Folha de S. Paulo


Crise Grega: Alemães não querem pagar seguro grego, diz economista

Não faltam lições da crise grega. Quem quiser culpar a Grécia pode apontar para a expansão desmesurada dos gastos (devidamente camuflados pela "contabilidade criativa"), ou para a prática de concessão de privilégios a grupos próximos ao poder, minando o crescimento da produtividade e a competitividade de sua economia.

Já quem preferir manter o foco nos países credores pode chamar a atenção para a imposição de um ajuste fiscal inexequível, mesmo em face de uma dívida insustentável, cujo foco, mais que ajudar o país em crise, foi o de impedir que um calote grego se transformasse numa crise financeira de grandes proporções.

Há elementos de verdade em ambas as narrativas e é possível manter um longo (e provavelmente infrutífero) debate acerca de quem foi o pecador original. Eu tendo a atribuir parcela maior da culpa à Grécia, mas esta não me parece a questão mais relevante.

O consenso hoje é que a unificação monetária carecia de uma série de precondições: além de mobilidade dos trabalhadores (para equilibrar os custos do trabalho entre diferentes países), seria necessária a unificação fiscal (como a que existe entre estados de uma mesma federação) e a unificação bancária.

A unificação fiscal permitiria transferências (por exemplo, estados com menor desemprego "financiando" transferências relativas a seguro-desemprego onde o problema é mais grave), atenuando desequilíbrios fiscais. Já a unificação bancária permitiria não apenas a resolução de casos mais agudos, mas também um mecanismo supranacional de garantia de depósitos.

Obviamente, ambos os casos requereriam que países europeus cedessem parcela de sua soberania para o equivalente a um governo federal.

Demandariam também que estivessem dispostos a participar de um esquema de seguro: economias com melhor desempenho em dado momento ajudariam aquelas com pior desempenho, na esperança de serem tratadas da mesma forma quando enfrentassem dificuldades.

Deve ficar claro, portanto, que o bom funcionamento da unificação monetária necessita de um grau de coesão política e institucional que jamais existiu na Europa.

A elite política do continente embarcou em um projeto audacioso sem ter se perguntado à vera se os eleitores queriam aquilo mesmo. Descobrimos agora que não: alemães não querem pagar o seguro dos gregos e gregos não estavam dispostos a tomar medidas para evitar o uso do seguro. Se houver uma próxima vez, terão que fazer bem diferente.

ALEXANDRE SCHWARTSMAN, 52, doutor em economia pela Universidade da Califórnia, Berkeley e ex-diretor do Banco Central, é professor do Insper


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