O capitalismo está prestes a chegar ao fundo do poço, ou, como sempre, vai se adaptar às crises e pressões externas, criando mercados e oportunidades de crescimento?
É nesse debate, que divide opiniões há pelo menos dois séculos, que o inglês Paul Mason se aventura a entrar em "Pós-Capitalismo: Um Guia para o Nosso Futuro".
Segundo o jornalista, hoje vivemos a fase derradeira do capitalismo global. A tendência a compartilhar informações e bens (ou seja, a internet) deve derrubar as margens de lucro dos empresários e industriais, sobrepujando a elite financeira.
Um ouvinte atento levantaria a mão a essa altura, já que Facebook, Uber, Google e Microsoft descobriram, há tempos, formas de lucrar com o monopólio da informação. Mason antecipa e refuta essa objeção, pintando as forças do Vale do Silício como uma resistência fútil à maré democratizante da tecnologia.
Sua tese se ancora em três pontos: (1) a tecnologia reduziu a necessidade de trabalho, de onde tradicionalmente saía a mais-valia; (2) as pessoas têm executado empreendimentos colaborativos, como a Wikipédia; (3) bens de informação destroem a habilidade do mercado de ditar preços corretamente, porque não obedecem ao princípio da escassez.
Fato é que nenhum desses três elementos se sustenta como realmente inédito. Então por que o capitalismo deveria acabar agora, e não antes?
Para responder, Mason revê todos os que disseram algo semelhante, como Marx, Rosa Luxemburgo, Kondratiev e mais um punhado de russos. Todos, diz o autor, cantaram o apocalipse cedo demais, porque negociações entre classe trabalhadora e Estado permitiram que o capital se adaptasse. Dessa vez, não haveria essa opção.
É aqui que deveriam entrar os números. Mas, apesar de ele incluir um punhado de gráficos e argumentar com riqueza de detalhes, a base do argumento não é um modelo econômico, e sim o otimismo de que a situação dos trabalhadores vai piorar tanto que, depois, só pode melhorar.
Essa ideia não é nova, e, aliás, tem teias de aranha na esquerda. A força propulsora da tecnologia não necessariamente muda o cenário.
A fixação de Mason pela futurologia, inclusive, é pouco saudável. A certa altura, ele diz que a teoria da história de Marx é boa porque "armados com uma compreensão de classe, poder e tecnologia, podemos prever as ações dos homens poderosos".
Passa longe disso a utilidade de Marx. Essas previsões não funcionaram para os soviéticos, para citar um exemplo óbvio, e esse é um argumento que muitos marxistas ferrenhos cedem à oposição.
Quando Mason fantasia a respeito do futuro, diz que a tecnologia pode criar condições para que a operação de uma fábrica de empacotamento de carne seja "entremeada de diversão" –uma de muitas maluquices que põem em xeque a seriedade de sua exposição sobre economia.
Pós-capitalismo - Um Guia Para O Nosso Futuro |
Paul Mason |
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Em outro trecho espantoso, ele defende que, no pós-capitalismo, o Estado "tem que agir como a equipe da Wikipédia". O autor não deve saber, mas a história da Wikipédia é repleta de intrigas, sede de poder e censuras impostas unilateralmente. Para quem está a par, o efeito desse capítulo é cômico.
Graduado em ciência política e música, Mason chega a se comparar a John Maynard Keynes em seus momentos de empolgação. É justamente nesses arroubos de megalomania que seu livro fica divertido. Ele não tem medo de brincar de economista, e inspira o leitor a fazer o mesmo.