Folha de S. Paulo


Análise

Ação do BNDES distorce decisões sobre crédito

A edição deste domingo (9) da Folha discute o enorme custo imposto pelo BNDES ao contribuinte, mas qual o benefício dessas operações para a economia brasileira?

O que nos compram esses bilhões de reais em subsídios?

A resposta parece simples: esses bilhões de reais geram crédito às empresas, e esse crédito financia investimentos, cria empregos e fomenta a produção.

Não fosse o BNDES, a empresa que toma empréstimos a juros subsidiados não compraria equipamentos nem contrataria funcionários.

Portanto, teríamos menos investimento, produção e empregos no país.

Essa resposta está errada.

Não pelo que acontece com a empresa que toma empréstimos do BNDES, mas pelo que deixa de acontecer na economia por causa dessa operação.

Considere um repasse do Tesouro Nacional ao BNDES que gera um empréstimo de R$ 10 milhões para uma empresa. Vamos supor que o repasse e o empréstimo deixem de acontecer. A empresa que usaria esses R$ 10 milhões para comprar uma máquina agora não tem mais recursos para investir. Parece então que temos de fato menos investimento na economia.

Só que a história não acaba por aí.

Sem esse repasse ao BNDES, o Tesouro precisa captar R$ 10 milhões a menos. Consequentemente, nas mãos daqueles que compram títulos públicos, sobram R$ 10 milhões –o dinheiro que o governo tomaria emprestado e repassaria ao BNDES.

PADARIA, LAVADORA

Claro, esses recursos não somem da economia.

Os bancos, fundos de investimento ou poupadores que compravam títulos públicos agora precisam buscar outros destinos para esses R$ 10 milhões que não os cofres do governo.

Afinal, ninguém quer deixar o dinheiro parado.

Assim, esses recursos chegam às mãos da padaria que estava com dificuldades para conseguir empréstimo e do cidadão que buscava financiamento para comprar sua máquina de lavar.

Portanto, os bilhões de reais despendidos com o BNDES não criam crédito. O efeito real desses subsídios é a alteração na alocação do crédito na economia.

Por causa do BNDES, o dinheiro que financiaria a compra da máquina de lavar pelo cidadão e a reforma da padaria é emprestado ao governo, que o repassa ao BNDES, que empresta a quem tem a sorte de ter acesso ao crédito subsidiado.

METRÔ, FUTEBOL

Isso é diferente de outros gastos públicos.

Os recursos utilizados nas obras do metrô e na construção das arenas para a Copa do Mundo resultam em estádios e infraestrutura de transporte. Portanto, geram benefícios. Pode-se discutir se o benefício do estádio ou do metrô compensa o custo pago pela população, mas há um benefício.

Por outro lado, os bilhões de reais gastos pelo Tesouro em subsídios fazem com que uma grande fatia dos recursos disponíveis para investimento seja alocada pelo BNDES, e não pela mão invisível do mercado.

Não é nada claro que esse efeito seja benéfico –mesmo sem custo algum.

A discussão sobre o BNDES precisa começar exatamente por essa questão: queremos pagar alguma coisa para modificar a alocação do crédito? Se sim, em que casos, e por quê?


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