Folha de S. Paulo


Fabricante dinamarquesa de turbina eólica coleta dados para cortar custos

Laerke Posselt/The New York Times
Turbinas eólicas da Vestas perto de Copenhague, na Dinamarca
Turbinas eólicas da Vestas perto de Copenhague, na Dinamarca

Um projeto para instalar centenas de turbinas eólicas na área da península de Fosen, Noruega, foi abandonado, em dado momento, por ser considerado inviável. As fortes brisas que agitam o mar podem mudar de direção e oscilar imprevisivelmente, e as encostas íngremes e as diferenças de altura causadas por elas criam turbulências que desgastam equipamentos dispendiosos.

A empreitada foi resgatada com muita ajuda dos cálculos matemáticos da Vestas Wind Systems, uma companhia dinamarquesa de energia eólica.

A Vestas usou dados para descobrir como usar turbinas mais poderosas no projeto, e onde instalá-las, precisamente. Isso possibilitou à empresa de energia que estava desenvolvendo o projeto comprar menos turbinas, o que reduziu o custo e permitiu balancear o aspecto econômico de um investimento de US$ 1,2 bilhão.

A empresa está na vanguarda dos esforços para fazer da energia eólica uma fonte de energia competitiva, em lugar de apenas uma experiência subsidiada. Ao fazê-lo, se tornou um modelo para o setor de energia renovável, que ocasionalmente enfrenta dificuldades para se manter viável quando encara cortes de subsídios da parte do governo e a instabilidade nos preços do petróleo e gás natural.

A Vestas compreende o quanto o negócio de energia renovável é instável.

Depois da crise financeira e da desaceleração na economia mundial, a companhia enfrentou problemas com seus custos muito elevados, em meio a uma queda de subsídios e a cortes pesados nas encomendas de turbinas eólicas. Não foi o primeiro infortúnio pelo qual a companhia passou —nos anos 80, ela quase foi à falência.

A confiança na empresa havia "chegado ao fundo do poço", reconhece Bert Nordberg, que se tornou presidente de seu conselho no meio da mais recente crise. Uma dolorosa rodada de corte de custos se seguiu. A Vestas fechou ou vendeu 19 de suas 31 fábricas em todo o mundo, cortou em um terço sua força de trabalho, para 15,5 mil empregados, e se concentrou em um número menor de modelos de turbinas eólicas.

Em 2013, contratou um novo presidente-executivo, Anders Runevad, que como Nordberg é sueco e antigo executivo da Ericsson. Na Dinamarca, que sofreu os cortes mais pesados, os operários brincavam sobre a nova abordagem "sueca" quanto aos negócios.

As medidas, combinadas a uma recuperação no mercado de turbinas eólicas, deram resultado rapidamente. Depois de três anos consecutivos de prejuízos, até 2013, a Vestas saiu do vermelho no primeiro trimestre de 2014. Na quinta-feira, a empresa reportou lucro de € 278 milhões (US$ 313 milhões) no segundo trimestre, mais que o dobro do resultado do período em 2015. O faturamento subiu em 46%, para € 2,6 milhões.

MELHORA

O setor como um todo também está em melhor forma. O faturamento de um conjunto de oito grandes fabricantes de turbinas, entre as quais a Vestas, cresceu em 17% no ano passado, para € 27 bilhões, de acordo com David Vos, analista do setor de energia renovável para o banco Barclays, em Londres.

Produzir energia eólica também está ficando mais barato. Em algumas partes do mundo, como a Índia, criar um parque eólico para fornecer energia a uma fábrica ou cidade pode até ser mais prático do que métodos convencionais, como a construção de um gasoduto.

As turbinas são competitivas com os combustíveis fósseis até mesmo em lugares ricos em petróleo, como a região do Texas Panhandle, nos Estados Unidos, o maior mercado da Vestas. Sob circunstâncias favoráveis, Vos calcula o custo da energia eólica na região em cerca de US$ 29 por megawatt/hora, ao longo da vida do projeto, ante US$ 33 por megawatt/hora para novas usinas acionadas por gás natural nos Estados Unidos.

A natureza internacional do setor beneficia uma companhia como a Vestas.

Ao contrário de seus rivais —a exemplo da General Electric, cujo foco está na América—, as vendas da Vestas cobrem área mais ampla do planeta. Ela vendeu turbinas eólicas em 34 países no ano passado, e controla a maior fatia do mercado mundial de turbinas eólicas onshore, excluída a China (cujo mercado é dominado por fabricantes nacionais).

