Folha de S. Paulo


Grupo espanhol assume obras da Delta e mira em espaço da Lava Jato

A construtora Delta, pertencente ao empresário Fernando Cavendish e que se encontra em recuperação judicial, teve parte de seus ativos e suas dívidas assumidas pelo grupo espanhol Essentium, que desembolsará R$ 450 milhões pela transação.

O acordo foi confirmado na tarde desta terça-feira à Folha pelo espanhol Juan Orge, que será o presidente da nova construtora que nasce da negociação, chamada Allianza Infraestrutura.

O negócio, que está em fase final de assinatura de contratos, faz parte do acordo de recuperação judicial da Delta, em curso na 5ª Vara Empresarial do Rio.

Os credores da construtora carioca aceitaram que os espanhóis comprassem parte dos ativos da construtoras com a condição de assumirem a dívida da companhia, que deverá começar a ser paga a partir de janeiro do ano que vem por um prazo de 15 anos. A transação foi intermediada no âmbito da recuperação judicial, que deve ser finalizada até o final deste mês.

Conforme a Folha adiantou em fevereiro deste ano, a estratégia do grupo Essentium é aproveitar a oportunidade que se formou por conta de as principais empreiteiras e construtoras no país estarem envolvidas nas investigações da Lava Jato, que apura desvios na Petrobras.

Segundo Orge, a Allianza, contudo, não está interessada nas obras da Petrobras, já que a especialidade dos espanhóis é o setor de infraestrutura. Como existe o risco de empresas da Lava Jato enfrentarem problemas financeiros e também diante da possibilidade de novas licitações de obras de infraestrutura no país, Orge acredita que é um bom momento para entrar no mercado brasileiro.

"Há coisas boas e ruins acontecendo no Brasil neste momento, mas sem dúvida é uma boa hora para aproveitar oportunidades no país. Há muita sobra [de obras] no Brasil", afirmou Orge.

A Allianza da Delta herdará sete obras em andamento, máquinas e equipamentos pesados, um acervo de dados sobre projetos e oportunidades no país e funcionários de cargo gerencial e também operários.

A Delta ficou conhecida depois que uma investigação da Polícia Federal apontou, em 2012, ligação da empresa com o bicheiro Carlinhos Cachoeira. A Delta chegou a ser a quinta maior construtora do país, posição sustentada principalmente por obras públicas.

A empresa também esteve sob críticas devido à amizade próxima de Fernando Cavendish com o ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral (PMDB). A empresa tinha mais de R$ 1 bilhão em contratos no Rio e os dois foram vistos em vídeo participando de festas em Paris.

A Delta foi declarada inidônea pela CGU (Controladoria Geral da União) em junho de 2012 e ficou proibida de participar de novas licitações com o governo federal, o que motivou decisões similares em outros governos estaduais. A Justiça aceitou pedido de recuperação judicial no mesmo mês. A venda da empresa ao grupo espanhol foi autorizada no início de maio.

OBRAS

A partir do fim da recuperação, a empresa terá 180 dias para concluir as obras. Entre os projetos, estão a construção de um centro de processamento de dados da Caixa em Brasília, a manutenção de uma rodovia em São Gonçalo (RJ), e uma obra de saneamento na região metropolitana de Goiânia.

A nova empresa irá repatriar 2.500 funcionários egressos da construtora brasileira. A legislação brasileira que rege as recuperações judiciais determina que 10% do controle da nova empresa esteja nas mãos de antigos funcionários da Delta, como gerentes e engenheiros. Além dos R$ 400 milhões em dívidas, os espanhóis se comprometeram a injetar R$ 50 milhões no caixa da empresa.

A Allianza terá sede no Rio. Orge será o presidente da nova empresa. Um outro espanhol será o diretor financeiro e o restante dos cargos da diretoria será ocupado por antigos funcionários da Delta.

O objetivo da empresa é faturar entre R$ 500 e R$ 600 milhões no primeiro ano e faturar R$ 1 bilhão ao final do segundo ano de atividades.

A compra não é a primeira incursão do grupo Essentium no Brasil. Após negociação frustrada com a WTorre, os espanhóis compraram metade da Niplan Engenharia em 2012. O negócio, porém, se tornou uma disputa judicial. A Essentium é acusada de não injetar os R$ 40 milhões acordados. Orge afirmou que a outra parte não cumpriu acordos e as empresas estão em litígio, sem haver nesse momento, contudo, interesse em desfazer a sociedade.

Através de seu braço de engenharia, a Assignia, o grupo espanhol conseguiu seu primeiro contrato no país no início do ano passado. Em consórcio com a construtora Continental, se tornou responsável pela manutenção de estradas federais em Santa Catarina.

O grupo Essentium teve uma receita bruta de cerca de € 600 milhões em 2014. A empresa afirma estar presente em 40 países e concentra 54% dos seus 8.425 funcionários no exterior.


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