Folha de S. Paulo


Snapchat tenta fazer anunciantes superarem 'medo do fantasma'

Lionel Bonaventure - 2.jan.2014/AFP
Logo do Snapchat, que tenta atrair anunciantes para a plataforma
Logo do Snapchat, que tenta atrair anunciantes para a plataforma

Quando Evan Spiegel, o presidente-executivo do Snapchat, subiu ao palco em junho de 2015 em uma conferência de marketing em Cannes (França) para promover o marketing em seu serviço de mensagens efêmeras, os anunciantes o receberam com cautela.

Mas em junho deste ano, quando uma nova edição da conferência foi realizada em Cannes, o Snapchat tinha se tornado uma das plataformas de marketing mais comentadas. A empresa está conseguindo convencer as companhias de que seus anúncios —que permitem que usuários adornem fotos e vídeos com toda espécie de imagens e marcas— criam uma experiência mais interativa que os anúncios do Facebook e YouTube, assistidos passivamente pela maioria dos usuários.

"Os anunciantes querem estar presentes na mídia mais nova e da moda, e, neste ano, é o Snapchat que ocupa essa posição", disse Chad Stoller, executivo da consultoria de marketing IPG Media Lab.

A maneira pela qual o Snapchat colocou sua publicidade nos trilhos serve como exemplo de uma start-up de rápido crescimento que soube superar os problemas da expansão e persuadir outras empresas a experimentar maneiras inéditas de atingir os consumidores.

Quando o Snapchat se abriu à publicidade, mais de um ano atrás, muita gente se queixou, inicialmente, de que a empresa precisava baixar os preços dos anúncios. Havia quem não entendesse como atingir a audiência certa com os anúncios, porque a plataforma não oferece as ferramentas tradicionais de direcionamento de publicidade. Acima de tudo, os anunciantes imaginavam de que maneira o Snapchat poderia ser efetivo quando os anúncios desaparecem —exatamente como as mensagens trocados pelo serviço.

Nos últimos 15 meses, o Snapchat agiu para responder. Introduziu novos formatos de publicidade. Usou sua atraente base de usuários —o serviço agora conta com 150 milhões de usuários ativos ao dia, o que inclui metade dos jovens dos 18 aos 34 anos nos Estados Unidos— a fim de atrair anunciantes. O mais importante é que o Snapchat conseguiu convencer marcas como Tiffany & Co., Kraft Foods e Burger King de que seus anúncios permitiriam que interagissem de maneira brincalhona com essa audiência jovem.

Quando o Snapchat ingressou no negócio da publicidade, "não tinha a infraestrutura necessária, e o mercado não compreendia bem a empresa", disse Sarah Hofstetter, presidente-executivo da agência de publicidade 360i. "Foi um começo acidentado".

Agora, o Snapchat enfrenta o desafio de manter seu negócio publicitário nascente diante da reação de adversários preocupados com o sucesso rápido da empresa. Na terça-feira, o Instagram, o app de compartilhamento de fotos controlado pelo Facebook, lançou o Stories, um chat com fotos e vídeos que é quase uma cópia do Snapchat.

Muito depende de o Snapchat conseguir expandir seus negócios publicitários. A companhia, que Spiegel ajudou a fundar em 2011 e hoje tem sede no bairro de Venice Beach, em Los Angeles, precisa justificar o valor de mercado de US$ 19 bilhões que lhe foi atribuído pelos investidores. A empresa também tem de satisfazer expectativas muito ambiciosas quanto ao seu faturamento publicitário: o banco de investimento Jefferies recentemente projetou que a receita publicitária do Snapchat pode crescer a mais de US$ 1 bilhão no ano que vem, ante mais de US$ 350 milhões neste ano.

Em entrevista, Imran Khan, o vice-presidente de estratégia do Snapchat, disse que os formatos publicitários da empresa deram às marcas uma "plataforma criativa" que faz dos anúncios uma "experiência natural". O Snapchat não revela números sobre seu faturamento.

QUEM COMANDA?

Embora a figura mais conhecida do Snapchat —afora o fantasma de seu logotipo— seja a do jovial Spiegel —que no ano passado foi fotografado para a revista italiana "L'Uomo Vogue", rolando na praia com sua noiva, uma top model—, é Khan, antigo executivo de banco de investimento, que vem comandando os esforços publicitários da empresa. Khan começou a trabalhar para o Snapchat no fim de 2014.

