Folha de S. Paulo


Imóveis vão capitalizar infraestrutura, diz secretário da Fazenda

Renato Costa/Folhapress
O secretário-executivo da Fazenda Dyogo Oliveira
O secretário-executivo da Fazenda Dyogo Oliveira

Em busca de reduzir riscos de projetos e destravar investimentos no país, o governo vai usar imóveis da União para capitalizar em R$ 500 milhões o Fundo Garantidor de Infraestrutura, o que deve bancar R$ 5 bilhões em financiamentos de concessões.

O secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Dyogo Oliveira, disse à Folha que a ideia é "capitalizar o fundo usando imóveis da União sem uso" e oferecer esses recursos como garantia "para riscos que o mercado não pode cobrir". O fundo foi criado pelo governo em 2012 para cobrir os riscos dos projetos do plano de concessões, mas até agora não tinha recebido recursos para operar.

"São riscos políticos, questões que a empresa não administra, custos extraordinários", disse Dyogo sobre o foco da medida, que, segundo ele, deve facilitar o acesso a crédito a empresas do setor de infraestrutura.

Ele afirmou também que o objetivo do governo com a proposta de teto para os gastos públicos é estabilizá-los num período de três a quatro anos, lembrando que eles cresceram nos últimos anos, atingindo 19,1% do PIB. A Fazenda estima que a renegociação da dívidas dos Estados vá ter um impacto próximo de R$ 6 bilhões neste ano.

Oliveira defendeu ainda a reforma da Previdência, sob o argumento de que seus efeitos no setor vão acontecer só no longo prazo, mas no presente irá melhorar as "expectativas" e contribuir para retomar o crescimento.

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Folha - As medidas da reforma fiscal não podem ser adotadas já neste ano?

Dyogo Oliveira - O sistema fiscal no Brasil é baseado na Lei de Responsabilidade Fiscal, que exige atenção à meta fiscal, mas não traz instrumentos que auxiliem a cumprir o resultado. Estamos propondo que se estabeleça plurianualmente um teto para o gasto, o que não existe na LRF. Mas o mais importante é que a lei traga os instrumentos, pois você fica sempre na dependência de decisões, que também não estão sob controle.

O governo poderia propor as medidas eventualmente, mas o Congresso Nacional pode também não aceitar. Ter o instrumento de gestão predeterminado é um elemento que facilita a gestão fiscal.

A situação hoje é que temos um Orçamento que está muito engessado, mais de 90%, com despesas obrigatórias ou não contingenciáveis, e o único instrumento de gestão fiscal é contingenciar, e cada vez temos menos espaço para isso. Neste ano, a margem contingenciável é de R$ 120 bilhões, e fizemos um contingenciamento de R$ 23,4 bilhões.

A margem proposta de um deficit neste ano, de até 0,97% do PIB, não considera o custo com a renegociação da dívida dos Estados.

O ministro [da Fazenda, Nelson Barbosa] apresentou a expectativa do impacto cheio dessa renegociação: R$ 12 bilhões neste ano. Mas será muito menor do que isso. Algo próximo da metade.

Qual será o percentual do teto de limite de gasto que será proposto na reforma fiscal?

Estamos fazendo simulações para projetar como irão se comportar as despesas obrigatórias nos próximos anos. O cenário que devemos perseguir é o de uma trajetória de estabilização no período de três a quatro anos.

Indicadores mostram que a recessão está se aprofundando. Como reverter o quadro?

Anunciamos há algumas semanas uma série de ações de melhor gestão do crédito direcionado, que libera cerca de R$ 83 bilhões. Precisamos focar essa área do financiamento do investimento, principalmente na mitigação dos riscos dos projetos.

Há uma parte de risco chamada de riscos não gerenciáveis, que não têm cobertura de mercado. São os riscos políticos, questões que a empresa não administra, custos extraordinários. Criamos lá atrás o Fundo Garantidor de Infraestrutura, que tinha essa finalidade. Estamos estudando mecanismos, sem custo fiscal, para capitalizar o fundo eventualmente usando imóveis que a União tem e estão sem uso.

Podemos capitalizar o fundo e ele oferecer essa garantia para os riscos que o mercado não pode cobrir. Seria viável capitalizar o fundo com esses imóveis. Talvez ele precise de uns R$ 500 milhões da União.

O governo vende ou coloca os imóveis na carteira, e o fundo vende depois ou pode usá-los como garantia para cobrir os riscos não gerenciáveis. Isso facilita o financiamento e pode alavancar R$ 5 bilhões em investimentos. Aí conseguimos criar uma nova maneira de fomentar a emissão de debêntures. Uma das dificuldades para alavancar o mercado de debêntures é que não há garantia, o comprador não tem garantia.

Os empresários reclamam de que o mercado não está favorável para a emissão de debêntures. Querem que o BNDES aumente sua parcela no financiamento das concessões.

Estamos estudando como lidar com isso. As soluções passam principalmente por essa questão da mitigação de risco, é um elemento que facilita a emissão de debêntures e o próprio financiamento.

Há críticas sobre a regra dos precatórios, seria uma nova "pedalada".

A proposta não altera nenhum direito de nenhum beneficiário de precatório. Hoje, passamos o dinheiro para os bancos pagarem os precatórios, mas existe um contingente de pessoas que não busca esses recursos. Tem motivos variados: massa falida, inventário, litígio entre pretensos beneficiários.

Como o precatório é remunerado, a pessoa vai pegar aquilo para colocar numa aplicação, dá o mesmo efeito deixar no banco.

Esse dinheiro estava lá parado, R$ 18,5 bilhões, gerando ganho para os bancos. Isso não faz sentido na situação em que estamos. Vamos colocar os recursos num fundo, fica lá, disponível, mas só conta que foi pago na hora em que for efetivamente pago.

Qual é o foco na reforma da Previdência? É a convergência dos sistemas, algo para dez anos?

O objetivo é que todos os brasileiros possam se aposentar e ter a certeza de que vão ter o pagamento da Previdência sem colocar a gestão do Estado brasileiro em dificuldade. Queremos garantir a sustentabilidade da Previdência. Do ponto de vista objetivo, o que temos hoje é uma Previdência que tem tido constantemente um crescimento da despesa em relação ao PIB. A projeção do Ministério da Previdência é que essa despesa possa chegar a 16% do PIB em 2060 se nada for feito. Hoje vai dar cerca de 7%, 7,5% do PIB.

Qual seria a idade média de aposentadoria para garantir a sustentabilidade do sistema?

Não estamos nos pautando por isso. A reforma envolverá um conjunto de medidas que resultarão numa trajetória estável. Você não irá fazer isso apenas aumentando a idade.

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RAIO-X DYOGO OLIVEIRA

Formação

economista

Função

secretário-executivo do Ministério da Fazenda

Carreira

- Supervisor de programas do Ministério do Desenvolvimento Indústria e Comércio (2000 a 2005)

- Secretário-adjunto de Política Econômica do Ministério da Fazenda (2008 a 2011)

- Secretário-executivo-adjunto da Fazenda (2011 a 2015)

- Secretário-executivo do Ministério do Planejamento (janeiro a dezembro de 2015


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