrados apenas 13 casos de sarampo no país e em 2011, 26, segundo dados da Organização Mundial da Saúde.


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