Folha de S. Paulo


Tréplica

O debate da dívida e a dívida do debate

Ao longo de nosso debate acerca da relevância dos juros na relação dívida/PIB, os comentários de leitores denunciaram que a delinquência de alguns argumentos jogou névoa na interpretação dos cálculos apresentados.

O debate só justifica sua publicidade na medida em que proporciona informações ao público, preferencialmente sobre o tema, e não sobre os debatedores. Abandonemos a discussão na tentativa de amortizar a dívida com leitores.

A relação dívida/PIB e sua evolução representam um relevante indicador de solvência do país e do ônus imposto à sociedade, durante várias gerações, para honrar as obrigações de dívida contraídas pelo setor público.

O Produto Interno Bruto de um país constitui a soma, em valores monetários, de todos os bens e serviços finais produzidos durante um determinado período. O denominador da razão dívida/PIB é expresso a preços correntes; portanto, seu valor tem relação direta com a inflação e a atividade econômica.

A dívida representa um estoque de obrigações do setor público e apresenta relação direta com as despesas com juros, com perdas em operações do Banco Central no mercado de câmbio e outras despesas que superem as receitas do setor público (deficit primário). Enquanto numerador da relação dívida/PIB, seu valor também é expresso em valores correntes.

A informação de que ambos têm seus valores expressos em preços correntes significa que se encontram na mesma data-base, ou seja, já incorporam os efeitos no período da taxa de juros no estoque da dívida, bem como da inflação no PIB, receitas e despesas do setor público.

INFLAÇÃO E JUROS

É nesse sentido que a inflação afeta negativamente os juros, ao majorar os demais valores corrigidos pela inflação ante seu valor monetário.

Os números divulgados pelo Banco Central, vide nota à imprensa em 29/10/2015, revelam dívida bruta de R$ 3,789 trilhões, 66% do PIB, em setembro de 2015. Nos 12 meses anteriores, essa dívida foi acrescida por um deficit nominal de R$ 536 bilhões, equivalente a 9,34% do PIB, resultado de um deficit primário consolidado de R$ 25,7 bilhões, 0,45% do PIB, e de despesas com juros nominais de R$ 510,6 bilhões, 8,89% do PIB, que incluem perdas com operações no mercado de câmbio no valor de R$ 132 bilhões, 2,3% do PIB.

A evolução da razão dívida/PIB é expressão dos efeitos descritos nas variáveis supracitadas a preços correntes: desconsiderados ajustes, a dívida bruta equivalente a 57% do PIB em setembro de 2014, somada ao deficit nominal de 9% no período de 12 meses, respondem pelos 66% do PIB de dívida bruta de setembro de 2015.

Portanto, nesse período, as despesas com juros nominais foram responsáveis por 95,2% do deficit nominal que aumentou a dívida bruta, enquanto o deficit primário responde por 4,8%.

Nos próximos dias serão apresentados pelo Banco Central os dados posteriores a setembro de 2015, mas os já divulgados pelo Tesouro Nacional em 26/11/2015 não são alvissareiros.

O deficit primário do governo central foi de R$ 12,2 bilhões no mês de outubro de 2015. Esse se difere do deficit primário consolidado, pois o governo central considera Tesouro, Banco Central e Previdência Social, enquanto o consolidado soma os resultados de Estados, municípios e empresas estatais. Em 2014, por exemplo, o deficit primário do governo central foi de R$ 20,5 bilhões, e o consolidado, de R$ 32,5 bilhões.

Na esperança de ter oferecido contribuições republicanas, resta agradecer à Folha e a seus colaboradores pela forma gentil e democrática que nos assegurou a participação no debate.


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