Folha de S. Paulo


Economia recua 1,9% no 2º tri com queda no consumo e no investimento

O PIB (Produto Interno Bruto), medida da produção de bens e serviços do país, confirmou nesta sexta-feira (28) que a economia brasileira está em recessão.

A queda foi de 1,9% no segundo trimestre frente aos três primeiros meses do ano, e de 2,6% na comparação com o mesmo período do ano anterior. Com isso, o valor total fica em R$ 1,428 trilhão.

Trata-se da segunda queda consecutiva do indicador, que recuou 0,7% no primeiro trimestre frente aos três meses anteriores —inicialmente, havia sido apontada uma queda bem menor, de 0,2%, mas o dado foi revisado. No acumulado do ano, a queda é de 2,1% frente ao mesmo período do ano passado.

O tombo é maior do que o esperado por economistas consultados pela agência internacional Bloomberg, que previam retração de 1,7% no PIB do trimestre comparado com o trimestre anterior e de 2,1% comparado com o mesmo trimestre de 2014.

Houve queda de 8,1% nos investimentos, ou seja, dos gastos públicos e privados destinados a ampliar a capacidade produtiva do país. Isso deve dificultar uma recuperação da economia no futuro.

São oito trimestres consecutivos de um declínio que se aproxima dos 18%. Não há nada parecido nas estatísticas disponíveis desde a década de 1990. A dimensão da queda nos investimentos é um fator que distingue a crise atual de suas antecessoras.

PIB - Trimestre X trimestre imediatamente anterior, em %

Divulgada nesta segunda, a projeção de economistas consultados pelo Banco Central é de que o PIB encolha 2,06% neste ano.

O consumo das famílias também teve queda, de 2,1%, frente ao trimestre anterior. Já o consumo do governo surpreendeu com alta de 0,7%. Do lado da oferta, a indústria teve queda de 4,3% e serviços, de 0,7% (veja mais abaixo).

A economia teve assim o pior segundo trimestre do PIB desde 1996, quando teve início a série histórica do IBGE. Considerando todos os trimestres, foi o pior resultado da economia brasileira desde o primeiro trimestre de 2009, quando o PIB brasileiro também recuou 1,9%, segundo os dados revisados.

"A turbulência tanto econômica quanto política acabou influenciando praticamente todas as atividades e, em algumas, com mais intensidade", disse Rebeca Palis, gerente de Contas Nacionais do IBGE.

O setor de construção civil, que teve queda de 8,2% na comparação ao mesmo trimestre do ano passado, é um exemplo. De um lado, o segmento de construção imobiliária foi afetado pela economia. De outro, a "turbulência política afetou sobretudo a parte de infraestrutura", disse ela.

REVISÕES PARA BAIXO

Também foram divulgados nesta sexta-feira dados revisados do PIB desde o quarto trimestre de 2013, sempre na comparação com os três meses imediatamente anteriores, pela série com ajustes sazonal. O PIB para o ano fechado não foi revisto.

Na maioria dos casos, as revisões foram para baixo, apontando para um desempenho pior do que o divulgado anteriormente.

Mudaram assim o PIB do quarto trimestre de 2013 (de zero para -0,2%), do segundo trimestre de 2014 (de -1,4% para -1,1%), do terceiro trimestre de 2014 (de 0,2% para 0,1%), do quatro trimestre de 2014 (de 0,3% para zero) e do primeiro trimestre deste ano (de -0,2% para -0,7%).

PIB por setor

RECESSÃO

Com o resultado divulgado pelo IBGE, a economia do país se enquadra na chamada "recessão técnica", definição usada para definir duas quedas consecutivas do PIB.

Em outras palavras, houve empobrecimento geral no país: os empresários cortaram investimentos e as famílias estão consumindo menos, efeito da piora do mercado de trabalho e redução da renda real. De quebra, o desgaste político do governo aumenta.

Um dado eloquente é o de que a queda de 2,6% na comparação com o mesmo período de 2014 é a quinta taxa negativa consecutiva nesta comparação, a mais longa sequência da série histórica.

Para o Comitê de Ciclos Econômicos da FGV (Fundação Getulio Vargas), a recessão da economia brasileira se estende desde o segundo trimestre do ano passado, um dos períodos mais longos da história recente.

"Recessão é, pela teoria econômica, período de retração generalizada da atividade econômica. E isso está acontecendo na economia brasileira desde o segundo trimestre de 2014", diz Paulo Picchetti, pesquisador do Ibre/FGV.

Vídeo: entenda o que é o PIB e como é feito seu cálculo

DEMANDA

O consumo das famílias e os investimentos —que compõem a principal parte do lado da demanda do PIB— recuaram ao mesmo tempo e de maneria mais intensa do que nos três primeiros meses do ano, aprofundando a crise econômica brasileira.

Um dos propulsores da economia nos últimos anos, o consumo das famílias teve queda de 2,1% de abril a junho deste ano na comparação ao três meses imediatamente anteriores. E encolheu 2,7% frente ao mesmo período do ano passado.

As famílias brasileiras reduziram o consumo pressionadas por uma combinação de fatores que afetou seu poder de compra: renda corroída pela inflação, crédito mais restrito e piora do mercado de trabalho, segundo especialistas.

Sem confiança sobre o futuro, os empresários seguem adiando decisões. Os investimentos em máquinas, equipamentos e na construção tombaram 8,1% frente ao primeiro trimestre deste ano. Essa queda foi de 11,9% na comparação ao mesmo período de 2014.

A surpresa ficou por conta do consumo do governo –incluindo União, Estados e municípios. Mesmo com o ajuste das contas, os gastos tiveram expansão de 0,7% frente ao primeiro trimestre. Na comparação ao mesmo período de 2014, a queda foi de 1,1% em relação ao mesmo período do ano passado.

OFERTA

Com a menor demanda por bens e serviços, a oferta também precisou se ajustar à economia. Assim, agropecuária, indústria e serviços tiveram queda no segundo trimestre deste ano, frente aos três meses anteriores, de forma combinada.

O gigantesco setor de serviços, que responde por cerca de dois terços do PIB e engloba as mais variadas atividades, recuou 0,7% no segundo trimestre, na comparação ao primeiro. Em relação ao mesmo período do ano passado, a queda foi de 1,4%.

O setor agropecuário, que havia surpreendido com um avanço de 4,7% nos três primeiros meses do ano, mudou de figura: queda de 2,7% frente ao primeiro trimestre e alta de 1,8% na comparação com o segundo trimestre de 2014.

Com estoques ainda altos e parque ocioso, a combalida indústria teve sua terceira queda trimestral consecutiva, de 4,3% frente aos três meses imediatamente anteriores. Na comparação ao mesmo trimestre de 2014, a queda foi de 5,2%, informou o IBGE.

Infográfico: recessões no Brasil desde o Plano Real


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