Folha de S. Paulo


Trabalhadores da Mercedes recusam corte salarial para manter emprego

Os metalúrgicos da Mercedes-Benz rejeitaram a proposta de reduzir em 10% o salário e em 20% a jornada de trabalho de todos os trabalhadores da unidade de São Bernardo do Campo em troca de manter os empregos dos 10,5 mil funcionários da fábrica até julho de 2016.

A proposta foi recusada por 73,8% dos 7.559 trabalhadores que colocaram seus votos nas urnas espalhadas pela produção. Desse total, 25,2% aceitaram o acordo e 1% se absteve de votar. A votação ocorreu na quinta-feira (2), entre 9h e 21h, em todos os departamentos.

A Folha obteve o placar da votação com trabalhadores do primeiro turno da fábrica, que relataram ainda que a proposta foi vaiada ao ser explicada na assembleia que ocorreu na quinta e reuniu os funcionários do turno da manhã (a partir de 5h30) e da tarde (14h30).

O acordo foi negociado por ao menos seis meses pelo Sindicato dos Metalúrgicos do ABC (filiado à CUT) e pela empresa. O sindicato e a empresa não fornecerem detalhes da votação, mas confirmam que a proposta foi recusada por "ampla maioria".

Editoria de Arte/Folhapress
Funcionários da Mercedes rejeitam proposta de cortar jornada e salário
Funcionários da Mercedes rejeitam proposta de cortar jornada e salário

Em maio, a montadora demitiu 500 trabalhadores que retornaram de um período de um ano de afastamento em "lay-off" ( suspensão do contrato de trabalho).

Após uma greve na empresa, a montadora abriu um PDV (Programa de Demissão Voluntária) e 200 desses 500 dispensados aderiram ao plano.

Outros 300 funcionários permanecem se revezando em acampamento na porta da fábrica há 25 dias.

A proposta rejeitada pelos metalúrgicos previa ainda reajuste salarial menor em 2016 - com reposição de metade da inflação medida pelo INPC, acumulado em 12 meses encerrados em maio, mês da data-base da categoria.

Segundo o sindicato, as negociações com a montadora foram interrompidas e não há previsão de reunião com a empresa para avaliar a recusa e outras alternativas.

A produção está parada a partir desta sexta (3), por causa da emenda com o feriado do dia 9 de julho, e os trabalhadores retornam na próxima segunda (13).

Em nota, a Mercedes-Benz informa que, com a rejeição da proposta, "terá de buscar outras alternativas frente a um excedente de 2.000 pessoas na fábrica".

AFASTADOS

Um grupo de 250 funcionários de São Bernardo está em "lay-off" desde julho do ano passado e permanecerá com contrato suspenso até 30 de setembro deste ano. São trabalhadores com estabilidade no emprego, por serem portadores de doença profissional ou ocupacional.

Em Juiz de Fora (MG), onde a montadora emprega cerca de 800 pessoas, também estão em "lay-off" outros 75 funcionários. Eles estão afastados desde quarta-feira (1) até 30 de novembro.

O sindicato local fechou um acordo que prevê estabilidade no emprego até 2016 e um segundo período de "lay-off" já aprovado para o período de quatro meses - 1 de dezembro a 30 de abril de 2016. O número total de funcionários que deve permanecer afastado para esse novo período ainda não foi definido.

EM NEGOCIAÇÃO

O Programa de Proteção ao Emprego (PPE), em estudo no governo, é uma alternativa aos "lay-offs", sistemas que têm sido adotados principalmente pelas montadoras.

No "lay-off", há suspensão dos contratos de trabalho por um prazo de cinco meses (que pode ser prorrogado) e o trabalhador recebe o equivalente ao valor do seguro-desemprego, bancado pelo governo federal.

Nesse regime, as empresas deixam de recolher contribuições previdenciárias e trabalhistas - o que afeta a arrecadação.

Já o PPE é inspirado em um modelo alemão e prevê a redução da jornada de trabalho e de salários nas empresas afetadas pela crise econômica, sem causar perda de arrecadação ao governo federal.

O acordo rejeitado na Mercedes tem semelhanças ao que está sendo estudado pelo governo a pedido das centrais sindicais.

Para ser anunciado, o governo precisa definir os percentuais de redução da jornada de trabalho e de salário. Uma das ideias em estudo é a defendida pelas centrais sindicais: prevê jornada 30% menor e corte nos salários de 15%.

PPE

A ideia proposta no programa de proteção ao emprego é manter o trabalhador com salário e jornada menores por um prazo de ano, mas sem causar perda de arrecadação ao governo, uma vez que as empresas têm de recolher as contribuições porque os contratos de trabalho não são suspensos.

Com a jornada reduzida, as empresas, além de pagarem salário menor, conseguem ajustar a produção à demanda mais fraca.

Desde maio, integrantes da equipe econômica e da área política da Esplanada defendem a ideia do PPE por razões distintas.

No primeiro caso, estudos internos já mostraram que é mais barato ajudar a pagar o salário reduzido via recursos do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador), conforme desenho atual da proposta, do que arcar com o seguro-desemprego, área que o governo tenta enxugar.

Mais: o modelo prevê a manutenção do pagamento de encargos trabalhistas enquanto o plano é adotado na fábrica. Ou seja: não haveria, inicialmente, impacto sobre a arrecadação federal.

Já do ponto de vista político, ministros ponderaram que o programa contribuiria para reabilitar as relações de Dilma com o reduto eleitoral petista, incomodado com as medidas de ajuste fiscal que endurecem as regras para a concessão de abono salarial e seguro-desemprego.

FUNDO

As centrais sindicais defendem que esse fundo poderia ser constituído com os recursos do adicional de 10% da multa do FGTS, paga pelos empregadores em demissões sem justa causa.

Segundo essas entidades, o plano não prevê flexibilização dos direitos nem qualquer mudança trabalhista, mas sim uma alternativa para manter empregos em épocas de crise.

Elas informam que o PPE só pode ser acionado em caso de crise econômica cíclica ou sistêmica que deve ser comprovada pela empresa ao sindicato da categoria e ao governo federal. E esse problema econômico não pode ser derivado de má gestão.

Para as centrais, outro ponto importante que diferencia o programa do "lay-off" é que, quando o trabalhador afastado (no "lay-off") volta a assumir seu posto na empresa, corre o risco de ter problema para sacar o seguro-desemprego caso seja demitido meses depois.

Isso porque, a suspensão total do contrato de trabalho envolve recursos da conta do seguro-desemprego do trabalhador.

No programa de proteção ao emprego, isso não ocorrerá porque os recursos utilizados para viabilizar o programa são de outra natureza, além do fato do programa manter o vinculo de emprego.


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