Folha de S. Paulo


Análise

Transação entre Bayer e Monsanto aumenta temor de mais restrições às pesquisas

Michael Sohn - 2.out.2013/Associated Press
Bayer anuncia compra da empresa de sementes Monsanto por US$ 66 bilhões
Bayer anuncia compra da empresa de sementes Monsanto por US$ 66 bilhões

A compra da empresa de biotecnologia Monsanto pela gigante química Bayer dará origem à maior companhia agroquímica do planeta. Para o bem e para o mal, ela dominará um quarto do mercado mundial no setor.

A fabricante alemã de aspirina assume grave risco para sua imagem ao associá-la com a demonizada campeã americana dos transgênicos.

Se o faz, e por US$ 66 bilhões, é para garantir as vantagens tecnológicas que a colocarão em posição privilegiada para lucrar com a alimentação de 10 bilhões de pessoas no fim deste século.

Foi meio por sorte que a Monsanto descobriu, nos anos 1990, bactérias que resistiam ao seu herbicida, o glifosato, campeão de vendas sob a marca Roundup. A empresa soube dar a guinada tecnológica que isolou o traço genético bacteriano e o inseriu em plantas como a soja, dando nascimento à agricultura biotecnológica.

Hoje a Monsanto reinveste em pesquisa e desenvolvimento coisa de 10% do que fatura, mais de US$ 1 bilhão por ano. Suas sementes geneticamente modificadas de soja, milho e algodão monopolizaram campos de cultivo nos EUA e noutros líderes agrícolas, como o Brasil.

A Bayer aposta alto, assim, na biotecnologia que deu longa sobrevida aos lucros com o glifosato. O agrotóxico, no entanto, teve sua aprovação pela Comissão Europeia prolongada por apenas um ano e meio, em junho, e enfrenta confusa controvérsia sobre seu potencial cancerígeno.

A tecnologia transgênica na agricultura também enfrenta grande resistência em solo europeu, em especial na Alemanha, da parte dos muitos adeptos de alimentos livres de agroquímicos, ditos "orgânicos". Outra fonte de rejeição é o excessivo poder que o pacote tecnológico de sementes e defensivo confere à Monsanto sobre os produtores rurais, que têm de pagar caro pelo uso contínuo.

Acusa-se a empresa, ainda, de erguer um excesso de obstáculos à pesquisa com seus cultivares e traços genéticos (construções de DNA) protegidos por propriedade intelectual. Uma empresa com ainda maior poder de mercado e mais patentes no portfólio teria poderosos incentivos para usar esses instrumentos a fim de ampliar seu predomínio comercial.

Não se sabe se, diante de tudo isso, a Bayer decidirá manter a marca Monsanto no mercado. De todo modo, o chefe da divisão agrária da Bayer, Liam Condon, disse ao jornal alemão "Frankfurter Allgemeine" que "nada se abalará em nossos valores e obrigações sociais".


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