Folha de S. Paulo


Acordo com credores demora entre 60 e 90 dias, diz Procon SP

Em 76% dos atendimentos feitos no programa que auxilia os superendividados da Fundação Procon SP são feitos acordos com credores.

O prazo entre a primeira ida do consumidor ao núcleo e a assinatura do acordo, feito por intermédio de um juiz do Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania, do Tribunal de Justiça de São Paulo, é de 60 a 90 dias, em média. Veja dicas para sair do superendividamento.

"Quando descontadas as multas e as outras taxas incluídas no total cobrado do devedor, a queda no valor total da dívida renegociada chega a até 90%", diz a diretora-executiva do órgão, Ivete Ribeiro.

Há 24% de desistências do consumidor ou negativa de acordo com bancos, operadoras de cartão de crédito e redes de varejo –os principais credores com quem o órgão negocia para auxiliar os superendividados.

No programa, são renegociadas dívidas vencidas ou prestes a vencer decorrentes de empréstimos, financiamentos, contratos de crédito ao consumo, de prestação de serviços ou aquisição de produtos. Não são renegociadas no local dívidas de crédito habitacional, aluguel, nem indenizações (por acidente), dívidas alimentícias ou fiscais, de impostos, multas, taxas.

O superendividado é o devedor pessoa física, de boa-fé, que não consegue pagar suas dívidas atuais e futuras em um tempo razoável, com a capacidade atual de renda e patrimônio, segundo o órgão de defesa do consumidor.

'PESADELO'

Sem receber salário por um período de nove meses, o consultor João (o nome é fictício a pedido do consumidor) e seu sócio passaram da categoria de bons pagadores para a de superendividados, o que mudou a vida dos dois profissionais.

No final de 2013, João deixou deixou de receber pagamentos referentes a contratos de prestação de serviço ao Ministério da Saúde, em que atua como consultor em programas de saúde pública.

Há cerca de duas semanas ele conseguiu renegociar sua dívida e duas de seu sócio, com ajuda do Procon. Somados, os débitos passaram de R$ 149 mil para R$ 52 mil.

"Ficamos nove meses sem receber. Foi um pesadelo. Agora, voltamos a respirar", diz João. O consultor diz que assistiu palestras de educação financeira e aprendeu a lidar com o que tinha disponível no bolso. Uma das dívidas foi renegociada, de R$ 10 mil, para ser paga em 24 parcelas de R$ 180.

Durante esse período, o consultor diz que passou por várias situações em que se sentiu humilhado ou até constrangido. "É muito ruim dever favores a amigos, depender de ajuda financeira e ter de escutar até algum comentário feito em tom de brincadeiras, mas que causava constrangimento. Principalmente quando você deixa de honrar seu compromisso não porque é caloteiro e sim porque ficou sem salário", afirma João.

Com a orientação do Procon, ele diz que não só está conseguindo colocar as contas em dia, mas mudou hábitos. "Desde os gastos com alimentação fora de casa, até a compra de itens para a casa de forma mais organizada, as orientações e palestras serviram até para eu incentivar uma sobrinha do Paraná a busca ajuda especializada do Procon para que ela também possa sair do endividamento", diz o consultor.

IMPACTO

O orçamento das famílias é afetado pela combinação de inflação maior, juros mais altos e desemprego, o que tem impacto no aumento do número de inadimplentes, avalia Nicola Tingas, economista-chefe da Acrefi (Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento).

"Atrasos de pagamento ocorrem, com maior incidência, entre as famílias de menor renda, que estão com orçamento comprometido pela inflação que deve bater em até 9,4% segundo algumas projeções", diz o economista.

"Ou em regiões do país que sofrem com o cancelamento de planos de investimentos das empresas, como as do Nordeste, afetadas pela investigação da Petrobras", completa.

Cerca de um terço dos superendividados atendidos no programa do Procon SP são funcionários públicos. O acesso ao crédito consignado, descontado na folha de pagamento, facilita o empréstimo, avalia a diretora de Procon.

"O problema é que ele já usou esses recursos para tentar quitar as dívidas com cartão de crédito e cheque especial, mas foram insuficientes. Por isso recorrem ao núcleo de atendimento dos superendividados", diz Ribeiro.

Para o economista da Acrefi, a situação chama a atenção. "O consumidor, seja do setor público ou do privado, está 'comprando dinheiro' para pagar dívidas. Ele não usa o consignado para comprar uma passagem, um produto ou serviço."

E ressalta: "Com aperto da inflação, juros mais altos para rolar os empréstimos e integrantes da família perdendo emprego, as finanças da família colapsam de vez".


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