Folha de S. Paulo


Importar ideia de negócio requer cuidado adicional com cultura

Rafael Soares, 31, estava no Havaí quando vislumbrou o negócio que queria abrir quando voltasse ao Brasil. Em 2009, ele inaugurou a primeira loja da rede de frozen iogurte Yoguland, no sul do País. O negócio fechou as portas em 2014.

"Vi que o brasileiro é muito imediatista. Nos Estados Unidos o mercado cresce com estabilidade, mas aqui, negócios com pouca barreira de entrada e alta rentabilidade sempre sofrem um pico muito forte. O negócio se tornou insustentável", diz o empresário.

Ainda assim, ele não desistiu de trazer para o Brasil um negócio de sucesso no exterior. Em 2013 ele abriu, em Curitiba, uma loja piloto da Leeds Popcorn, que queria trazer ao País o conceito de pipoca norte-americano. A marca tinha versões doces e salgadas de pipocas gourmet.

"Ficamos cerca de cinco meses com a loja aberta, mas vi que não ia dar certo. O brasileiro gosta de comer pipoca fresquinha, quentinha. Ele não tem o costume de comprar a pipoca já estourada, como nos Estados Unidos", explica.

Como só havia aberto a loja-teste, o baque não foi tão forte. "É importante que o empreendedor, na hora de validar o produto no mercado brasileiro, faça testes. Ele fez o caminho certo investindo na loja piloto e descobrindo que o produto não era adaptável", afirma o professor Renê Fernandes, da FGV.

Hoje, Soares é proprietário da rede de pizzarias Oven Pizza, de pizzas customizadas pelo consumidor. "Eu percebi que no ramo de alimentação as barreiras da cultura rão muitos difíceis de quebrar. Você consegue inovar, mas tem mais dificuldade de quebrar ou implantar uma cultura diferente. Resolvi, então, melhorar a oferta de um produto que já está na cultura brasileira."

Já o empresário Victor Levy passou sete anos morando nos Estados Unidos e mais de três anos viajando pelo mundo para descobrir no que gostaria de empreender. Ele conta que chegou ao Brasil com uma lista de ideias.

O empreendedor se inspirou nas máquinas norte-americanas que contabilizam moedas para criar, em 2009, a CataMoeda. Para trazer o negócio ao Brasil, no entanto, foram necessárias mudanças na tecnologia das máquinas e até no modelo de negócios.

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Victor Levy ao lado de uma máquina do CataMoeda, em mercado de Florianópolis
Victor Levy ao lado de uma máquina do CataMoeda, em mercado de Florianópolis

"Nos Estados Unidos, as máquinas cobram do consumidor um percentual das moedas depositadas. Se eu fizesse isso aqui, não teríamos o público que temos. No início, o valor era cobrado do varejista que tinha a loja no seu estabelecimento. Além disso, o brasileiro tem menos cuidado com o dinheiro e deposita moedas sujas, com durex, por exemplo. Tivemos que fazer uma máquina mais resistente e que também reconhecesse as diferenças famílias da moeda brasileira", conta Levy.

Hoje, com 84 máquinas funcionando no Brasil, a empresa fechou uma parceria com a Prosegur, que compra as máquinas e é responsável pela implementação das lojas no varejo. Nos próximos 24 meses, 1.400 máquinas devem ser colocadas.

Segundo Fernandes, é esse tipo de coisa que deve ser levada em consideração na hora de implementar um negócio inspirado em exemplos internacionais. "É preciso buscar entender as diferenças culturais, de padrão do consumo. Também não se deve descartar uma análise mais sociológica do consumidor brasileiro para entender a utilidade que ele daria o produto, se ele descartaria isso logo de cara", explica.

O professor afirma que, para isso, pesquisas simples com questionários e a implementação de tester com protótipos e projetos pilotos são boas opções.


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