Folha de S. Paulo


Empresários criam aplicativos para ajudar crianças a fazer lição de casa

Se não há como competir com o interesse das crianças pela tecnologia por que não associá-la aos estudos?

Pensando nessa estratégia, pequenos empreendedores criaram ferramentas on-line para auxiliar e estimular os jovens estudantes a fazerem a lição de casa, além de manter os pais conectados com a escola e o desenvolvimento dos seus filhos.

O aplicativo MonsterJoy, criado no ano passado em São Paulo, uniu a tradicional agenda escolar a um jogo interativo. Enquanto os pais veem os recados dos professores, as crianças ganham pontos por cada lição feita.

Danilo Verpa/Folhapres
Rafael Ribeiro, criador do app MonsterJoy, na sede da empresa, em São Paulo
Rafael Ribeiro, criador do app MonsterJoy, na sede da empresa, em São Paulo

"A criança faz a tarefa em casa e avisa o professor pelo smartphone. No outro dia, o professor vê se o dever foi mesmo feito, valida pelo smartphone e concede estrelinhas ao aluno", explica Rafael Ribeiro, seu fundador.

Quanto mais estrelas, mais acessórios as crianças podem adquirir para construir seus monstros virtuais -o "monster" do termo em inglês que dá nome ao aplicativo.

Há uma versão para crianças menores com dados sobre o dia a dia na escola: se ela se alimentou ou dormiu, por exemplo.

E outra para os alunos a partir dos 10 anos, em que o aplicativo substitui a agenda na comunicação com os pais.

Melyna Figlioli, 27, diretora do Liceu Congonhas, na zonal sul de São Paulo, foi a primeira cliente do app. Desde agosto do ano passado, todos os pais e os cerca de 130 alunos da escola, do berçário à 9ª série, tem um perfil no MonsterJoy.

"Minha ideia é, aos poucos, eliminar toda comunicação em papel da escola com os pais, tais como avisos de reuniões e passeios, por exemplo", diz ela.

"A aceitação tem sido alta", completa a diretora.

Segundo Ribeiro, as ferramentas do MonsterJoy são usadas por mais de 40 escolas, que pagam entre R$ 5 e R$ 10 por aluno conectado.

Também de olho em modernizar a comunicação entre escolas e pais, um grupo cearense criou o AgendaKids.

O aplicativo está em 167 escolas em 16 Estados, incluindo São Paulo. Conta com apoio da StartEd Lab, que investe em projetos educacionais e faz parte da Fundação Lemann, do bilionário brasileiro Jorge Paulo Lemann.

Segundo Anderson Braga, um dos sócios da empresa, a companhia já tem R$ 700 mil em vendas garantidas e deve fechar 2016 com R$ 1,2 milhão de faturamento.

"O próximo passo é atrelar alguma função lúdica ao aplicativo", conta Braga.

BLOG, LIVRO E TV

Karime Xavier/Folhapress
Taís (esq.) e Roberta Bento, sócias da BrainBento, em escritório da Vila Madalena, em São Paulo
Taís (esq.) e Roberta Bento, sócias da BrainBento, em escritório da Vila Madalena, em São Paulo

Outra iniciativa na área é a BrainBento, criada pela pedagoga Tais Bento, 26, e sua mãe, a professora e executiva Roberta Bento, 50.

A proposta da empresa é fazer um diagnóstico de crianças que não gostam de estudar e dar sugestões a seus pais e professores sobre como reverter o quadro.

"A inspiração veio da família. Sempre pediam para a gente ajudar algum primo ou amigo a estudar e percebemos que o mais importante era achar um modo de se comunicar com o aluno de uma maneira que o atraísse", diz Roberta.

O primeiro passo foi um blog. Tais visitava as crianças e pais com dificuldade e voltava para casa com o problema identificado. Para traçar o plano de ação, conversava com a mãe, à época vice-presidente de uma empresa do ramo de educação.

A sugestão para os pais se tornava um texto com dicas, publicado na internet.

A segunda etapa foi compilar os casos no livro "Socorro, meu filho não estuda" (editora BrainBento, 104 págs. R$ 40), lançado em julho do ano passado.

Com a boa repercussão, Roberta decidiu pedir demissão e se juntar a filha na companhia.

Elas criaram um canal de dicas para os pais no YouTube com o mesmo nome do livro e, desde o fim do ano passado, têm também um perfil no Snapchat, onde dão conselhos de estudo diretamente aos alunos.

O próximo passo da BrainBento é chegar na TV. "Será um reality show mostrando o processo de diagnóstico e a proposta de plano de ação para ajudar pais e filhos com os estudos das crianças", conta a pedagoga.

O piloto será gravado pela Europa Filmes no fim de fevereiro, para ser posteriormente comercializado com algum canal de televisão.

TEMPO LIMITADO

Quem desenvolve aplicativos educacionais deve desenhar estratégias, como um contador de tempo de acesso, para evitar que as crianças passem tempo demais diante da tela, diz Christian Muller, neuropediatra e membro da Sociedade Brasileira de Pediatria.

"As crianças não devem gastar mais de duas horas por dia com equipamentos tecnológicos, e o tempo usado com os aplicativos, mesmo que tenham propósitos educacionais, entra nessa conta", afirma Muller.

Outro ponto importante, segundo o neuropediatra, é encontrar equilíbrio entre as tarefas tradicionais do currículo escolar e os jogos associados aos aplicativos.

As plataformas também devem evitar criar competição entre os alunos, diz Muller, para que não gere estresse na sala de aula ou acabe desmotivando os que não se saem tão bem.

Para evitar problemas desse tipo, a MonsterJoy consultou psicólogos para desenvolver a plataforma. "Nosso produto não concede premiação a quem faz um bom trabalho ou tira uma nota maior, mas sim a quem cumpre as obrigações necessárias", explica Rafael Ribeiro, seu fundador.

"Todo mundo tem de fazer a lição de casa e é esse cumprimento que concede estrelas aos alunos."

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ATRAÇÃO

Para chamar e reter a atenção das crianças, os aplicativos e vídeos precisam equilibrar diversão e funcionalidade. Para as crianças mais novas, detalhes como sons e cores são importantes

SIMPLICIDADE

Os recursos e funções do aplicativo precisam ser fáceis de compreender, seja para os produtos voltados para as crianças, seja para aqueles destinados para os pais

FUNDAMENTO

Uma ideia de ouro para um aplicativo educacional será apenas mais um joguinho de computador se não tiver embasamento pedagógico. Consulte um profissional da área na hora de construir o produto

LIMITE

Os aplicativos voltados para as crianças devem conter recursos para que os pais possam controlar o tempo de acesso e evitar que os pequenos passem muitas horas conectados


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