Folha de S. Paulo


Análise

O 'fim do teclado' e os próximos 100 milhões de internautas brasileiros

Bruno Fortuna/Fotos Públicas
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Os números da pesquisa TIC Domicílios 2016 mostram uma tendência bastante clara de inclusão digital por meio do celular, único modo de acesso que cresceu no ano. Com mais de cem milhões de internautas no Brasil, resta chegar a um quinto dos idosos, dois terços dos mais pobres e mais da metade no Norte e Nordeste.

Para isso, os desafios serão semelhantes aos já diagnosticados pelas grandes empresas de tecnologia para chegar ao "próximo bilhão" de internautas.

O primeiro desafio é o do custo. Como detectou a TIC Domicílios, 57% dos que não têm internet acham muito caro. Dos já conectados, muitos pegam carona na internet do vizinho ou usam só wi-fi onde acham. O preço das conexões ainda precisa baixar bastante, mas sempre será impeditivo para alguma fatia da população.

Por isso é que empresas de tecnologia começaram a oferecer wi-fi gratuito em trens indianos, como foi o caso do Google. No Brasil, algumas cidades já oferecem em alguns pontos. O maior problema do wi-fi gratuito é que ele nem sempre é muito seguro e sempre capta informações do usuário para usos comerciais. Mas, para quem tem pouco dinheiro no bolso para usar internet, apagar spam pode não parecer um preço tão alto.

O desafio mais fascinante, porém, é o da tecnologia. O "Wall Street Journal" recentemente falou na "morte do teclado". Para atingir o próximo bilhão de internautas no mundo, que é bem semelhante aos próximos cem milhões de internautas brasileiros, a câmera e o microfone do celular serão interfaces mais fáceis de usar do que o teclado.

Pense em pessoas que têm vários tipos de dificuldade para digitar, das educacionais às motoras. Assim como é muito mais fácil para elas mandar mensagens de áudio do que de texto, a crescente disponibilidade de assistentes de voz deve facilitar buscas e outras utilidades. Ainda é algo bem precário, como bem sabe qualquer um que já tentou conversar com algum aplicativo de mapas, mas está avançando.

A câmera como interface já começou a melhorar bastante a partir dos aparelhos mais sofisticados, ainda fora do alcance do bolso da classe D, mas a grande virada é a do software. "Usar uma câmera de smartphone apenas para tirar e enviar fotos é como imprimir e-mails: você está fazendo uma ferramenta nova caber em formas antigas", escreveu o consultor Benedict Evans há alguns meses.

Empresas aéreas já permitem fazer check-in com uma selfie. Aplicativos de compras, como alguns de livrarias, já permitem reconhecer um livro pela capa, em vez do código de barras. Aplicativos de tradução já vertem textos curtos na própria imagem onde os caracteres são reconhecidos.

Tudo isso cria um cenário interessante para quem cria serviços e conteúdo digital e pensa em atingir esses próximos milhões de internautas. Difícil de navegar, mas promissor —a mesma tecnologia que atinge a classe D geralmente é adotada antes por todas as outras.


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