Folha de S. Paulo


Diversidade racial ganha espaço no RH das agências de publicidade

Reinaldo Canato/Folhapress
Rodolfo Patrocinio (à esq.), fundador da produtora Digital 21, e Celso Alves Cruz, da ESPM, durante o programa Arena do Marketing
Rodolfo Patrocinio (à esq.) e Celso Cruz durante o programa Arena do Marketing

Enquanto a propaganda ainda tem dificuldade de mostrar a diversidade racial do país, começam a surgir iniciativas para ampliar a diversidade nos quadros das agências de publicidade.

A J. Walter Thompson lançou o Programa 20/20 de equidade racial, que visa garantir pelo menos 20% de profissionais negros em cargos estratégicos nas áreas de planejamento, mídia, criação e comunicação.

O programa contou com a consultoria da EmpregueAfro, agência voltada para a colocação de negros no mercado de trabalho, e já conta com 13 estagiários.

"Não abrimos mão da meritocracia, mas a EmpregueAfro nos ajudou a trazer um novo olhar na hora de selecionar os profissionais. Passamos a observar mais as biografias e menos os CVs. O mundo está ficando mais complexo, e o conceito de bagagem e formação cultural mudou", diz Ricardo John, diretor da área de criação da J. Walter Thompson.

A seleção dos estagiários é feita apenas pelo nome e a idade, sem que se revele faculdade ou endereço.

"Avaliamos um trabalho que a pessoa tenha feito sobre a sua comunidade, o tema do TCC, a vontade de aprender. Recebemos o currículo de uma pessoa formada em letras, por exemplo. Esse cara pode ser um redator com o treinamento certo."

PARCERIAS

O programa é renovado a cada seis meses. A Thompson pretende contratar alguns dos profissionais, mas espera fazer parcerias com outras agências para que os demais sejam absorvidos pelo mercado. "Esse é um projeto que não é da Thompson, mas da sociedade. As empresas precisam ter responsabilidade com os grandes temas do país. Não dá ficar só jogando a culpa no governo e nas carências do ensino público", diz.

Além da responsabilidade social, John diz que as agências só têm a ganhar com a diversidade. "Esses jovens trazem um olhar muito mais fresco para a nossa comunicação, que ainda é elitista."

A agência digital New Vegas, especializada em mídias sociais, também já ofereceu estágios e cursos voltados para negros. A Publicis, por sua vez, criou uma plataforma interna para promover a diversidade e a inclusão, além de um comitê de diversidade.

FUNIL

A barreira que impede o acesso dos negros no mercado de trabalho também dificulta o acesso às faculdades.

Na ESPM, referência na formação de profissionais para o mercado publicitário, o tema da diversidade entrou para o currículo, mas ainda é um desafio ampliar o quadro de aluno afrodescendentes.

"Somos uma escola de excelência, com um tíquete elevado para o padrão brasileiro, e isso acaba levando a um afunilamento que se reflete em uma população negra muito pequena entre os alunos", diz o professor da ESPM Celso Cruz, durante o Arena do Marketing, programa realizado pela Folha em parceria com a ESPM, neste mês.

"Não temos uma ação afirmativa, mas temos um investimento forte na área de bolsas. E tentamos engajar o mercado para que ele se comprometa também a trazer bolsas para a escola e a gente consiga refletir mais a sociedade."

Durante o Arena do Marketing, o diretor Rodolfo Patrocínio, sócio da produtora Digital 21, contou ser vítima diária de preconceitos raciais, na vida pessoal e no trabalho.

"É muito comum usar argumentos econômicos para justificar uma atitude racista. Certa vez, fizemos o casting dos atores para a filmagem e o cliente pediu para tirar os atores negros sob o argumento de que 'não vende'."


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