Folha de S. Paulo


Teto de gasto e meta fiscal têm de coexistir, dizem especialistas

A convivência entre um teto para os despesas do governo e uma meta fiscal que especifique as receitas e sinalize para onde vai a dívida pública é necessária, avaliam especialistas, pelo menos até que a reforma da Previdência saia do papel e o endividamento público esteja em uma trajetória mais controlada.

Em artigo recente, o ex-presidente do Banco Central Francisco Lopes abriu o debate ao defender que a meta fiscal hoje é o total dos gastos sob o regime do teto.

"Não dá para acolher o teto em detrimento da meta fiscal. Com as principais reformas feitas e a garantia de que o teto não vai implodir, até concordaria com a mudança, mas hoje é fundamental manter o duplo esforço fiscal", afirma Zeina Latif, economista-chefe da XP Investimentos.

A avaliação é que o teto para as despesas vai forçar o governo a realizar as reformas estruturais, já que as despesas com salários e as aposentadorias crescem bem acima da inflação e os cortes acabam recaindo sobre outras rubricas, algumas fundamentais à retomada do crescimento, como os investimentos.

A fixação de uma meta fiscal, por sua vez, mantém o governo atento também às receitas necessárias para conter a dívida pública.

O teto de gastos impede o crescimento das despesas acima da inflação. Já a meta fiscal é a economia que o governo promete fazer para impedir que a dívida cresça, a partir de projeções de receitas e despesas.

A questão é que, só com o teto, a poupança para pagamento de juros ficaria ao sabor das receitas, diz Fabio Klein, da Tendências.

O risco de abrir mão da meta fiscal é que, respeitado o teto, a receita pode ser qualquer uma, diz Klein. No entanto, a economia feita pelo governo para pagar juros (o resultado primário) impõe geração de receita.

"Só com o teto, no limite, o governo poderia abrir mão de arrecadação, diminuindo impostos ou desonerando."

Latif diz que, ao coexistir com o teto, a meta fiscal funcionaria como uma restrição adicional, cumprindo um papel importante num quadro de arrecadação ainda muito fraca e que talvez demore a reagir em razão do alto endividamento das empresas e de anos seguidos de prejuízos.

"A meta fiscal é uma forma de lembrar que, talvez, seja preciso mexer com as receitas, elevando tributos, por exemplo, até que haja aprovação das reformas ou margem para gastos", diz.

Carlos Kawall, economista-chefe do Banco Safra, lembra que a meta fiscal oferece previsibilidade de onde se pretende chegar em termos de receitas e despesas, enquanto o teto de gastos seria um indutor das reformas.

"As reformas terão que ocorrer, sob pena de o teto se tornar inócuo", afirma o ex-secretário do Tesouro.

Segundo ele, o bom momento para promover mudanças no sistema é quando se tem credibilidade.

"Quando a dívida estiver sob controle, retomamos essa discussão. Hoje, seria uma irresponsabilidade", diz.


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