Folha de S. Paulo


Com China enfraquecida, América Latina vê desaceleração se disseminar

Pedro Ladeira/Folhapress
BRASILIA, DF, BRASIL, 17-07-2015, 10h00: Presidente Dilma Rousseff, ao lado do ministro Mauro Vieira (MRE), recebe os presidentes dos países membros do Mercosul. Presidente da Argentina Cristina Kirchner (foto), do Paraguai Horacio Cartes, do Uruguai Tabare Vazquez, da Venezuela Nicolas Maduro, da Bolivia Evo Morales. No palácio do Itamaraty. (Foto: Pedro Ladeira/Folhapress, PODER)
Presidente Dilma Rousseff recebendo a presidente da Argentina, Cristina Kirchner

Os anos dourados da América Latina ficaram para trás. Após quatro anos de redução nos preços das commodities, ninguém mais duvida que o período de vacas gordas passou para as nações que se especializaram em produzir petróleo, minérios e alimentos.

Segundo a Cepal (comissão econômica ligada à ONU), a região deverá ter em 2015 a menor expansão dos últimos 16 anos —com exceção de 2009, quando a crise americana afetou o mundo inteiro.

As recentes turbulências no mercado financeiro chinês, hoje principal parceiro comercial da maioria dos países latinos, alimentam a previsão de anos difíceis pela frente.

Taxa de crescimento econômico da América Latina - Variação anual, em %

"Não voltaremos a ver por muito tempo o crescimento alto que vimos na região nos anos 2000. Com sorte, voltaremos a crescer a taxas perto de 3% ao ano", diz o economista argentino Guillermo Calvo, professor da universidade americana de Columbia.

A China está em processo de desaceleração e consumindo menos matérias-primas. Segundo a Cepal, 80% das vendas da América Latina para o gigante são commodities.

Além disso, os investidores estão cada vez mais convencidos da recuperação dos EUA, deixando de lado a aposta em ativos ligados a matérias-primas, o que contribui para a liquidação nos preços das commodities.

Taxa de crescimento prevista para 2015 - Em %

De janeiro de 2011 a maio deste ano, segundo a Cepal, os preços das matérias-primas energéticas caíram 29%, as minerais, 39% e as alimentares, 30%. O preço do barril do petróleo, que há um ano custava US$ 106, valia menos de US$ 40 na última semana. Isso propagou as dificuldades que já se viam em Brasil, Argentina e Venezuela a países produtores de petróleo, como Colômbia e México.

"Viramos a fase do superciclo [de alta], e desapareceu o fator automático de elevação do PIB por meio das commodities. Mas não se está no desastre de preços dos anos 80 e 90", afirma Otaviano Canuto, diretor do FMI (Fundo Monetário Internacional).

GASTAR MENOS

Amparados no consumo doméstico, Paraguai e Bolívia, as novíssimas economias emergentes da região, terão crescimento ao redor de 4% neste ano. Mas não são imunes ao contágio da moderação sobre os países vizinhos.

Colômbia, Peru e Chile aproveitaram os anos dourados para fazer reformas e poupar e, por isso, também têm mais fôlego agora.

Já Brasil, Argentina, Venezuela e Uruguai "esbanjaram" na fase da bonança e entram nessa etapa com maior vulnerabilidade.

Freio no crescimento e queda de matérias-primas derretem moedas - Alta do dólar, nos últimos 12 meses, até julho

"Os países gastaram muito, e não apenas os governos, as famílias também. Todos terão que gastar menos", diz Calvo, referindo-se a ajustes, como o que está em curso no Brasil.

Canuto lamenta que o país não tenha aproveitado a boa fase para reduzir a dívida pública ou fazer reformas que ajudassem setores a sustentar a economia na baixa. Como resultado, há o risco de perda do grau de investimento e desindustrialização.

Para Daniel Titelman, chefe da divisão de desenvolvimento econômico da Cepal, as dificuldades continuarão pelos próximos dois anos pelo menos. E o que mais preocupa o analista é a contração dos investimentos na região.

Principais mercados de produtos industrializados do Brasil - Participação, em %

"Os países têm que reativar os investimentos em setores não relacionados às commodities, como a infraestrutura, por exemplo."

Segundo Calvo, a má notícia é que as previsões de menor crescimento freiam também as expectativas de ganhos sociais, medidos pela renda per capita da população. "Como reagirá a população que ascendeu à classe média e poderá voltar à pobreza? Isso não é um problema de Dilma Rousseff ou de Aécio Neves, é de todos. A direita e a esquerda se enfrentarão com os mesmos problemas, lamentavelmente".

Exportações de produtos industriais do Brasil para a América do Sul - Em bilhões, US$


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