Folha de S. Paulo


Beyoncé pode não ser suficiente para levantar o serviço de streaming Tidal

Daniela Vesco/Associated Press
Beyoncé não deve conseguir impulsionar serviço de streaming Tidal
Beyoncé não deve conseguir impulsionar serviço de streaming Tidal

Na semana transcorrida desde o lançamento de "Lemonade", de Beyoncé, feito de surpresa, o álbum se tornou o mais vendido do ano, causou tempestade nas mídias sociais com o conteúdo político de suas canções e cimentou a reputação da cantora como uma das maiores estrelas da indústria da música.

O lançamento simultâneo do álbum e de um filme na HBO lhe valeu aplausos por ter reanimado o enfraquecido formato álbum, que está em declínio há anos.

O marido de Beyoncé, o rapper Jay Z (nome real: Shawn Carter) quer ter impacto semelhante sobre a música digital com o Tidal, o serviço de streaming de música do qual ele é dono. Mas a despeito de conquistar manchetes com o lançamento de "Lemonade" —o álbum estava disponível apenas via Tidal nas primeiras 24 horas— e de ser o único serviço de streaming a oferecer o catálogo completo de Prince, morto recentemente, a companhia continua muito atrás do Spotify e Apple Music.

O crescimento da Tidal se estagnou pela maior parte do ano passado, mas atingiu os três milhões de assinantes pagantes em março de 2016. Isso se compara a quase 30 milhões de assinantes pagos para o Spotify e 13 milhões para a Apple Music. A companhia passou por três presidentes-executivos em nove meses, e uma pesquisa da revista "Billboard" demonstrou que mais de dois terços dos executivos da indústria da música antecipavam que o serviço faliria em menos de um ano.

Enquanto isso, o Sportify, grupo sueco que lidera o mercado de streaming, gerou quase € 1,1 bilhão em receita no ano passado, mas ainda não saiu do vermelho, o que torna a viabilidade do Tidal em longo prazo "um ponto discutível", de acordo com Larry Miller, professor de negócios especializado em música na Universidade de Nova York.

O Tidal teve um começo lento a despeito de um lançamento vistoso no ano passado, quando artistas como Madonna e Coldplay subiram ao palco com Carter para desvelar o novo serviço. A empresa nasceu na Suécia, mas foi adquirida pelo músico e produtor quando ele pagou US$ 56 milhões pelo Aspiro, o grupo sueco que controla o Wimp, um serviço de música popular nas regiões nórdicas.

O Tidal tinha 770 mil assinantes antes de seu lançamento, disse Carter, e nos primeiros seis meses cresceu lentamente, atingindo a marca do milhão em outubro.

O serviço se definia como uma alternativa mais simpática aos artistas do que o Spotify ou Apple Music, e cobra US$ 9,99 ao mês de seus usuários. A empresa "elevou artificialmente" seu número de assinantes por meio de conteúdo "exclusivo" dos artistas que são seus donos, diz Mark Mulligan, analista do setor de música na MIDIA Research.

Rihanna e Kanye West lançaram seus novos álbuns em formato stream com exclusividade inicial no Tidal, em janeiro e fevereiro.

A "janela", ou duração, da exclusividade é um fator chave a considerar para o sucesso da estratégia, diz David Bakula, do serviço de pesquisa de mídia Nielsen.

"Lemonade" teve a janela de exclusividade mais curta para o Tidal, estando disponível apenas no serviço por 24 horas antes de ser lançado via plataformas como a loja iTunes, da Apple.

O álbum "Anti", de Rihanna, ficou disponível exclusivamente no Tidal por uma semana, enquanto "Life of Pablo", de Kanye West, ficou fora de plataformas rivais por seis semanas.

West disse inicialmente que o álbum "Life of Pablo" "nunca, nunca seria vendido na Apple", mas aparentemente mudou de ideia e o disco saiu na Apple Music e Spotify em abril. O Tidal e West agora são alvo de processos judiciais da parte de um fã insatisfeito, por "induzirem os consumidores fraudulentamente a assinar o Tidal", e afirmando que os novos usuários adquiridos como resultado disso elevaram o valor da empresa por entre US$ 60 milhões e US$ 84 milhões.

A Apple também começou a lançar álbuns exclusivos. Na sexta-feira, o álbum mais recente de Drake —com projeção de vendas de um milhão de cópias— foi lançado no site de streaming da Apple com exclusividade por uma semana. Mas nem todo mundo acredita no poder dos lançamentos exclusivos; um porta-voz do Spotify disse na semana passada que "os exclusivos de longo prazo são ruins para os artistas e ruins para os fãs".

Com um elenco de estrelas como Alicia Keys, uma das sócias de Carter no Tidal, a empresa tem bom potencial em termos de conteúdo exclusivo.

No entanto, Russ Crupnick, sócio gerente da MusicWatch, uma companhia de pesquisa de mercado, diz que os astros que são sócios do Tidal deveriam fazer mais para promover o serviço. "Em lugar de falar de faixas ou vídeos exclusivos, eu adoraria vê-los... falar sobre os motivos para que as pessoas devam pagar por assinaturas de música", ele diz.

O streaming de música cresceu rapidamente, ultrapassando os downloads digitais como maior fonte de receita do setor de música norte-americano, com alta de 52% nos serviços de assinatura pagos em 2015, para US$ 1,2 bilhão, enquanto o número de assinantes pagantes crescia em 40% no mesmo período, para 10,8 milhões.

Mas os serviços de streaming estão sobrecarregados com os altos custos de royalties pagos às gravadoras. Isso propicia vantagem a empresas de tecnologia dotadas de boas reservas de caixa, como a Apple, porque podem subsidiar suas operações de streaming a fim de atingir outras metas, como promover as vendas de iPhones.

Em longo prazo, o Tidal enfrenta desafios sérios, o que torna a venda da companhia a um dos rivais maiores "uma opção provável", diz Mulligan.

O modelo dito "exclusivo" pode funcionar para melhorar os indicadores de curto prazo, mas provavelmente não servirá como estratégia de longo prazo, na opinião de Miller.

Com a proliferação de sites de streaming, há o problema da sobreposição e de se os ouvintes estarão dispostos a assinar novos serviços a cada vez que surge um novo álbum, ele diz. "Os consumidores não suportarão essa situação para sempre", ele diz.

Tradução de PAULO MIGLIACCI


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