Folha de S. Paulo


Ganho não é suficiente para mudar forma de investir, diz especialista

Silvia Zamboni - 28.jun.2016/Valor/Folhapress
Para Ana Leoni, da Anbima, quebrar padrão de comportamento exige esforço para criar um novo hábito
Para Ana Leoni, da Anbima, quebrar padrão de comportamento exige esforço para criar um novo hábito

Sair do conforto da caderneta de poupança e aplicar em opções mais rentáveis pode parecer uma simples questão de fazer conta, mas minimizar ou quebrar um padrão de comportamento exige esforço para criar um novo hábito.

Para isso, é preciso começar com atitudes no dia a dia e comemorar pequenas conquistas que contribuem para um processo de mudança, defende Ana Claudia Leoni, superintendente de educação e informações técnicas da Anbima (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais).

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Folha - O brasileiro costuma optar por investimentos como a poupança mesmo quando a aplicação rende menos que outras. Como explicar esse padrão de comportamento?
Ana Leoni -A caderneta de poupança é um instrumento muito antigo. Nós tendemos a navegar em ambientes nos quais conhecemos mais, ou ao menos já ouvimos falar ou é mais familiar. Isso leva à inércia ou o chamado viés de "status quo".
No aspecto financeiro, a inércia impossibilita a pessoa de prosperar em uma velocidade um pouco maior, porque ela está deixando de potencializar o seu ganho e, para isso, temos um mercado bem favorável. Então, do ponto de vista do poupador, temos oportunidades. Por outro lado, há pessoas que estão com a vida financeira caótica e não saem daquilo justamente pela inércia, uma vez que leva tempo para a pessoa conseguir energia para sair daquela situação.

Considerando que hoje temos aplicações mais rentáveis que a poupança e também seguras, há caminhos ou estratégias para driblar essa inércia?
Qual o gatilho que faz com que a pessoa mude um comportamento? Isso passa por ter a abordagem e comunicação certas. A rentabilidade, que é sempre uma discussão colocada na mesa, é um fato, mas talvez não seja o principal ou o único incentivo a ser evidenciado para a pessoa mudar a sua atitude em relação aos investimentos. No fundo, é uma conta matemática, mas, se não conseguirmos significá-la para quem está em contato com ela, será apenas um monte de números sem nenhum significado.
Acho que há dois aspectos: o interno e o externo. O interno passa muito por um acontecimento que rompa aquele ciclo. Em geral, são eventos negativos, como um divórcio, uma doença ou uma demissão. E há os fatores externos, que têm um papel conjunto da imprensa, do mercado, dos educadores financeiros, de trazer isso para um senso de urgência, o quanto você precisa fazer isso agora.

O famoso "amanhã eu resolvo, vai dar certo" também atrapalha o planejamento financeiro. Com a discussão sobre a reforma da Previdência, você acha que o brasileiro tem condições de olhar um pouco mais para essa questão?
As pessoas olham para a sua vida financeira assim como olham para o ciclo da borboleta. É uma privação o tempo inteiro, em que você tem de abrir mão das coisas legais, viver em um casulo a vida toda para um dia, quem sabe, chegar à aposentadoria, com mais de 70 anos, virar uma borboleta e agora sim curtir a vida.
As pessoas precisam buscar independência financeira para fazer o que elas quiserem no momento em que quiserem. Isso significa estar bem porque pode ser que você tenha de se aposentar amanhã. Pode ser que tenha de se aposentar daqui a trinta anos, mas e se acontece algo no meio do caminho? É necessário construir a sua liberdade durante esses 30 anos.

Como as pessoas tendem a se comportar nesses momentos de crise e o que é preciso fazer para não se desesperar em meio a tanta incerteza?
Talvez este momento as coloque ainda mais na inércia, porque, como todo dia tem uma coisa e não se sabe muito pra onde seguir, ficar parado pode não ser o ideal. Mas o mais importante é termos o filme. Há oportunidades, porque em todo momento de reflexão, nem vou chamar de crise, você tem o lado sombra e o lado luz. O lado sombra tem a ver com inflação, ou seja, cortar gastos. O lado luz tem a ver com mudar aspectos e achar um grande potencial de colocar a vida em ordem.

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RAIO-X:

NOME: Ana Claudia Leoni, 44

CARGO: Superintendente de educação e informações técnicas da Anbima

CARREIRA: Atuou em instituições como SulAmérica Investimentos e Unibanco. Está na Anbima desde 2005. É diretora da Planejar (Associação Brasileira de Planejadores Financeiros)

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