Folha de S. Paulo


Ensino no Brasil precisa de um 'técnico da seleção', diz economista

O Brasil precisa de uma instituição que seja responsável pelo avanço da educação e preste contas desse processo à sociedade, o que incluiria a perda do emprego de seus gestores em caso de falha. Essa é a opinião do economista Ricardo Paes de Barros: "Falta pensar quem é responsável por isso aqui".

Folha - Que principais problemas vocês identificam no ensino médio e quais as melhores soluções para atacá-los?

Ricardo Paes de Barros - Trazemos a evidência científica e tentamos deixar essa conclusão para o gestor público. Se eu falasse diretamente para ele apostar em uma solução A, B ou C, seria um erro. Embora, se eu fosse um dos gestores, eu teria minha opção.

E qual seria?

Apostaria muito mais na flexibilidade, no significado do clima escolar. A qualidade da escola não é tão importante quanto ela ter significado e ser acolhedora.

Quando o sr. fala em qualidade, se refere ao professor, à infraestrutura, à tecnologia?

Não precisa ter um professor tão bom assim quando ele tenta te ensinar algo que tem significado. O aluno não vai prestar atenção até perceber que o professor se importa com ele. O professor pode ser supergenial, mas se não se importa com o aluno, ele não vai se conectar. A conexão e a interação são muito importantes. Você dá um jeito na qualidade depois.

Você tolera um cantor que não seja tão bom desde que ele esteja cantando o que você quer que ele cante.

Há evidências de que isso funciona na prática?

Não, a gente tenta juntar evidências. Dada as que existem, que são bastante limitadas, não tem nada que diga que isso é a solução, isso é em que eu apostaria, a minha aposta.

Parece haver um excesso de opiniões sobre educação no Brasil. Isso atrapalha?

Eu acho que nosso problema com educação é, como no futebol, muitas pessoas querendo ser técnicas da seleção e um número muito pequeno de fatos, interpretados de maneiras completamente diferentes.

E a gente, às vezes, se perde, não sabemos se estamos debatendo as interpretações ou os fatos.

O que falta para o Brasil é uma autoridade com governança bem definida, responsável por fazer a educação avançar. Que seria o "técnico da seleção" de verdade.

Nós temos o Ministério da Educação e o Inep [instituto ligado ao MEC], mas temos crise de governança.

Falta pensar quem é responsável por isso aqui. Todo mundo ter sua opinião sobre como a seleção deveria jogar não é um problema, o problema é não ter ninguém responsável por ganhar o jogo. O que quero dizer é, "se eu não ganhar, eu peço demissão".

O que o sr. acha da proposta do governo para reformar o ensino médio?

Acho que aponta na direção certa porque fala da necessidade de maior flexibilidade e maior engajamento.

Os anos finais do ensino fundamental, em que os problemas começam, não deveriam ser reformados antes do médio?

Logicamente sim, mas tem o caso de Pernambuco e outros Estados que conseguiram mexer primeiro no médio maravilhosamente bem. Talvez isso sirva para mostrar para o jovem: "Olha, tenho uma boa escola de ensino médio", vale a pena insistir.


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