Folha de S. Paulo


Roupas para pessoas com deficiência são renovadas com cores e estampas

Zo Guimaraes/Folhapress
O modelo Joao vestindo a roupa da marca Equal Moda Inclusiva, que faz peças adaptadas para cadeirantes e amputados. Campo de Sao Bento, Niteroi.
João Pedro Torquato, 10, que tem paralisia cerebral, com blusa adaptada

Roupas pensadas para pessoas com deficiência estão deixando o visual sem graça de lado para ganhar cores, estampas e seguir tendências.

A moda inclusiva deve seguir trajetória semelhante às roupas "plus size", que há poucos anos não atraíam a atenção de lojistas e hoje já ganham espaço nas lojas, afirma Fernando Pimentel, presidente da Abit (Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção).

De acordo com o Censo 2010 do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), 45,6 milhões de brasileiros têm algum grau de deficiência -24% da população.

A estilista Silvana Louro, 56, comanda a Equal, marca de Niterói (RJ) que produz peças adaptadas e comuns.

Após 30 anos de trabalho com moda, ela estava prestes a mudar de profissão, quando, em 2013, começou a trabalhar com paratletas e desenvolveu um uniforme para a delegação fluminense participar das Paraolimpíadas Escolares, evento anual.

Louro percebeu que cadeirantes sofriam com as mangas das camisetas, justas demais, e, ao conversar com eles, identificou também a demanda reprimida por peças mais atraentes. "Eles tinham roupas funcionais, mas sem pegada fashion", afirma.

A estilista criou, ainda, calças e saias com modelagem curva, para quem fica o tempo todo sentado.

Já Daniela Auler, 41, começou a estudar o setor após visitar um hospital e notar que havia poucas opções de vestuário disponíveis.

Para pessoas com deficiência, usar peças como calças jeans é mais trabalhoso, por causa da modelagem justa, do tecido e do tipo de abertura. "Acaba virando um novo nicho para o mercado, porque é preciso buscar materiais tecnológicos", diz.

Auler é idealizadora do Concurso Internacional de Moda Inclusiva, realizado anualmente pela Secretaria de Estado dos Direitos da Pessoa com Deficiência de São Paulo. Em dezembro, o evento chega a sua 9ª edição.

TECNOLOGIA E NEGÓCIOS

De acordo com Paula Acioli, coordenadora do curso de Gestão Estratégica em Negócios de Moda da FGV-RJ (Fundação Getulio Vargas), inovações como a impressão 3D podem ser aliadas no incentivo à produção em maior escala de roupas desse tipo, que precisam de pesquisa e design mais elaborados.

"Em breve poderemos ter a moda inclusiva como parte integrante de coleções comerciais criadas para grandes redes de lojas", afirma.

Para se manter a par das novidades, acrescenta a coordenadora, o empresário precisa ter conexões com pesquisadores, médicos, especialistas, hospitais e instituições que realizam pesquisas na área, além de acompanhar trabalhos acadêmicos, revistas e blogs da área médica, de moda e tecnologia.

Em funcionamento desde 2013, a marca Lado B é especializada em calças e bermudas adaptadas.

"Desenvolvemos tudo de acordo com o que os nossos clientes precisam, depois analisamos a parte tecnológica, quais tecidos usar, os aviamentos, se o fecho será com velcro, zíper ou botão", afirma a fisioterapeuta Dariene Rodrigues, 39, fundadora da empresa.

Localizada em Sorocaba (a 99 km de São Paulo), a Lado B comercializa, em média, 50 peças por mês, pela internet e em uma clínica em Presidente Prudente (a 570 km da capital paulista).

Para Rodrigues, a principal dificuldade para expandir as vendas é chegar ao seu público-alvo, que ainda não está acostumado a ter peças feitas sob medida, e em casos severos, depende de cuidadores para adquirir suas roupas.

"Estou estudando o meu público para saber como facilitar essa compra", afirma.

De acordo com Bruno Zamith, consultor de negócios do Sebrae, é essencial identificar em quais locais o consumidor costuma comprar o produto e marcar presença nesse ambiente, seja uma loja física ou um site. E prestar muita atenção no conforto das peças. "Uma etiqueta no lugar errado pode arranhar e influenciar a compra."

Testar o produto e ouvir o que o consumidor tem a dizer também é fundamental.

A empresária Daniela Barreiro, 44, vai lançar em dois meses sua marca de roupas para crianças, a Iuni.

Ela percebeu a demanda em um grupo de mães empreendedoras, no qual algumas tinham filhos com deficiência. "Me disseram que quem tem condições compra as roupas fora do país. Quem não tem adapta na costureira."

CURSOS

Há poucos cursos voltados para a moda inclusiva. Um deles é o do CTI (Centro de Tecnologia e Inclusão), da Secretaria de Estado dos Direitos da Pessoa com Deficiência de São Paulo. Gratuito, ele oferece módulos sobre a história da moda inclusiva, desenvolvimento de produtos, desenho técnico, comunicação de marca e marketing para varejo. As próximas aulas serão ministradas nos dias 1º e 2 de agosto.

As inscrições devem ser feitas pelo e-mail sau@ctipfi.spdm.org.br.

IGUAL, MAS DIFERENTE
Roupas adaptadas devem ser parecidas com as comuns, mas exigem cuidados:

Opte por tecidos leves e maleáveis, que não esquentam, evitando assim a coceira; dê preferência a costuras e etiquetas delicadas, para não causar feridas

Inclua aberturas laterais no desenho das calças, para permitir que pessoas sem movimento nas pernas se vistam deitadas, além de facilitar a troca de próteses

Para tornar mais fácil o momento de vestir o paciente, incorpore aberturas na parte de trás de blusas; botões com ímãs também descomplicam o manuseio

Acrescente alças no cós de calças e nas mangas de blusas, assim, pessoas que perderam o movimento de pinça nas mãos podem se vestir sozinhas

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67,7%
da população com 65 anos ou mais tem algum tipo de deficiência

403,2 mil
pessoas com deficiência estão no mercado de trabalho formal


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