Naquele momento, o Snapchat havia acabado de veicular seu primeiro anúncio, um trailer curto para o filme de terror adolescente "Ouija - O Jogo dos Espíritos". Os anunciantes contam que aquelas campanhas iniciais em vídeo tinham preços comparáveis aos dos anúncios mais caros do YouTube, que custam centenas de milhares de dólares.

"Àquele preço, era difícil demais testar o terreno e aprender em um novo ambiente", disse Hofstetter, da 360i.

Khan começou a responder às preocupações dos anunciantes enquanto montava uma equipe de publicidade. Ele recentemente contratou Jeff Lucas, antigo vice-presidente de vendas de publicidade da Viacom, para ocupar o mesmo posto em sua empresa. Abriu novos escritórios de vendas em cidades como Londres e Sydney, a fim de oferecer mais apoio àqueles que estão criando anúncios para o Snapchat.

O Snapchat também começou a introduzir produtos publicitários menos dispendiosos, alguns dos quais com preço inicial de apenas US$ 5. Neste trimestre, a empresa começou a permitir a venda de espaço publicitário por terceiros, o que facilita colocar mais publicidade no app.

PARA CONVENCER

O maior trabalho para Khan é o de explicar por que a plataforma incomum do Snapchat pode ser melhor para os anunciantes. A tarefa era difícil porque o Snapchat é um serviço de mensagens e compartilhamento no qual a maior parte do conteúdo desaparece. Os anunciantes dispunham de poucos apps semelhantes aos quais compará-lo.

O potencial veio a se tornar mais claro depois que as marcas começaram a experimentar os geofiltros do Snapchat, uma ferramenta que adiciona stickers especiais, uma forma de ícone colorido, ao app quando as pessoas entram em uma área geográfica específica, e lentes, imagens brincalhonas que transformam o rosto do usuário no app.

Depois do Super Bowl deste ano, por exemplo, o Gatorade comprou uma lente do Snapchat que permitia que as pessoas despejassem um barril virtual da bebida energética sobre suas imagens no app. A lente foi vista cerca de 165 milhões em um dia apenas. Em contraste, o anúncio mais assistido no YouTube, no ano passado, "Clash of Clans: Revenge", foi visto 82 milhões de vezes de acordo com a revista "AdWeek".

As marcas que estavam "se concentrando demais nas estatísticas" subitamente viram no Snapchat uma "maneira brincalhona de aprofundar a lealdade e afinidade dos consumidores", disse Constance DeCherney, diretora de estratégia da agência TDA Boulder.

Em maio, para o feriado mexicano do Cinco de Mayo, a cadeia de fast food Taco Bell criou uma lente de Snapchat que permitia que as pessoas transformassem suas cabeças em tacos, no app, com o logotipo da empresa presente com destaque na tela. Esses comerciais com lentes especiais para datas festivas podem custar até US$ 750 mil. O anúncio foi visto por 224 milhões de pessoas em um dia - e é o mais visto na história do Snapchat.

"Era só taco, taco, taco", disse Ryan Rimsnider, diretor sênior da equipe de mídia social da Taco Bell. "Foi meio surreal".

A Taco Bell é grande anunciante e foi uma das primeiras empresas que decidiu utilizar o Snapchat como ferramenta de branding. Os executivos do Snapchat foram recentemente convidados para uma festa de terceiro "snapversário" da empresa, que incluía um filtro geográfico especial para o evento. A Taco Bell posteriormente mandou um caminhão de tacos para a sede do Snapchat.

Desde essas primeiras experiências publicitárias, outras marcas decidiram realizar campanhas no serviço de mensagens. Na semana passada, a Tiffany & Co. iniciou sua primeira campanha no Snapchat, com uma lente que envolvia seu logotipo e corações voadores no azul da Tiffany, que as pessoas podiam usar para decorar seus selfies e vídeos.

O Snapchat afirma que milhões de consumidores nos Estados Unidos, Austrália e Itália brincaram com a lente por tempo mais ou menos semelhante ao que seria necessário para assistir a um anúncio em vídeo convencional. Depois, compartilharam as fotos e vídeos criados, o que difunde a marca da Tiffany. A lente já saiu de circulação, substituída por um geofiltro que acrescenta stickers com a marca da Tiffany a fotos, quando um usuário entra em uma loja da empresa.

"Os consumidores querem algo mais que uma experiência passiva", disse Diana Hong-Elsey, vice-presidente mundial de marketing digital da Tiffany. "Quando você sabe que o conteúdo vai desaparecer, quer interagir com ele na hora".

Tradução de PAULO MIGLIACCI


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