Folha de S. Paulo


ONU diz ter 'motivos para acreditar' no uso de armas químicas na Síria

O novo relatório da comissão de investigação da ONU sobre direitos humanos na Síria, divulgado nesta terça-feira, afirma "ter motivos para acreditar" no uso de armas químicas em confrontos no país nos últimos meses.

"Há denúncias recebidas sobre o uso de armas químicas pelos dois lados. A maioria se refere ao seu uso pelo governo", diz o texto da Comissão Internacional de Inquérito, presidida pelo brasileiro Paulo Sérgio Pinheiro.

A utilização de armas químicas foi estabelecida pelo presidente dos EUA, Barack Obama, como a "linha vermelha" para o regime de Bashar al-Assad. Segundo ele, o uso desse tipo de armamento implicaria uma "mudança de jogo" -sugerindo uma possível atuação dos EUA no conflito.

No texto, a comissão aponta que o governo possui "uma quantidade de armas químicas" e "é possível que grupos armados antigoverno tenham acesso e usem" esse tipo de arma. "Entretanto, não há evidências convincentes que os grupos armados possuam essas armas ou seus sistemas de lançamento", diz.

O texto cita quatro ataques entre 19 de março e 29 de abril --dois deles em Aleppo, um em Damasco e um em Idlib-- em que teriam sido usadas "quantidades limitadas" de agentes químicos. Contudo, não identifica quem seria o autor dos ataques.

O período analisado pelo novo relatório vai de 15 de janeiro a 15 de maio, e tem por base 430 entrevistas e outras evidências coletadas. Mais uma vez, a comissão não teve acesso ao país.

Há um mês, a suíça Carla del Ponte, uma das integrantes da comissão, afirmou numa entrevista haver provas do uso de gás sarin, que possui efeito paralisante, por rebeldes -e não pelo regime sírio.

As informações foram desmentidas no dia seguinte por Pinheiro, que disse não haver evidências concretas sobre o uso de armas químicas por nenhum dos lados.

VIOLÊNCIA SECTÁRIA

Segundo a comissão, governo e rebeldes também estão usando uma "retórica perigosa que inflama as tensões sectárias e pode incitar violência massiva e indiscriminada, particularmente contra comunidades vulneráveis".

Em mais de dois anos do confronto, as diferenças se acirraram entre a maioria muçulmana sunita, que forma a base da oposição, e as minorias alauita -da qual faz parte Assad-, xiita, cristã e drusa, que veem no ditador uma proteção.

"Táticas brutais adotadas durante operações militares, especialmente pelas forças do governo, levaram a massacres frequentes e destruição numa escala sem precedentes", diz o texto.

O relatório também associa a presença de combatentes estrangeiros dos dois lados e à radicalização do confronto. O texto destaca o apoio do grupo radical libanês Hizbullah nas operações do regime sírio em Qusair e da Frente Popular para a Libertação da Palestina perto do campo Yarmouk, em Damasco.

No caso dos rebeldes, o relatório cita o reforço dado por "combatentes estrangeiros com inclinações jihadistas, geralmente vindos de países vizinhos".

ENVIO DE ARMAS

Como nos relatórios anteriores, a comissão faz poucas recomendações ao governo, aos rebeldes e à comunidade internacional -na maioria delas, é apenas um chamado ao diálogo, ao fim da violência e à solução política do conflito.

Desta vez, pede também aos demais países que contenham a escalada do conflito "restringindo a transferência de armas".

"O desespero das partes envolvidas no conflito resultou em novos níveis de crueldade e brutalidade, sustentados por um aumento na disponibilidade de armas", afirma o texto.

Para a comissão, Estados com influência sobre o regime sírio e os opositores devem tomar "medidas reais e tangíveis" para conter a crescente influência de facções extremistas.


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