Folha de S. Paulo


Economia global vive período de estagnação da produtividade

Drew Greenblatt está contemplando o espaço de trabalho de sua pequena fábrica em um distrito deteriorado do centro de Baltimore, Maryland, onde dois operários usam um grande robô cuja função é curvar peças de aço.

"Esse componente costumava ser produzido na China", ele diz. "Mas porque a robótica roubou [essa forma de produção] dos chineses, agora voltamos a produzi-lo nos Estados Unidos."

A introdução da automação na Marlin Steel Wire Products ajudou a elevar em 400% a produtividade por trabalhador, de 1998 para cá, estima Greenblatt, cujos clientes incluem a montadora General Motors. Os ganhos de eficiência são impressionantes, mas eles não vêm sendo replicados em todo o país.

No momento em que as indústrias dos Estados Unidos estão adotando a automação como parte de seu contra-ataque à transferência de produção para a Ásia, o crescimento da produtividade está quase paralisado em toda a economia.

Quadro semelhante pode ser encontrado em quase todo o planeta, o que expõe o mais premente problema da economia mundial, hoje. Apenas a Índia e a África subsaariana parecem imunes à desaceleração no crescimento da produtividade.

Os economistas estão cada vez mais alarmados, porque a melhora mais lenta na eficiência conduzirá a um declínio no padrão de vida e a finanças públicas menos sólidas.

Em médio prazo, o crescimento da produtividade é o mais importante propulsor da prosperidade. Sua fraqueza nos últimos é um fator central para que o crescimento das nações avançadas tenha permanecido baixo desde a crise financeira, mesmo que o desemprego tenha caído.

Janet Yellen, presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos), mencionou a produtividade "relativamente fraca" do país em um discurso há duas semanas, e instou por novas medidas de reforço à educação, estímulo ao empreendedorismo e ampliação no capital de investimento.

Novos dados do Conference Board, uma organização de pesquisa, mostram que o crescimento médio na produtividade da mão de obra em economias maduras se desacelerou a 0,6% em 2014, ante 0,8% em 2013, como resultado de perda de desempenho nos Estados Unidos, Japão e Europa.

A produtividade, que acompanha a eficiência de uso de insumos como a mão de obra e o capital, tende a evoluir, em longo prazo. Mas os indicadores do Conference Board confirmam uma tendência de queda do crescimento, em longo prazo, que está causando alarme em todo o mundo.

"Na década passada, os Estados Unidos registraram péssimo crescimento de produtividade e outros países vêm caindo com relação ao patamar norte-americano", disse John Fernald, economista do Fed de San Francisco.

No Reino Unido, a produtividade não melhora há oito anos, o que rompe uma tendência de crescimento anual de 2% nesse indicador que perdurou por mais de um século. George Osborne, o chanceler do Erário [ministro das finanças] britânico, recentemente prometeu que o governo conservador estimulará a produtividade.

Diante de populações em rápido envelhecimento e de uma desaceleração no crescimento do emprego, as economias maduras precisam melhorar a produtividade se desejam escapar a uma estagnação em seus padrões de vida.

Para compensar plenamente o crescimento mais lento do emprego nos próximos 50 anos, o crescimento da produtividade precisaria ser 80% mais rápido do que nos últimos 50 anos, de acordo com cálculos da consultoria McKinsey.

Determinar se uma aceleração como essa pode ser obtida depende em parte de identificar por que o crescimento está se desacelerando. Para os otimistas, os números ruins são um legado transitório da recessão.

A desaceleração na demanda mundial deprimiu temporariamente a disposição das empresas de investir em novos equipamentos e ideias, e essa perspectiva mais cautelosa prejudicou a produtividade.

Mas a desaceleração precede a crise financeira; os dados do Conference Board mostram longa queda no crescimento das economias maduras. Na Europa e Japão, isso começou nos anos 90, e se relaciona à adoção mais lenta de tecnologias, segundo a organização.

Marco Annunziata, economista-chefe da General Electric, se preocupa com a possibilidade de que a Europa tenha um problema estrutural devido ao baixo apetite por risco, gasto insuficiente em pesquisa e desenvolvimento e mercados de trabalho de baixa flexibilidade.

Nos Estados Unidos, a mais eficiente das grandes economias, o crescimento da produtividade começou a perder força em 2005. De acordo com Fernald, isso resultou do esgotamento dos dividendos temporários de crescimento propiciados pela revolução tecnológica acontecida nos anos 90.

E o fato traz a possibilidade de que o crescimento lento da produtividade nos Estados Unidos, nos últimos anos, seja na verdade um retorno à tendência anterior, e muito mais fraca.

Mesmo nas economias emergentes, onde a eficiência está recuperando o atraso com relação aos países avançados, o ritmo de crescimento se reduziu.

Isso tem grandes implicações em termos de uma deficiência prolongada em arrecadação tributária e alta na dívida pública.

Foi exatamente um cenário como esse –a queda na produtividade entre 2010 e 2015– que estendeu o período de austeridade de quatro anos planejado para o Reino Unido a uma década de miséria no setor público.

Os otimistas rebatem dizendo que é só questão de tempo para que vejamos uma disparada na produtividade, apontando para a inovação que provém de polos da tecnologia norte-americana como o Vale do Silício.

Os pesquisadores da Blue River Technology, uma companhia de robótica agrícola da Califórnia, têm em mente fazendas do futuro patrulhadas por drones (aeronaves de pilotagem remota) e operadas por frotas de robôs e tratores sem motorista.

A companhia já opera equipes de "robôs da alface" que se deslocam por plantações do Arizona e Califórnia a fim de identificar 1,5 milhão de plantas individuais por hora e tomar decisões sobre como fertilizá-las.

Há quem argumente que os alvos mais fáceis para o nosso progresso tecnológico já tenham sido atingidos. Mas outros dizem que o mundo está à beira de uma era de crescimento promovido por máquinas, na qual carros sem motorista e robôs substituirão as pessoas, e citam como prova a Blue River e empresas semelhantes.

Outra perspectiva mais positiva sugere que o conceito de produtividade como indicadora de padrão de vida está obsoleto, porque a qualidade de serviços públicos como a educação é difícil de medir, e é difícil avaliar o progresso de muitas tecnologias usadas em bens de consumo.

Uma década atrás, por exemplo, serviços semelhantes ao Skype eram proibitivamente caros, mas agora são gratuitos, dando às pessoas um padrão de vida superior sem que isso exerça efeito sobre os estatísticos que compilam dados de Produto Interno Bruto (PIB).

"Isso nos conduz a um território inexplorado, sobre o que significa progresso nas economias avançadas", diz a professora Diane Coyle, da Universidade de Manchester.

"O bem-estar dos consumidores claramente avançou, e é possível que esse avanço tenha sido imensamente grande, mas não sabemos de que maneira isso se relaciona ao PIB."

Mensuração incorreta pode explicar de que forma tantos consumidores estão vivendo melhor sem que aparentem ter renda mais alta, em termos reais.

Mas argumentos estatísticos não elevam rendas ou a arrecadação tributária, e tampouco devolvem o crescimento de setores que um dia tiveram alta produtividade aos níveis anteriores de sucesso.

Sem retorno aos padrões de produtividade anteriores nas economias avançadas, o crescimento será permanentemente mais baixo, e a arrecadação dos governos também.

A austeridade do setor público será uma presença persistente e os pais já não poderão esperar que seus filhos venham a ganhar mais do que eles. Há pouca coisa que seja mais importante para a economia mundial.

Tradução de PAULO MIGLIACCI


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