Folha de S. Paulo


Licitação de PPP da luz em São Paulo deve enfrentar conflitos na Justiça

Avener Prado - 1º.dez.2015/Folhapress
Av. 23 de Maio, em São Paulo, iluminada pelas antigas lâmpadas de vapor de sódio
Av. 23 de Maio, em São Paulo, iluminada pelas antigas lâmpadas de vapor de sódio

A PPP (parceria público-privada) para modernizar toda a iluminação pública de São Paulo, contrato que abrange R$ 7,2 bilhões e já teve idas e vindas com suspensões e questionamentos na Justiça, deve ter novos capítulos de imbróglio nas próximas semanas.

Seja qual for o vencedor da disputa deve haver questionamentos na Justiça por parte de outros concorrentes.

Os próximos passos da concorrência envolvem a abertura da proposta comercial e a análise dos documentos de habilitação do grupo que apresentar a melhor oferta.

Mas antes disso, nos próximos dias, a expectativa dos participantes é que a prefeitura conceda mais alguns dias para uma nova apresentação de documentação de garantias de todos os concorrentes.

Essa decisão manteria no páreo o consórcio Ecobraslux, cuja garantia proposta inicialmente não havia sido aceita pela comissão por estar em desacordo com o edital. Tal possibilidade desagrada os outros dois consórcios concorrentes.

Outros questionamentos ligados ao perfil das empresas também devem contribuir para a judicialização do processo, conforme a Folha apurou.

Um dos consórcios, o FM Rodrigues/CLD, formado pela empresa FM Rodrigues, que já presta o serviço no contrato vigente hoje em dia, comporta também a empresa Consladel, que no ano passado foi condenada no Cade por prática de cartel em licitação para contratação de serviços de sinalização e fiscalização de trânsito no município de Jaú, em São Paulo.

Segundo o Cade, a Consladel participou de um conluio que praticou ajuste de preços para fraudar a competitividade de licitação em 2010.

Ainda conforme o Cade, houve, na ocasião, "grande semelhança entre as cotações de preços e as propostas comerciais apresentadas pelas empresas, inclusive com a repetição dos mesmos erros ortográficos e de digitação". Outro elemento que o Cade afirma ter encontrado foi a "relação de parentesco entre representantes das empresas envolvidas".

Procurada, a Consladel diz ter considerado a condenação "equivocada". A empresa já havia se envolvido em outras denúncias de lavagem de dinheiro em São Paulo, fraude em licitação em Manaus e de outras irregularidades.

No consórcio Walks, uma das participantes, a Quaatro, é a dona da Alumini, empresa investigada na Lava Jato que está em recuperação judicial. Ao lado da FM Rodrigues, a Alumini também é prestadora do serviço de luz que hoje funciona na cidade. Mas nesta nova concorrência elas decidiram não entrar como uma dupla, e sim em lados opostos.

Procurado, o consórcio afirma que "quem participa do consórcio Walks é a Quaatro Participações - que é acionista da Alumini Engenharia e de outras empresas."

O terceiro grupo que se candidatou à licitação é o consórcio Ecobraslux. Após a análise dos envelopes de garantia de proposta, o consórcio teve um dos pontos recusado pela comissão de licitação, por estar com documentação em desacordo com o edital. A empresa recorreu, apresentou reclamações sobre os outros dois concorrentes e agora aguarda uma decisão favorável da prefeitura para que possar apresentar novas garantias.

Do Ecobraslux fazem parte empresas sem tradição no setor no Brasil, como a chinesa Yaming e a Agroenergia do Norte. Também no Ecobraslux há uma empresa chamada Santa Edwigis, que foi constituída há menos de um ano, com capital de apenas R$ 150.

HISTÓRICO

Quando foi lançado, há mais de um ano, o negócio de R$ 7,2 bilhões para renovar a iluminação da cidade chegou a atrair grandes multinacionais do setor, como Philips e GE.

No decorrer do processo, no entanto, a prefeitura promoveu alterações no edital ligadas às garantias. As mudanças, na avaliação das empresas interessadas, elevaram muito o risco do projeto, levando-as a desistir de se candidatarem.

Conforme a Folha antecipou, a GE acabou voltando posteriormente, mas como fornecedora, posição que mitiga a tomada de riscos.

Para o advogado Henrique Frizzo, sócio do escritório Trench, Rossi e Watanabe, a fragilidade dos editais, não só na esfera municipal, tem repelido grandes empresas e comprometido a concorrência.

"Quanto mais inseguro do ponto de vista jurídico e financeiro for o projeto do governo, menor vai ser o apetite de empresas sérias. A administração pública como um todo tem feito projetos frágeis", diz Frizzo.

CONCORRÊNCIA

As empresas se dizem aptas a cumprir o contrato de 20 anos.

A respeito de sua condenação do Cade, a Consladel diz ter considerado a decisão do órgão "equivocada" e afirma que entrou na Justiça com pedido de anulação.

"O Cade não impediu a empresa de participar de qualquer licitação, de modo que a Consladel tem o direito de participar de qualquer certame licitatório", disse Pedro Moreira, advogado da empresa.

Já o outro consórcio, o Walks, do qual faz parte a Quaatro, dona da Alumini -empresa em recuperação judicial investigada na Lava Jato- dissocia sua imagem da controlada.

Por meio de sua assessoria de imprensa, o Walks afirma que "quem participa do consórcio Walks é a Quaatro Participações - que é acionista da Alumini Engenharia e de outras empresas."

A nota da empresa adiciona que "a Quaatro não está em recuperação judicial, apenas a Alumini. Ainda assim, é importante destacar que a lei permite que empresas em recuperação judicial participem de licitações e concorrências públicas, conforme já foi definido em diversas decisões judiciais."

Por fim, o consócio Ecobraslux afirma que a Santa Edwigis (empresa que faz parte do Ecobraslux, constituída há menos de um ano com capital de R$ 150) terá o papel de abrigar outro prestador de serviço futuramente, que poderia vir a entrar no consócio em caso de vitória.

O consórcio diz que ainda não pode divulgar o nome desse futuro parceiro.

Rodrigo Pirajá, presidente da São Paulo Negócios (empresa municipal que atua na estruturação do projeto da PPP), defende que não há impedimento jurídico para que as empresas participem da disputa.

Fernando Villela Vianna, sócio do Siqueira Castro Advogados, afirma que, geralmente, quem entra na Justiça para contestar resultados de licitação são outras empresas que se sentiram preteridas, mas que Ministério Público ou pessoas físicas também podem questionar.


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