Folha de S. Paulo


No Canadá, cinco couves-flores custam mais do que um barril de petróleo

Cozida no vapor, salteada ou refogada, a couve-flor é um alimento costumeiro em muitas mesas de jantar. No Canadá, é um luxo.

Ali, um maço de couve-flor está saindo por cerca de 8 dólares canadenses (US$ 5,70): um preço triplicado que é a esquisita sequela gastronômica da baixa do preço do petróleo e de outras commodities.

A receita da couve-flor encarecida começa com a moeda. À medida que os preços das commodities vêm baixando, o valor do dólar canadense vem caindo: uma associação direta para uma economia que é dependente do petróleo e de outros recursos naturais. Isso faz com que os produtos importados -como as hortaliças frescas norte-americanas durante o terrível inverno canadense - pareçam especialmente caros.

Há dois anos, um dólar canadense valia US$ 0,93 Nesta quarta (27), estava em US$ 0,71.

A seca na Califórnia, onde os canadenses obtêm a maior parte das suas hortaliças na entressafra, só faz exacerbar o susto com os preços. Com menor fartura nos campos, os preços praticados pelos agricultores, em dólares norte-americanos, estão acima dos patamares normais.

Em consequência, as hortaliças frescas mais se afiguram como uma ostentação para os consumidores canadenses. A alface americana é vendida por 3 dólares canadenses (US$ 2,14), acima dos típicos 90 centavos canadenses (US$ 0,64).

Um maço de brócolis sai por 4 dólares (US$ 2,85), em comparação com 1,50 dólar (US$ 1,07) por dois maços no passado. No último inverno, um maço de couve-flor era vendido por 2,50 dólares canadenses (US$ 1,78).

Em parte, o dólar canadense reflete o transtorno na economia do país. Por vários anos o Canadá se valeu do boom global das commodities.

O crescimento acelerado da economia chinesa -e seu aparentemente insaciável apetite por commodities- contribuiu para aumentar o preço do petróleo, da potassa, do níquel e dos outros recursos naturais canadenses.

Com a retração da demanda da China, os preços das commodities vêm recuando. O excesso de oferta de petróleo vem devastando seu preço de modo similar. Ambos os fatores estão prejudicando a economia canadense. O PIB do país cresceu apenas 0,6% no terceiro trimestre de 2015, após seis meses de crescimento negativo.

Desde outubro, a queda do dólar canadense, que já se mostra abalado em contraste com uma moeda norte-americana em rápido aumento, vem se intensificando. Em vários aspectos, uma moeda mais fraca é vantajosa para a economia.

Os Estados Unidos são de longe o maior mercado para as exportações canadenses, que ora estão menos caras no outro lado da fronteira por causa da queda da moeda. E quase todas as exportações de commodities têm seus preços fixados em dólares norte-americanos.

Assim, os ganhos cambiais têm ajudado a amortecer alguns dos golpes sofridos pelas companhias petrolíferas e mineradoras canadenses, que em grande parte vendem seus produtos em outros países.

A indústria turística e outros setores de serviços do Canadá, que vinham passando por maus bocados, já estão obtendo ganhos com a baixa da moeda.

Ao se pronunciar no Fórum Econômico Mundial de Davos, Suíça, na semana passada, o primeiro ministro Justin Trudeau enfatizou os pontos fortes do Canadá em tecnologia e educação em vez do claudicante setor de recursos naturais do país.

"Nossos recursos naturais são importantes e sempre o serão", afirmou Trudeau. "Porém, os canadenses sabem que crescimento e prosperidade não se baseiam somente naquilo que se encontra sob os nossos pés, mas particularmente naquilo que temos entre as nossas orelhas."

Entretanto, aquilo que é bom para a economia em geral em longo prazo não necessariamente é bom para as carteiras dos consumidores em curto prazo. Os custos aos consumidores vão aos poucos aumentando em diversos segmentos.

Tradução de ALEXANDRE MORALES


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