Folha de S. Paulo


Conservadores acusam Facebook de parcialidade política

BBC
Facebook é acusado por conservadores de parcialidade política
Facebook é acusado por conservadores de parcialidade política

O Facebook teve de correr na segunda-feira (9) para responder a uma nova e surpreendente linha de ataque: foi acusado de parcialidade política.

Os protestos surgiram depois de uma reportagem postada na manhã de segunda-feira pelo site Gizmodo, segundo a qual a equipe do Facebook que cuida da lista de "trending topics" [os assuntos em alta] havia deliberadamente suprimido artigos de fontes noticiosas conservadoras. A rede social usa a lista de assuntos quentes para indicar os artigos noticiosos mais populares do dia aos seus usuários.

O Facebook negou a acusação depois da erupção de críticas adversas, vindas de críticos tanto conservadores quanto progressistas. "É mais que perturbador descobrir que esse poder está sendo usado para silenciar pontos de vista e histórias que não se enquadram à agenda de alguém", afirmou o Comitê Nacional Republicano em comunicado.

O site The Drudge Report, muito lido, saiu com a manchete "not leaning in... leaning left" [uma referência a "Lean In" (fazendo acontecer), best seller de Sheryl Sandberg, vice-presidente do Facebook, e à suposta inclinação esquerdista (left) da lista].

O jornalista Glenn Greenwald, que dificilmente poderia ser descrito como simpático aos conservadores, comentou, no Twitter: "Além de alimentar a mania de perseguição da direita, esse é um lembrete importante sobre o controle do conteúdo pelo Vale do Silício". E Alexander Marlow, editor em chefe do Breitbart News, uma publicação noticiosa online de tendência direitista, disse que a reportagem confirmava "aquilo de que os conservadores suspeitavam há muito tempo".

O Facebook, em resposta, afirmou que segue diretrizes rigorosas para "garantir a coerência e neutralidade" e que trabalha para incluir todas as perspectivas. "Encaramos acusações de parcialidade com muita seriedade", afirmou uma porta-voz do Facebook em comunicado. "O Facebook é uma plataforma para pessoas e perspectivas de todo o espectro político".

A discussão destaca em que medida o Facebook ganhou espaço no diálogo político dos Estados Unidos, e os riscos que a companhia enfrenta ao se tornar uma força central no consumo e produção de notícias.

Com mais de 222 milhões de usuários ativos ao mês nos Estados Unidos e Canadá, o site se tornou o lugar a que as pessoas acorrem para descobrir o que está acontecendo.

No ano passado, um estudo do Pew Research Center, em colaboração com a Knight Foundation, constatou que 63% dos usuários do Facebook consideram o serviço como fonte de notícias.

Em abril, o Facebook passou a desempenhar esse papel abertamente, lançando um vídeo que pedia às pessoas que usassem o site para descobrir "o outro lado da história". Políticos usam a rede social com cada vez mais frequência para transmitir suas mensagens.

"Não é que o Facebook tenha mudado de maneira fundamental nos últimos quatro ou oito anos", disse Paul Brewer, diretor do Centro de Comunicação Política da Universidade do Delaware. "Mas volume de comunicação que acontece é imenso, e os políticos sabem que agora mais que nunca precisam usar o Facebook para se comunicar".

DIVERSIDADE

À medida que ganha influência, o Facebook vem se esforçando por dizer que não é uma câmera de eco que repete opiniões semelhantes. Em um estudo científico publicado no ano passado, os cientistas de dados do Facebook analisaram de que modo 10,1 milhões de norte-americanos usuários da rede social, a maioria dos quais simpatizantes declarados de algum partido político, navegaram pelo site durante seis meses.

Os pesquisadores constataram que as redes de amigos das pessoas e os artigos que elas liam eram influenciados por suas preferências ideológicas, mas que o efeito era mais limitado do que os cenários alarmistas previstos por alguns teóricos, de acordo com os quais as pessoas veriam praticamente nenhuma informação do outro lado.

Mas a reportagem do Gizmodo despertou dúvidas sobre os efeitos que os funcionários do Facebook e suas preferências, ainda que inconscientes, poderiam ter sobre a rede social.

Embora o Facebook tenha prometido patrocinar as convenções presidenciais do Partido Republicano e do Partido Democrata, seus principais executivos não hesitam em expressar suas simpatias políticas.

Em uma conferência do Facebook em abril, Mark Zuckerberg, o presidente-executivo da empresa, alertou sobre "vozes do medo erguendo muralhas", em referência a Donald Trump, o virtual candidato republicano à presidência.

As acusações contra o Facebook também colocaram em questão como o serviço escolhe que artigos noticiosos mostrar aos usuários na lista dos assuntos quentes - no caso dos computadores, como uma lista na parte direita da tela; no dos celulares, como uma lista exibida quando os usuários fazem buscas.

O Facebook há muito descreve sua lista de assuntos quentes como em geral automatizada. "Os assuntos que fazem parte dela se baseiam em alguns fatores, entre os quais engajamento, atualidade, as páginas de que um usuário gostou, e sua localização", de acordo com uma descrição que consta do site do Facebook.

A lista de assuntos quentes é supervisionada por uma equipe de funcionários, de acordo com dois antigos empregados do Facebook que trabalharam com isso e falaram sob a condição de que seus nomes não fossem mencionados, já que assinaram acordos de confidencialidade com a empresa. Eles disseram que se viam como membros de uma redação noticiosa, onde o poder de seleção editorial não é novidade, mas parte integrante do processo.

Qualquer "supressão", disseram os antigos funcionários, se baseava na percepção de credibilidade; artigos que os curadores considerassem como não confiáveis ou desprovidos de fontes eram evitados, ainda que essa decisão se baseasse em julgamento pessoal.

A percepção do Facebook como uma operação noticiosa mais convencional o abre a uma linha mais familiar de crítica, que vem crescendo contra organizações noticiosas pequenas e grandes, de direita e de esquerda, já há décadas. De acordo com uma pesquisa do Pew no ano passado, apenas 17% das pessoas entrevistadas acreditavam que as empresas de tecnologia tivessem influência negativa sobre o país. No que tange à mídia, o número era de 65% e estava em alta.

"O poder de ditar agendas que um punhado de empresas como o Facebook e o Twitter exercem não deveria ser subestimado", disse Jonathan Zitrain, professor de Direito e ciência da computação na Universidade Harvard. "Esses serviços terão seu melhor momento quando assumirem o compromisso explícito de servir aos interesses de seus usuários, em lugar de simplesmente oferecerem um serviço cujas fronteiras de influência são desconhecidas e sempre mutáveis".

Na noite de segunda-feira, os usuários da rede social que estivessem em busca de mais informações sobre a reportagem do Gizmodo não precisavam ir longe: ela constava da lista de assuntos quentes do Facebook.

Tradução de PAULO MIGLIACCI


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