Folha de S. Paulo


Vice tem desafio de manter chavismo unido

Nos últimos 86 dias, quando Hugo Chávez teve seus últimos momentos de convalescença longe das câmeras, o vice-presidente Nicolás Maduro teve a primeira prova de fogo como herdeiro político do popular esquerdista.

Com os microfones, e sem o carisma do mentor, esforçou-se em repetir, como ontem, uma palavra: unidade.

O ex-motorista de ônibus de 1,90 m sem diploma universitário, mas com formação política em Cuba, tem como desafio manter unidas as diferentes alas do chavismo --militares, sindicais e movimentos sociais--, algo que muitos julgam que só Chávez era capaz de fazer.

Não por acaso, nesses quase três meses de governo de fato na Venezuela, o vice alternou aparições na TV típicas de campanha com uma espécie de liderança colegiada ao lado de outros nomes importantes do chavismo.

Entre eles está Diosdado Cabello, militar reformado presidente da Assembleia, que é influente nos quartéis e nos negócios variados ligados ao governo. Também figura Rafael Ramírez, presidente da estatal petroleira PDVSA, que é o coração e caixa do projeto chavista.

Analistas avaliam, porém, que as divisões no chavismo são mais prováveis apenas no médio prazo. Antes, por pragmatismo político e pela comoção causada pela morte do esquerdista, as alas devem se unir em torno do objetivo de eleger Maduro presidente.

Ontem à noite, o chanceler Eliás Jaua afirmou que Maduro assume interinamente como presidente e novas eleições serão convocadas em até 30 dias, de acordo com o que reza a Constituição.

Para o teste das urnas, Maduro promete usar um atributo referido por Chávez: ter "coração de um homem do povo". Para muitos, o sucessor civil do "comandante" é a própria representação do cidadão venezuelano: simples, fraterno e simpático.

O perfil popular ajudaria a manter o maior capital político do chavismo: o apoio maciço da classes D e E --o que, para analistas, é mais importante do que a habilidade de controlar o partido, o PSUV, ou os militares.

Mas Maduro tem mais do que isso. Ele e sua mulher, a hoje procuradora-geral, Cília Flores, são um dos casais mais influentes entre os "civis" do chavismo. Conheciam Chávez desde que a advogada Flores o defendeu quando ele foi preso após a tentativa de golpe em 1992.

Além disso, tem o trânsito internacional adquirido nos mais de seis anos à frente de uma das chancelarias mais influentes da região.

Entre diplomatas de outros países, o seguidor do budismo é tido como um bom chanceler, de perfil discreto, que sabe ouvir e negocia ao final dos encontros os pontos mais sensíveis para seu governo. Goza da confiança dos irmãos Castro, em Cuba, e é bem-visto pelo governo brasileiro.

Apesar das divisões na oposição, o chavista deve disputar a Presidência contra o governador de Miranda, Henrique Capriles Radonski, 40, que perdeu para Chávez em outubro com importantes 44,3% dos votos dos venezuelanos. "Minha solidariedade a toda a família e seguidores do presidente Hugo. Pedimos pela unidade dos venezuelanos neste momento", declarou Capriles ontem.

AFP
O vice-presidente Nicolás Maduro
O vice-presidente Nicolás Maduro

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