Folha de S. Paulo


análise

Café vazio em Atenas ajuda a explicar voto no 'não' dos gregos

A melhor explicação para o "não" dos gregos a acordo com os credores está no movimento do Elaea Cafe, ao pé da Acrópolis, um dos incontáveis —e deliciosos— cafés da não menos deliciosa Atenas.

O movimento despencou desde que o governo Alexis Tsipras fechou os bancos, para evitar que quebrassem, e estabeleceu o "corralito", com o consequente limite diário de € 60 (R$ 209) para retiradas.

Não havia dinheiro, como é óbvio, para passar horas sorvendo um café e lambiscando docinhos —um saudável esporte nacional para os gregos.

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O "corralito" violentou, portanto, não só o bolso dos gregos mas um modo de vida (não há espaço aqui para discutir esse modo de vida ).

Como, na versão do governo, que pedia o "não", o "corralito" foi imposto por pressão dos credores, votar "não" equivaleria a repudiá-lo e à violência a ele associada.

O problema com o resultado é que não está à vista quando o Elaea voltará a ficar cheio. A reação europeia, de novo inflexível, mostra que a Grécia está hoje como antes do referendo: sem poder ir ao Elaea e inteiramente dependente da boa (ou má) vontade dos credores.

Antes de mais nada, estes precisarão admitir que houve austeridade demais, o que é praticamente consenso entre os analistas que não estejam embriagados de ideologia.

Grécia

Depois, terão de ouvir Vicky Pryce, conselheiro econômico chefe do Centro para Pesquisas Econômicas e de Negócios, veiculado pela "Economist": Pryce pede "um acordo que reconheça as novas realidades gregas e inclua, como o FMI agora diz, uma reestruturação da dívida que todo economista sabe que é insustentável".

Alexis Tsipras, o primeiro-ministro, incluiu formalmente a reestruturação da dívida como condição essencial para aceitar um acordo.

Se será ouvido ou não, não impede que se reconheça o voto como vitória da democracia. Primeiro pelo simples fato de ter sido convocado. Quando se chega a uma situação aguda, como na Grécia, é mais razoável chamar o eleitorado para decidir que deixar a decisão nas mãos de uns poucos, ainda que tenham sido legitimamente eleitos.

Além disso, a democracia premia quem sintoniza com o sentimento coletivo.

A "rationale" deles deve ter sido a que expôs, nesta segunda (6), Paola Subacchi, diretora de pesquisas sobre economia internacional do centro de pesquisas Chatam House: "Com a taxa de desemprego do país em 25%, com o tamanho da economia 25% menor do que era nos anos pré-crise, com a dívida pública grega em 177% do PIB, quando era de 157% em 2012, por que o povo grego deveria votar 'sim'? Para que continuassem as mesmas dolorosas e inconclusivas medidas?".


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