"A vantagem de escala de que eles desfrutam é fenomenal", disse Vos.

Fundada como ferraria familiar em 1898, a Vestas ao longo dos anos fabricou ampla variedade de produtos, entre os quais equipamento para laticínios e guindastes. Começou a experimentar com turbinas eólicas nos anos 70, como uma fonte alternativa de energia para os agricultores locais, em uma era de preços voláteis para o petróleo. A primeira turbina que a empresa vendeu, baseada em um projeto de ferreiros locais, tinha um rotor de apenas 10 metros de diâmetro.

Agora, suas turbinas são não só muito maiores como muito mais produtivas.

A empresa instala turbinas gigantes que podem atingir alturas de mais de 150 metros, com pás de hélice individuais de quase 57 metros, girando a mais de 290 km/h. Sua mais recente geração de aparelhos gera 25 vezes mais eletricidade por ano do que os equipamentos que ela produzia nos anos 80.

Crucial para esse progresso vem sendo a coleta de dados, algo que a Vestas faz há muitos anos e em larga escala.

"Quando você trabalha com a seleção de locais e a venda de turbinas eólicas, precisa conhecer exatamente as condições do tempo no local em que coloca a turbina", disse Lars Christian Christensen, o vice-presidente de solução para usinas da empresa, em entrevista na sede da Vestas nas cercanias de Aarhus, um porto na península dinamarquesa da Jutlândia.

A Vestas vem refinando as técnicas matemáticas para prever a velocidade, variabilidade e outras características do vento há mais de uma década. Em 2006, a empresa adquiriu alguns poucos computadores para testar os benefícios do uso da previsão de força de vento na seleção de potenciais locais para turbinas. Quando os clientes demonstraram gostar do resultado, a Vestas decidiu adquirir um supercomputador, em 2008. Melhorou sua tecnologia e formou uma equipe de meteorologistas para ajudá-la a adaptar seus modelos climáticos.

Isso significa que a companhia pode, por exemplo, prever de que maneira o vento provavelmente se comportará em qualquer trecho de 10 metros quadrados do planeta, nos 20 anos de vida útil de uma turbina eólica. Ao incorporar outras variáveis, como o custo de arrendamento do terreno e a tarifa que um cliente receberia pela eletricidade que vende, a Vestas pode rapidamente oferecer a um comprador um cálculo do retorno financeiro de um dado local.

Os modelos também permitem que uma empresa determine onde as turbinas devem ser posicionadas e qual dessas turbinas produziria a maior receita. Como suas rivais, a Vestas agora projeta turbinas para locais onde os ventos fortes e fracos se alternam. Pode identificar períodos de calmaria nos quais as turbinas podem ser paradas para manutenção com a menor perda de receita.

No caso de Fosen, isso quis dizer que a empresa pôde ajudar a Statkraft, a estatal norueguesa de energia que estava construindo o parque eólico, a economizar dinheiro e salvar o projeto. A Vestas ofereceu turbinas mais poderosas, que ainda não estavam no mercado, o que significou que a Statkraft pôde comprar menos equipamentos e economizar nos custos de instalação em Fosen, cuja capacidade de geração é de um gigawatt de energia —comparável à de algumas usinas nucleares—, quando o vento sopra com força suficiente.

"Eles são muito avançados", disse Espen Hagstrom, diretor técnico da Statkraft. "Talvez sejam os melhores".

A despeito das vantagens, a Vestas ainda pode ter de enfrentar turbulência no setor, de incerteza quanto aos futuros subsídios governamentais à instabilidade nos preços do gás natural e petróleo.

Companhias um dia importantes como a gigante da energia solar SunEdison, nos Estados Unidos, e a Abengoa, da Espanha, terminaram derrotadas. E alguns dos rivais mais formidáveis da Vestas, como as divisões eólicas da General Electric e da alemã Siemens, são parte de empresas maiores e dotadas de muito mais recursos financeiros, que podem facilmente derrotar a Vestas em termos de gastos.

"O foco está em nos mantermos à frente" disse Runevad, o presidente-executivo da Vestas. "Nosso foco é essencialmente esse".

Tradução de PAULO MIGLIACCI


Endereço da página: