Folha de S. Paulo


ANÁLISE

Aumento de impostos corrige excesso de otimismo do governo

Um otimismo exagerado na elaboração e na votação do Orçamento explica por que o governo está promovendo, às pressas, um aumento de impostos antes dado como desnecessário.

Quando a equipe econômica do presidente Michel Temer fez a primeira estimativa oficial para as receitas deste ano, em agosto de 2016, as projeções para a expansão da economia eram crescentes.

Naquele mês, a expectativa de analistas e investidores para a alta do PIB (Produto Interno Bruto), medida da produção e da renda do país, em 2017 passou de 1,1% a 1,3%.

EVOLUÇÃO DA CARGA TRIBUTÁRIA - Como estão os impostos, da Constituição de 1988 até hoje

Em sua proposta orçamentária, o governo Michel Temer utilizou uma taxa ainda mais favorável, de 1,6% —e, considerando tal melhora na atividade econômica, previu uma retomada da arrecadação.

Enquanto o texto era examinado pelo Congresso, no último quadrimestre do ano passado, ficou claro que tais esperanças não se concretizariam. A opção, porém, foi deixar tudo como estava.

Os resultados da indústria, dos serviços, do consumo e dos investimentos mostraram que a recuperação caminhava a passos lentos.

Em dezembro, a previsão média do mercado para a alta do PIB em 2017 não passava de 0,5% —a mesma taxa que o governo passou agora a considerar em sua programação de receitas e despesas.

Mas havia um tanto de realismo político no irrealismo econômico agora desfeito.

PROPOSTAS EM DISCUSSÃO - O que pode ser feito para reformar a tributação do Brasil; em % do PIB em 2015

Um Orçamento menos otimista teria antecipado o inglório debate sobre aumento de impostos, num momento em que o Palácio do Planalto negociava no Congresso o teto dos gastos públicos, já polêmico o bastante.

As novas medidas evidenciam agora que o teto, por si só, não é solução para o desequilíbrio das contas do Tesouro –enquanto os gastos estão congelados, é preciso que a arrecadação cresça, de preferência graças à economia.

Alguns dos setores que perderam o benefício - Fatia do valor total das desonerações, em %*

Pelas estimativas da lei orçamentária, a receita neste ano deveria subir de 17,3% para 17,4% do PIB, uma ligeira recuperação após três anos de quedas sucessivas.

Refeitos os cálculos, estimou-se novo recuo em 2017, para 16,9% do produto. É o que se tenta evitar, ou minimizar, com a reoneração das folhas de pagamentos.

Quanto às despesas, faltam alternativas. Os programas não obrigatórios são compostos, basicamente, por investimentos e custeio administrativo. Não há dúvida de que os gastos são inflados por desperdícios e ineficiências, sem falar na corrupção. Combater tudo isso, porém, leva tempo.

OUTROS PAÍSES - Como é fatiada a carga tributária pelo mundo, em % do PIB (2015)

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PROPOSTAS EM DISCUSSÃO

O que pode ser feito para reformar a tributação do Brasil

INSS

Qual é o problema?
A alíquota de 20% sobre a folha de pagamento é considerada por especialistas prejudicial à geração de empregos formais no país

O que pode ser feito?
Governo vai tentar acabar com a desoneração para setores específicos promovida pela ex-presidente Dilma, porque avalia que os benefícios gerados no emprego não compensaram a perda de arrecadação

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Cofins e PIS/Pasep

Qual é o problema?
Existe muita discussão sobre o que pode ser considerado insumo e, portanto, passível de crédito. Além disso, proliferaram regimes especiais, que beneficiam setores específicos

O que pode ser feito?
Por meio de medida provisória, governo reduziria o número de alíquotas do PIS e da Cofins, tentando harmonizar os diferentes regimes. As regras para compensação serão simplificadas e aplicadas a todos os tipos de insumo

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ICMS

Qual é o problema?
Para atrair investimentos, os Estados reduzem o ICMS para empresas e setores, promovendo a "guerra fiscal". Outra dificuldade importante é que os exportadores acumulam créditos, mas não conseguem receber

O que pode ser feito?
A meta do governo é colocar fim à guerra fiscal, reduzindo a alíquota interestadual a 4%. As alíquotas dentro dos Estados também seriam unificadas

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ENQUANTO ISSO, NO CONGRESSO...

Tramita proposta do deputado Luiz Carlos Hauly, que prevê a extinção de sete tributos federais (IPI, IOF, CSLL, PIS, Pasep, Cofins e salário educação), do ICMS e do ISS. Em troca seriam criados três impostos: IVA (Imposto sobre Valor Agregado), Imposto Seletivo e Contribuição Social sobre Operações e Movimentações Financeiras (antiga CPMF). O deputado, no entanto, já deu sinais de que pode desistir de recriar ?a CPMF

É POSSÍVEL FAZER A REFORMA TRIBUTÁRIA?

Diferentes governos já tentaram reformar o sistema tributário brasileiro -as iniciativas mais recentes ocorreram em 2008 e 2011-, mas não tiveram sucesso, em razão da resistência dos Estados e dos setores prejudicados

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"Hoje o ambiente está mais favorável à reforma tributária. Os Estados entenderam que a guerra fiscal é disfuncional e muitas empresas viram que benefícios fiscais isolados não compensam"

BERNARD APPY, diretor do Centro de Cidadania Fiscal


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