Folha de S. Paulo


Moradores de favela argentina lembram do papa como "um homem simples"

Os moradores da favela Villa 21, em Buenos Aires, se lembram do cardeal Jorge Bergoglio como "um homem simples, que caminhava pelas ruas sem se importar em sujar os pés de barro e aceitava todo tipo de comida que lhe ofereciam pelo caminho", conforme afirma a doméstica Cristina Aguilar, 57.

Ao falar sobre o agora papa Francisco, Cristina chora. "Não vou mais ter a chance de beijar a cruz que ele leva no peito", afirma. Era o que ela fazia, segundo conta, a cada visita de Bergoglio à Villa 21. "Enquanto eu me curvava para beijar a cruz, ele punha a mão sobre minha cabeça e me abençoava", diz.

Roberto Bobadilla, 25, é outro morador dessa favela na capital argentina que está deixando de lado a expectativa de voltar a ver Bergoglio de perto. Se o argentino não tivesse se transformado em pontífice, Bobadilla teria um encontro marcado com ele no próximo dia 31.

É essa a data prevista para a inauguração de um abrigo para dependentes químicos em cuja construção o jovem trabalha todos os dias pela manha, junto com outros cinco voluntários.

O local deve ter capacidade para abrigar até 50 pessoas simultaneamente. A disseminação do uso de crack é o principal problema social com que convivem hoje os moradores da Villa 21.

Sobre oferecer trabalho voluntário para uma obra impulsionada pela Igreja, Bobadilla acha que é algo mais do que natural em sua trajetória.

"Eu praticamente me criei dentro da igreja. Vivi numa casa mantida pela paróquia para jovens de famílias com problemas. Éramos nove garotos (morando ali)".

Coordenadora do refeitório comunitário padre Daniel de la Sierra, Emiliana Florentin, 60, espera que o "papa Francisco seja como (o presidente venezuelano Hugo) Chávez (1954- 2013)". Ou seja, "que ele sirva muito ao país e traga progresso para os pobres", diz ela.

O refeitório fundado por Florentin oferece atualmente almoço e lanche da tarde a cerca de 300 famílias por dia, segundo ela. O padre que Florentin homenageou batizando com seu nome o refeitório está relacionado ao início da história da Villa 21.

"Ele se colocou em frente ao trator dos militares que invadiram a Villa, abriu os braços e disse que teriam de passar por cima dele primeiro, antes de destruir as casas", conta Florentin, que afirma não ter visto pessoalmente a cena, mas saber dela por relatos de terceiros.

"Era a "época da ditadura (1976-1983). E os militares não queriam saber de pobres", afirma.


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