Folha de S. Paulo


Financiamento do BNDES às obras no exterior é maior do que o feito no país

Sergio Moraes - 10.ago.2015/Reuters
The headquarters of Brazilian Development Bank (BNDES) is pictured with the headquarters of oil company Petrobras reflected on its facade in downtown Rio de Janeiro, Brazil, August 10, 2015. To match BRAZIL-ECONOMY/INVESTMENTS REUTERS/Sergio Moraes/Files ORG XMIT: SMS101
A sede do BNDES, no centro do Rio

O valor de R$ 50,5 bilhões que o BNDES emprestou para 140 grandes obras fora do país é "incompatível" com o gasto realizado pelo banco no Brasil, como deveria ser.

A conclusão é de uma auditoria prévia do TCU (Tribunal de Contas da União) realizada sobre obras de rodovias, portos, aeroportos, entre outros feitas em países da África e da América Latina que foram financiadas pelo banco estatal brasileiro entre 2006 e 2014.

Por causa da desconfiança de que os recursos usados para os empréstimos, que são do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador), não foram todos gastos no Brasil e de que não houve análises adequadas sobre o risco dos empréstimos não serem pagos, o TCU decidiu ampliar o levantamento dando prazo de 90 dias para que o BNDES e outros órgãos ligados aos ministérios da Fazenda e das Relações Exteriores apresentem documentos sobre as operações.

Os empréstimos para investimentos fora do país são motivo de polêmica desde o início, com a oposição acusando o governo de usar recursos brasileiros para contratar trabalhadores estrangeiros, financiar ditadores, dar dinheiro a financiadores de campanha entre outras críticas.

Os números do TCU apontam que 99% dos empréstimos ficaram com cinco grandes empreiteiras, todas envolvidas na Lava Jato, sendo que a Odebrecht ficou com 82% do total. Os países que mais receberam investimentos foram Angola (R$ 14 bilhões), Venezuela (R$ 11 bilhões), Argentina (R$ 8 bilhões), República Dominicana (R$ 8 bilhões) e Cuba (R$ 3 bilhões).

O governos do ex-presidente Lula e da presidente afastada Dilma Rousseff sempre defenderam que os empréstimos eram para contratar serviços brasileiros (como a realização de um projeto de engenharia ou estudo) e produtos que eram comprados aqui para serem exportados para as obras lá fora. Assim, o dinheiro seria para desenvolver a economia nacional, segundo o discurso oficial.

ANÁLISE

O TCU apontou que o BNDES nunca auditou se os valores emprestados de fato eram gastos aqui, recebendo apenas informações das próprias empresas sobre o andamento das obras sem qualquer comprovação de que as contratações ocorriam no Brasil.

A análise dos 140 projetos, que envolve obras em rodovias, portos, aeroportos, hidrelétricas, gasodutos, ferrovias entre outros, mostra que na média o BNDES financiava 68% de toda a obra. Dos 68%, 19% era para contratar serviços e 49% para comprar máquinas e equipamentos brasileiros para levar para as obras lá fora.

Os técnicos apontam que a análise dos empreendimentos mostra pouca diferença entre o percentual financiado pelo BNDES, mesmo para obras de características tão diferentes como rodovias e gasodutos.

A análise foi ampliada para observar cada grupo de obras separadamente e, novamente, os números têm pouca relação com a realidade. No caso das rodovias, por exemplo, os números do TCU para obras no Brasil aponta que cerca de 80% dos gastos não teriam como ser feitos fora do país já que são para contratar bens como asfalto e terraplanagem e pagar trabalhadores, por exemplo.

"Essas médias, obtidas em obras realizadas no Brasil, aparentam ser incompatíveis com a exportação de 68% do valor médio de obras de implantação de rodovias", afirma o ministro Augusto Sherman em sua decisão.

Os ministros também decidiram que caso o BNDES volte a fazer tais financiamentos que seja exigido que o banco apure se de fato há benefícios para a economia brasileira e quais seriam eles.


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