Folha de S. Paulo


Longe de acabar, crise na Europa entra na fase mais difícil

A crise na zona do euro acabou? Muitos políticos, incluindo o presidente francês, François Hollande, parecem acreditar nisso. Vamos com calma --longe de ter acabado, a crise está prestes a entrar na sua fase mais difícil.

É fácil perceber por que os políticos afirmam que a crise terminou. A Grécia acabou de obter a promessa de mais € 50 bilhões, desde que aceite mais austeridade, desregulamentações e privatizações.

No restante da periferia europeia, a Irlanda está em seu sexto ano de recessão, Portugal caminha para uma grande retração da economia e a Espanha vai de mal a pior --mas seus governos impõem medidas de austeridade, e a população parece tolerá-las.

Mesmo países centrais, como a Itália e a França, concordam com a necessidade de Orçamentos equilibrados. Não há, na eurozona, oposição efetiva ao mantra da austeridade recitado por Berlim.

Enquanto isso, os mercados financeiros têm se mostrado calmos desde setembro, quando Mario Draghi, presidente do Banco Central Europeu, prometeu comprar a dívida de países em dificuldades desde que aceitassem condições para seu socorro.

O lançamento do Mecanismo Europeu de Estabilidade, fortificado com € 500 bilhões, também ajudou. O cálculo dos mercados é claríssimo: neste momento, não é lucrativo tomar dinheiro para especular contra a dívida dos países europeus mais fracos.

Mas austeridade e mercados mais calmos não significam que a crise esteja encerrada --na verdade, apontam para o surgimento de uma "eurozona alemã". Analistas que criticam a ausência de liderança forte durante a crise estão bem longe do alvo.

Na prática, a austeridade está transformando a periferia da Europa numa grande Alemanha Oriental: uma área com crescimento tênue, baixos salários, pobreza e nenhum dinamismo econômico.

Aqueles que defendem um organismo abrangente que cuide da política fiscal europeia ou uma união bancária que reduza o risco de colapso das instituições financeiras também estão longe do alvo.

Esse tipo de debate só serve para desviar a atenção da determinação alemã de impor disciplina fiscal rígida aos "delinquentes" e de monitorar só os maiores bancos da eurozona, deixando de fora os pequenos bancos alemães.

Mas a prova mais reveladora da "eurozona alemã" é a relutância em enfrentar a principal causa da crise: a diferença de competitividade entre Alemanha e demais países.

A situação é insustentável: provoca desemprego, destrói a capacidade produtiva e espalha a desesperança. Na Grécia, as condições já ultrapassaram o estágio do absurdo.

À medida que a recessão se aprofundar em 2013, aumentarão tensões econômicas e sociais. A fase mais difícil ainda está diante de nós.

Tradução de ROGÉRIO ORTEGA


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