Folha de S. Paulo


Lojas virtuais usam consultor de vendas para vencer resistência

O tradicional vendedor de porta em porta ganha espaço no comércio eletrônico. Pequenos e médios negócios estão apostando no consultor de vendas para vencer o receio dos clientes mais resistentes às compras on-line.

Essa foi a fórmula que a JUV, e-commerce de bijuterias e semijóias, encontrou para crescer. A companhia tem 20 funcionários e 11 mil consultoras no país -ou empreendedoras, como são chamadas na empresa.

"Conseguimos atingir mercados no país em que os negócios formais ainda não são tão fortes. No Acre, por exemplo, temos mais de mil empreendedoras", conta a presidente Silvana Cassol, 61.

Além de levar os colares à casa dos clientes, as consultoras da JUV podem criar páginas próprias no site da empresa para divulgação.

"Nossa intenção é misturar os dois canais de vendas. Há muitos casos em que a empreendedora divulga sua página em encontros sociais. O cliente entra depois no site e agenda uma visita de demonstração. A venda pode ocorrer na própria visita ou pelo site", explica Kendra Pazello, 31, cofundadora e diretora comercial.

Joel Silva/Folhapress
Kendra Pazello exibe colares do e-commerce JUV, em São Paulo
Kendra Pazello exibe colares do e-commerce JUV, em São Paulo

Este modelo híbrido de negócio pode ser uma ferramenta útil para ganhar novos clientes, afirma Gabriel Lima, diretor da consultoria de comércio eletrônico eNext.

Além de oferecer um serviço personalizado, o consultor ganha a confiança de clientes que estão receosos de comprar o produto sem testar ou provar.

"Essa tática pode aumentar até mesmo as compras on-line, já que o cliente sabe que, se precisar, existe alguém do outro lado disposto a ir até a sua casa para lhe apresentar os itens", afirma Lima.

Para a Àkora Brasil, comércio eletrônico de produtos de limpeza, a aposta na venda direta foi feita para ampliar o portfólio de produtos.

"O uso de consultores possibilita vender itens de baixo valor agregado, que não conseguiríamos disponibilizar no site por conta dos custos altos de manutenção e envio", diz a fundadora Márcia Toyoshina, 54.

A companhia possui 19 funcionários diretos e 2.000 consultores de vendas espalhados pelo país.

Toyoshina diz que cada vendedor trabalha de uma forma. Alguns fazem demonstração dos produtos para clientes indicados, outros vão até empresas e há os que preferem outro recurso das antigas: o catálogo.

NOVOS CONSUMIDORES

No e-commerce de óculos Hatsu há dez consultores, que visitam as cidades de São Paulo e Campinas (SP).

Makoto Ikegame, 36, presidente-executivo, diz que as visitas duram em média uma hora e meia. Nelas, o consultor analisa os hábitos do cliente e faz medições em seu rosto para sugerir os melhores óculos e armações.

Bruno Santos/Folhapress
Makoto Ikegame (à esquerda) e Pedro Ortega, da Hatsu
Makoto Ikegame (à esquerda) e Pedro Ortega, da Hatsu

"Temos uma limitação geográfica para controlar custos, mas esse serviço precisa oferecer comodidades para dar certo, como o agendamento, e não impor que o cliente faça a compra na visita", ressalva Pedro Ortega, 21, gerente de comunicação.

Ortega afirma que a taxa de sucesso em vendas em óticas físicas gira em torno de 10%. Já com o sistema de consultoria, a Hatsu consegue sete vezes mais.

A empresa usa o formato para atrair uma clientela diferente.

Segundo Ortega, o canal on-line é usado principalmente pelo público jovem, que normalmente compra lentes mais simples. Já a venda direta é concentrada em pessoas acima de 45 anos, que adquirem mais lentes progressivas, que necessitam de mais provas.

TREINAMENTO

Para e-commerces com estruturas pequenas, o custo de contratar vendedores para ir até os clientes pode inviabilizar o negócio.

Por isso, as empresas que adotam o modelo apostam em consultores autônomos.

Na JUV, que vende bijuterias e semijóias, as consultoras compram o produto por preços menores e revendem com lucro. Apenas aquelas que conseguem formar redes de vendedoras ganham comissão e recebem direitos trabalhistas. A empresa não revela quantas são.

No site de venda de óculos Hatsu, os consultores também são autônomos e a remuneração é variável -há bonificações pela venda direta, quando o pós-venda é bem-sucedido ou quando o consultor visita clientes que ele próprio encontrou.

Já no comércio eletrônico de produtos de limpeza Àkora Brasil, o custo das vendas diretas gira em torno de 18% do faturamento, segundo a fundadora Márcia Toyoshina.

O consultor tem um desconto de 30% no preço de venda dos produtos, o que garante sua remuneração.

Marcelo Nakagawa, diretor de empreendedorismo da FIAP (Faculdade de Informática e Administração Paulista), diz que algumas empresas repassam parte dos custos para o vendedor.

"O associado tem que comprar um enxoval, uma quantidade inicial de produtos a serem vendidos, o que banca o capital de giro que a empresa teria que fazer."

O fato de o consultor ser autônomo não exime a empresa de investir em treinamento, diz Nakagawa.

O vendedor precisa aprender abordagens, a importância da primeira impressão, além de estratégias de venda, entrega e pós-venda. E também detalhes sobre boa apresentação pessoal, a importância de conhecer bem o cliente e os produtos e a história da empresa.

"Esse consultor deve ser treinado assim como um vendedor. Ele deve ter informação do produto, bem como conteúdo para ajudar o cliente a tomar a decisão de compra", diz Gabriel Lima, da consultoria eNext.

Para quem não quer investir no consultor, há outras opções para o cliente ter experiência com o produto antes da compra on-line.

"É possível trabalhar com distribuição de amostras grátis, degustação ou demonstração em eventos ou locais públicos, além de venda de itens em consignação", afirma Nakagawa.

No caso de produtos digitais, é possível oferecer períodos de testes ou versões de uso limitado gratuitas.

COMO USAR O CONSULTOR DE VENDAS:

Não vale para qualquer produto
O sistema funciona melhor para venda de itens muito personalizados, como roupas e acessórios, ou novos no mercado.

Não vale para qualquer lugar
Para não extrapolar nos custos, limite a área de atuação dos vendedores para os locais onde seu cliente potencial se concentra.

Não vale para qualquer um
O consultor precisa ser bem treinado sobre a história da empresa, usos do produto, abordagem dos clientes e como fazer pós-venda.

Não vale se estiver desmotivado
Crie estímulos para o consultor, como bônus para os que conseguem novos clientes e para aqueles com boa avaliação de pós-venda.


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